Resumo
Contexto: A satisfação do cliente constitui um indicador preponderante para aferir a qualidade dos cuidados de enfermagem de reabilitação. A inexistência de um questionário para hétero-avaliar a prática da enfermagem de reabilitação contribuiu para a validação do SNQ-10 (Satisfaction with Nursing Questionnaire) com o intuito de avaliar a satisfação do cliente, sobre os cuidados de enfermagem de reabilitação (QSEnf-10 – Questionário de Satisfação com os cuidados de Enfermagem de Reabilitação).
Objetivos: Traduzir, adaptar transculturalmente e validar o SNQ-10 para a realidade Portuguesa.
Métodos: Estudo não experimental, de natureza quantitativa correlacional e transversal, aplicado a uma amostra de 115 clientes na Unidade Local de Saúde da Guarda (ULS-Guarda).
Resultados: O processo de adaptação à população portuguesa foi efetuado, obtendo-se um alfa de Cronbach de 0,85. Neste processo, a análise fatorial com rotação ortogonal do tipo varimax revelou a existência de 2 fatores, com raízes latentes superiores a 1, que explicam 52,74% da variância total.
Conclusão: O QSEnf-10 apresenta válidas características psicométricas que comprovam a adequada adaptação efetuada, demonstrando que a sua estrutura fatorial possui índices aceitáveis de validade e de fiabilidade, pelo que se aconselha a confirmação do mesmo através de uma análise fatorial confirmatória.
Palavras-chave: Satisfação do paciente, Enfermagem em Reabilitação, questionário SNQ-10.
Introdução
A satisfação do cliente é um indicador obrigatório da qualidade dos cuidados prestados. É um conceito de difícil operacionalização, dada a sua natureza multidimensional, pois existem vários fatores que o influenciam, tais como: as características do indivíduo, as experiências anteriores, as variáveis do contexto sociocultural e as expectativas dos sujeitos sobre as diferentes dimensões da satisfação (Santos et al., 2007; Lange e Yellen, 2009); envolve fatores físicos, emocionais, mentais, sociais e culturais (Athanasiou e Darzi, 2010).
A polissemia, no campo da avaliação, em Saúde é um facto retratado por diversos autores desta área. No caso das avaliações de satisfação do cliente, nos serviços de Saúde, reflete-se que, embora o termo “satisfação” esteja na ordem do dia, sendo referido em larga escala na literatura internacional, é um conceito cujos contornos se mostram vagos, reunindo realidades múltiplas e diversas (Esperidião e Trad, 2006).
Ao refletir sobre a problemática da satisfação do cliente com aos cuidados de enfermagem específicos de reabilitação, torna-se pertinente este estudo, pois apesar da existência de questionários de satisfação que materializam a satisfação do cliente e os cuidados de enfermagem, nenhum permite a avaliação de uma área essencial: a satisfação do cliente relativa aos cuidados de enfermagem de reabilitação. Nesta linha de orientação, este trabalho tem como objetivo, a adaptação e validação de um questionário para a avaliação da satisfação dos clientes, em relação aos cuidados prestados de enfermagem de reabilitação - SNQ-10 (Questionário de satisfação com os cuidados de enfermagem – 10).
Foi efetuada uma pesquisa exaustiva de instrumentos utilizados, na área da avaliação da satisfação do cliente, relativos aos cuidados de enfermagem de reabilitação, considerando-se, como demonstra a revisão da literatura, a aplicação do SNQ – 10 (Satisfaction with Nursing Questionnaire).
O estudo decorreu entre Outubro de 2011 e Fevereiro de 2012, sendo os objetivos deste trabalho: adaptar culturalmente para o idioma Português o SNQ – 10 e testar a versão adaptada, numa amostra de clientes da ULS-Guarda; avaliar a reprodutibilidade da escala; avaliar a consistência interna da escala adaptada e correlacionar os dados encontrados com a avaliação do SNQ-10.
Quadro Teórico
A satisfação do cliente tornou-se uma importante componente da qualidade do atendimento, no clima competitivo do mercado dos cuidados de Saúde, para a identificação e monitorização dos consumidores. Com efeito, a opinião do cliente tem vindo a ser cada vez mais ponderada no domínio científico (Gomes e Mendes, 2008; Charalambous, 2010).
Elevados níveis de satisfação dos clientes serão relacionados com cuidados de Saúde de alta qualidade e a consequente adesão ao regime terapêutico (Athanasiou e Darzi, 2010).
O conceito dos indicadores de satisfação, está associado à prestação positiva dos cuidados de enfermagem. Porém, as expectativas vão alterar com o tempo, devido ao conhecimento acumulado. Tem sido assinalado que a melhoria na qualidade dos cuidados aumenta os níveis de expectativas. Como resultado, é possível que o aumento de qualidade dos cuidados possa levar a uma redução paradoxal de satisfação (Athanasiou e Darzi, 2010).
Usando a revisão da literatura como orientação, elaborou-se um mapa sobre a satisfação do cliente, patenteado na Figura 1.

Figura 1. Satisfação do Cliente
A atividade dos enfermeiros é produzida em prol do cliente e do objetivo da disciplina, vinte de quatro horas por dia, permitindo ao mesmo, desenvolver perceções acerca da experiência hospitalar destes profissionais (Barker, 2009).
Em Portugal, não existe nenhum questionário capaz de avaliar a satisfação do cliente relativa aos cuidados de enfermagem de reabilitação, na sua generalidade.
Neste âmbito, a validação do SNQ-10, constituiu um instrumento, para a aquisição de informação acerca da satisfação do cliente, referente ao êxito dos cuidados de enfermagem de reabilitação.
Foi efetuada, uma revisão da literatura, com o desígnio de evidenciar as componentes de questionários validados acerca dos cuidados de enfermagem de reabilitação.
Primeiramente efetuou-se a pesquisa eletrónica no portal B-on, pois circunscreve os recursos disponíveis na Medline; PubMed; Annual Reviews; Elsevier (Scienc Direct); SpringerLink (Springer/Kluwer); Wiley Online Library (Wiley); Academic Search Complete (EBSCO); Web of Science (ISI); Current Contents (ISI); Repositório Cientifico de acesso aberto de Portugal (RCAAP); Scielo. Nas buscas foram considerados os seguintes descritores: escalas de satisfação (Patient satisfaction scales), combinada com enfermagem (nursing) 330 resultados; validar (validated) 227 resultados; reabilitação (rehabilitation) 535 resultados e enfermagem de reabilitação (nursing rehabilitation) 41 resultados. A indagação foi retrospetiva até 2005.
A pesquisa foi aperfeiçoada, alargando o tempo de busca (1997) e utilizando os seguintes termos: validar escalas de satisfação (validated satisfaction scale), 496 resultados; construir escalas de satisfação (construct scale satisfaction) relacionado com enfermagem de reabilitação (nursin rehabilitation) 7 resultados; construção e medida (Construction measuring) articulado com instrumento de reabilitação (instrument rehabilitation) 12 resultados; validade de construto de enfermagem de reabilitação (construct validity of nursing rehabilitation) 139 resultados e construção de uma escala de satisfação do cliente (construct a scale of patient satisfaction) 232 resultados.
Os seguintes critérios de inclusão e exclusão foram estabelecidos para determinar a relevância do artigo:
Os critérios de inclusão
1) A população de estudo incluiu clientes de reabilitação;
2) O foco principal do artigo era sobre escalas de satisfação dos clientes face aos cuidados de reabilitação e assistência de enfermagem em reabilitação;
Os critérios de exclusão
1) O artigo centrado em clientes com patologias, sem ser enquadradas na reabilitação;
2) O artigo não continha dados originais, análise estatística e/ou resultados;
3) Os instrumentos foram utilizados no estudo como uma intervenção, isto é para medir a evolução do cliente;
4) O artigo não diz respeito a escalas de satisfação em enfermagem e/ou reabilitação.
Na Free Medical Journals a pesquisa foi efetuada até 2005, dos 2462 artigos potencialmente elegíveis, 20 foram selecionados e, através da análise minuciosa, um, preenchia os critérios intentados.
As características, dos estudos incluídos, no domínio das escalas de satisfação do cliente em enfermagem de reabilitação, são apresentadas na tabela seguinte (1).

As principais características dos artigos são apresentadas na tabela 1. Estes trabalhos provieram de Itália (2 artigo; Ottonelo, Benevolo, Zsirai, 2002 e Franchignoni et al 1997), Alemanha (1 artigo – Wressle et al, 2006), Suécia (1artigos – Öberg, 2002), Bélgica (1 artigo- Bouffioulx, Arnould e Thonnard, 2008) e Washington (1 artigo - Pasquina et al, 2008). Todos, utilizam metodologias distintas, como se elucida na Tabela 1.
Os procedimentos metodológicos são distintos em todos os escritos, como expõe a tabela 1, três descrevem minuciosamente a validade do constructo e dois apresentam a confiabilidade teste-reteste, (ICC = 0,98, p <0,001) (Ottonello, Benevolo, Zsirai, 2002; Wressle, 2006).
Pertencente aos aspetos éticos, nem todos os estudos abordam esta etapa essencial. Wressle (2006) refere ter obtido permissão do Comité de Ética da Faculdade de Ciências da Saúde Linko e alude ao anonimato, ao termo “consentimento livre e esclarecido”; Bouffioulx, Arnould e Thonnard (2008) apenas menciona a autorização pelo comité de ética da Universidade Catholique de Louvain e dos restantes manuscritos, não há referência às questões de natureza ética.
Relativamente aos instrumentos de colheita de dados, três estudos utilizaram concomitante com o questionário, entrevistas telefónicas e pesquisas baseadas na satisfação do cliente. Os demais, utilizaram apenas um método, o questionário.
A perceção do cliente, acerca dos cuidados de reabilitação, é preponderante para atingir a satisfação, melhorar a qualidade e garantir uma utilização adequada dos recursos de Saúde (Franchignoni et al., 1997; Öberg, 2002; Wressle et al., 2006; Pasquina et al., 2008). Assim, é adequado a elaboração de instrumentos de medida válidos e fiáveis, para avaliar a perceção do cliente aos cuidados de enfermagem de reabilitação.
Dos estudos selecionados, os vários autores apresentam fatores pertinentes nos estudos, que passaremos a analisar.
Franchignoni (1997) refere que os fatores relativos à satisfação do cliente são: 1) competência dos cuidados terapêuticos; 2) aspetos interpessoais (capacidade de fornecer informação e efetuar uma abordagem humana); 3) ambiente de cuidados; 4) disponibilidade e acessibilidade do serviço, assim como, continuidade do tratamento; 5) custos económicos do tratamento. Ainda neste âmbito, Öberg (2002), refere que os aspetos importantes que influenciam a perceção do cliente, correspondem às experiências anteriores de cuidado e doença; o desenvolvimento de Saúde percebido e antecipado; as suas características, personalidade, a interação entre clientes e profissionais perante a situação percebida e a continuidade dos cuidados.
O estudo de Wressle et al., 2006 transparece um questionário de 19 itens, abordando os seguintes fatores: 1) Informações (dar e receber informações sobre deficiências, procedimentos e intervenções); 2) Respeito e dignidade (ser visto, ouvido e respeitado); 3) Participação ativa (dada a oportunidade de influenciar as decisões); 4) Segurança (ter a oportunidade de conversar com o médico ou a equipa para discutir assuntos quando necessário); 5) Intervenções (intervenções de reabilitação e ajudas técnicas); 6) Ambiente físico (ambiente adequado às necessidades individuais); e 7) Planear a alta (questões práticas para garantir uma alta adequada e a continuidade do tratamento). Neste estudo obteve-se um coeficiente alfa de 0,79. O item de menor satisfação diz respeito ao ambiente físico (p <0,05). Comparações entre sexos revelam que os homens estavam menos preocupados no momento da alta, e que, estavam mais satisfeitos com os profissionais de Saúde, no que respeita à informação facultada, sobre as intervenções e sobre os efeitos do tratamento (p <0,05). Os resultados do estudo mostraram um elevado nível de satisfação com os cuidados recebidos.
Bouffioulx, Arnould e Thonnard (2008) efetuaram um questionário com 36 itens, de acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), apresentando nove domínios: conhecimento de aprendizagem e aplicação, as tarefas e atividades gerais, comunicação, mobilidade, autocuidado, vida doméstica, relações interpessoais e relacionamentos; áreas principais da vida e da comunidade, vida social e cívica. Este questionário demonstra alta confiabilidade (r = 0,94) e boa reprodutibilidade ao longo do tempo (coeficiente de correlação intraclasse = 0,98).
Interessa ressalvar que, através da análise dos artigos, o questionário que apresenta melhores resultados e cujos objetivos se adequam ao presente estudo é o SNQ-10 (Satisfaction with Nursing Questionnaire), e está destinado a avaliar a satisfação dos clientes internados, face aos cuidados de enfermagem de reabilitação, mostrando como os profissionais de enfermagem podem melhorar a sua atuação e consequentemente a qualidade dos cuidados, auferida pelo descontentamento do cliente. O SNQ-10 está dividido em duas partes, a primeira constituída por respostas fechadas divididas por 10 itens que investigam aspetos importantes da qualidade dos cuidados de enfermagem; os clientes escolhem entre 4 níveis de satisfação (muito satisfeito, satisfeito, pouco satisfeito e muito insatisfeito). A segunda parte constituída por respostas abertas a 3 questões gerais. O questionário foi aplicado a 223 clientes. O coeficiente alfa de Cronbach foi de 0,94, a correlação entre cada item e a soma de todos os outros itens variaram de 0,67 (“Quantidade de informações que recebeu) para 0,87 (“Disponibilidade de tempo dedicado a si”). Teste-reteste, examinado por meio do cálculo do percentual de concordância e o índice K para cada item do questionário, variaram, respetivamente, de 87,5% a 100%, e de 0,77 para 1. O coeficiente de correlação intra-classe (ICC) para o score global foi 0,98. A análise fatorial apontou um único fator que explica 74% da variância da matriz global.
O SNQ-10 foi adaptado e validado para a língua portuguesa, atendendo aos direitos de autor, bem como, às questões éticas, constituindo o objetivo principal deste trabalho. Nesta linha de pensamento, constituirá uma mais-valia para a práticas dos cuidados de enfermagem de reabilitação, pois desta forma, será mais inteligível obter resultados concernentes à perspetiva do cliente e assim melhorar aspetos menos valorizados, com o intuito de atingir cuidados de reabilitação de excelência.
Em síntese, o cuidado em enfermagem de reabilitação devem ser personalizado de acordo com os valores e necessidades do cliente. Conceitos de decisão partilhada e estabelecimento de metas são princípios das práticas de reabilitação. O cliente é a fonte de controlo. O conhecimento deverá ser partilhado livremente entre os profissionais de Saúde, os clientes e familiares. A tomada de decisão será baseada na evidência. A segurança é uma propriedade do sistema. A transparência é necessária para assegurar o cumprimento e a conformidade dos processos. E desta forma, sustentada num suporte teórico fundamentado e recorrendo a várias escalas de medida, a reabilitação obterá sucesso e consequentemente clientes mais satisfeitos.
Metodologia
De acordo com a finalidade e objetivo delineados realizou-se um estudo metodológico de natureza quantitativa, correlacional e transversal, através da tradução, adaptação e validação de um instrumento de medida.
A validade de um instrumento de recolha e medição de dados é um componente metodológico fundamental para que a interpretação dos resultados da investigação seja adequada à natureza dos fenómenos e das relações estudadas.
A tradução e validação do SNQ-10 foram baseadas em orientações (Beato et al , 2000; WHO, 2011) que recomendam tradução, retrotradução (back-translation) e revisão por um painel de especialistas e adaptação cultural, como evidencia a figura 2.

Figura 2. Fluxograma das ações para validação do questionário
Para adequar o SNQ-10 à realidade da população portuguesa, chegando ao QSEnf -10, foi necessário submete-lo a várias etapas metodológica:
Equivalência de Conteúdo – Escolha do SNQ-10 e Adaptação Cultural do QSEnf -10, no âmbito da enfermagem de reabilitação e consulta da literatura;
Equivalência Semântica ou Linguística – Comparação das duas versões portuguesas traduzidas e comparação da retro-tradução com a original, na tradução sistemática do QSEnf-10 e adaptação linguística do SNQ-10;
Equivalência Conceptual – Adaptação cultural do QSEnf-10, através do quadro de especialista e o estudo da literatura.
Assim, com o objetivo de proceder à validação das propriedades psicométricas da versão Portuguesa do QSEnf-10, pois não existindo nenhum estudo em Portugal era imperioso que o fizéssemos para confirmarmos a adequação da escala na avaliação da satisfação dos clientes face aos cuidados de enfermagem de reabilitação.
A validade de um instrumento refere-se ao ato deste medir o que pretende medir (Fortin, 2009). No âmbito da saúde um dos primeiros testes de validade que é feito, é o da validade de conteúdo, que se refere ao carácter representativo dos enunciados utilizados num instrumento, para medir o conceito ou o domínio em estudo (Fortin, 2009). Nesta perspetiva a representatividade do enunciado que constitui o conceito a medir já foi efetuado pela autora, nomeadamente a escolha do SNQ-10 e adaptação cultural do QSEnf -10, no âmbito da enfermagem de reabilitação.
Neste estudo foi realizada a análise de fidelidade e validade tendo como objetivo encontrar uma solução fatorial que fosse coerente com as conceções teóricas subjacentes (validade de constructo) bem como uma análise de consistência interna (homogeneidade dos itens) para as dimensões da escala.
A validade de construto evidencia-se através da análise fatorial pelo método de componentes principais e as rotações ortogonais Varimax dos fatores de modo a tornar compreensíveis as soluções que emergem de cada análise.
O questionário aplicado era de autopreenchimento e foi estruturado em duas partes. A primeira, composta por 10 itens (perguntas fechadas) que pesquisam aspetos importantes da qualidade dos cuidados de enfermagem de reabilitação, o cliente escolhe entre quatro níveis de satisfação, através de uma escala tipo Likert de quatro pontos (muito satisfeito, satisfeito, pouco satisfeito, muito insatisfeito). A segunda parte, apresenta três perguntas gerais (abertas), o cliente pode expor quaisquer aspetos particulares em detalhe, tanto positivos como negativos, e fazer sugestões sobre os cuidados de enfermagem de reabilitação recebidos durante o internamento.
As características sociodemográficas (como idade, sexo) e patologia foram preenchidas pelo cliente. Todos os questionários foram aplicados, sobre supervisão no preenchimento, por uma enfermeira especialista em enfermagem de reabilitação, disponibilizando-se para qualquer informação técnica ou linguística solicitada por eles.
O Universo é representado pelos clientes da ULS-Guarda, que envolve o Hospital Sousa Martins - Guarda (HSM-Guarda) e o Hospital Nossa Senhora Assunção – Seia (HNSA-Seia). O processo de amostragem foi o não probabilístico e a amostra deste estudo é constituída por 115 clientes com um score de ≥ 24 no Mini Exame do Estado Mental, no período de 5 meses (entre 1 de Outubro de 2011 e 28 de Fevereiro de 2012).
Os critérios de inclusão dos clientes abordados foram os seguintes:
a) aceitarem participar na investigação;
b) ter uma pontuação ≥ 24 no Mini Exame do Estado Mental (MEM), atendendo à idade;
c) o exame clínico não tem prejuízo na compreensão e expressão verbal;
d) estejam internados há, pelo menos, 3 dias ou em ambulatório, com pelo menos 3 sessões de reabilitação, realizado pelo enfermeiro de reabilitação;
e) completar pelo menos 8 dos10 itens do questionário;
Foram excluídos clientes que apresentavam os seguintes critérios:
a) incapazes de responder/escrever a este tipo de questionário;
b) cujas patologias não necessitassem da intervenção dos cuidados de enfermagem de reabilitação.
Para aplicação dos questionários foi solicitada autorização à Comissão de Ética da Unidade Local de Saúde da Guarda, nos serviços propostos para o estudo e que se passam a enunciar: HNSA-Seia – Serviços de Medicina, Convalescença e Cinesiterapia Respiratória; HSM-Guarda – Serviços de Medicina, Cirurgia, Ortopedia e Pneumologia.
Após autorização para a aplicação dos questionários, foi requerida autorização ao sujeito do estudo através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Informado. Para promover a honestidade nas respostas, toda a informação foi recolhida de forma anónima. Desta forma, ficou garantida a confidencialidade dos dados, assegurando que os mesmos não seriam, em momento algum, transmitidos individualmente a terceiros.
Para o tratamento estatístico dos dados utilizou-se o programa SPSS versão 16, com recurso a estatística descritiva e testes paramétricos.
Resultados:
Para a caracterização dos sujeitos da amostra utilizaram-se as seguintes variáveis: idade, sexo e comorbilidade associada.
Relativamente à idade dos participantes neste estudo, verifica-se que a média de idades foi de 65,75 anos, isto é, 66 anos, sendo a idade mínima de 18 anos e a máxima de 89 anos. No que se refere ao sexo dos participantes, constatam-se: sexo feminino 70 (57,4%) e 45 (36,9%) masculino, observa-se predominância feminina da amostra.
A patologia mais manifesta foi a ortopédica 33 (27,0%), segue-se a pulmonar 25 (20,5%), depois a traumática com 23 (18,9%), a cerebrovascular 11 (9,0%); a cirúrgica 9 (7,4%), a cardíaca 8 (6,6) e por ultimo a reumática com 6 casos (4,9%).
A fidelidade do instrumento de medida corresponde ao grau de precisão e consistência dos resultados, relativamente às circunstanciais acidentais em que ocorre a medição.
Segundo Pestana e Gageiro (2008) e Filho e Junior (2010), considera-se como um bom indicador para o coeficiente de fiabilidade quando é superior a 0,80, presumindo-se que o instrumento gera poucos erros e é considerado altamente fiável.
A fidelidade pode ser estimada segundo quatro meios: 1) a estabilidade ou reprodutibilidade, 2) consistência interna, 3) a equivalência, 4) a harmonização das medidas dos diferentes observadores.
A fidelidade, em termos de estabilidade, referente à consistência entre dados de duas medições com o QSEnf-10 (confiabilidade teste-reteste), realizou-se nos mesmos sujeitos com um mês de intervalo.
A equivalência, para estimar a confiabilidade, utiliza a observação estruturada por dois observadores (fidelidade inter-juizes) (Polit, Beck e Hungler, 2004; Fortin 2009). Esta refere-se à concordância dos resultados registados por dois enfermeiros especialistas, em enfermagem de reabilitação independentes, que observaram o mesmo acontecimento junto dos participantes.
A fidelidade da versão Portuguesa do QSEnf-10, foi avaliada através da consistência interna usando o coeficiente alfa de Cronbach, que permite estimar a homogeneidade dos itens, isto é, averiguar a concordância existente entre todos os enunciados que compõem o instrumento de medida, fazendo a avaliação das correlações entre enunciados após a utilização da escala (Polit, Beck e Hungler, 2004; Fortin 2009).
Com base na correlação com o total da escala e o valor do coeficiente alfa, se apagado esse item, verificou-se que não havia itens problemáticos, pois como se pode verificar no quadro abaixo, no seu conjunto, os itens apresentaram um alfa superior a 0,6, com exceção do item 3 e 7. No entanto, a opção foi a sua permanência, porque o valor de alfa obtido (0,85) nos 10 itens foi elevado, permitindo afirmar que a escala é fiável e tem uma boa consistência interna, para medir a satisfação do cliente face aos cuidados de enfermagem de reabilitação.

Tabela 1. Resultado da análise de consistência interna, dos 10 itens, da escala pelo método de Chronbach.
A validade de construto reflete a força das correspondências lógicas esperadas, entre os domínios do instrumento e outras medidas de satisfação do cliente, relacionadas com os cuidados de enfermagem de reabilitação. Segundo Fayers e Machin (2007), a validade avalia todos os constructos que envolvem o instrumento e as suas relações. A validade de conteúdo refere-se ao carácter representativo dos enunciados utilizados num instrumento, para medir o conceito ou o domínio em estudo (Fortin, 2009).
A análise fatorial foi o método escolhido, para averiguar a validade do constructo, e consiste em atribuir uma medida (score) a fatores que não são diretamente observáveis (Moroco, 2003).
O total da variância explicada, segundo os critérios de normalização de Kaiser obtido, pela análise factorial dos componentes da escala, revela que os dois primeiros enunciados explicam 52,74% da variância da escala. O valor próprio inicial do 1º item foi 4,229 e a percentagem da variância de 42,30%; o valor próprio inicial do 2º item foi de 1,05 e a percentagem de variância de 10,45%.

Tabela 2. Matriz de saturação dos itens da análise fatorial das componentes da escala.
Salientamos que a medida KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) de 0,832 e o valor do teste de especificidade de Bartlett de X2 = 358,358; p=0.000, o que nos permite prosseguir a análise fatorial.
Fazendo a rotação, pelo método Varimax, dos itens da escala (Quadro 1) verificou-se que os mesmos se agrupam de modo diferente, do proposto no estudo original, criando duas dimensões distintas, como se apresenta no quadro seguinte.
Estes resultados colocam em questão a validade de construto do instrumento, pois a agregação dos itens parece obedecer a uma lógica nova: um componente agrega as questões 7, 5, 6, 9, 10, 4, 3 tendo-se designado esta dimensão por, Qualidade no Atendimento, o outro componente agrega os itens 1, 2 e 8 tendo sido designada esta dimensão por, Ambiente Terapêutico. De salientar que, o item 3 obteve um resultado muito semelhante nos dois componentes, podendo justificar-se esta duplicidade, pela ambiguidade conceptual implícita: o apoio que recebeu do enfermeiro especialista de enfermagem de reabilitação pode integrar a qualidade no atendimento ou o ambiente terapêutico estabelecido.

Quadro 1. Análise Fatorial de componentes principais Varimax com 2 fatores.
Discussão
Apesar de existirem, na literatura portuguesa, outros questionários de avaliação da satisfação dos clientes – ESCCE de Dias e Rodrigues (2003); SUCEH e SUCECS de Ribeiro (2005) e EORTC IN-PATSAT 32 de Martins (2009), o SNQ-10 foi utilizado no presente estudo, pois comporta um instrumento específico de linguagem simples, com tempo de aplicação viável e o original ter sido aplicado num hospital, cujos cuidados traduzem a reabilitação.
A importância da tradução e adaptação fizeram-se notar neste estudo, pois as várias reuniões com os peritos, contribuíram para um consenso de aplicação dos 10 itens e daí uma boa aceitação da população estudada, não havendo necessidade de alterações.
No que concerne aos índices de fidelidade, os fatores obtidos apresentam resultados psicométricos inferiores aos encontrados no estudo original que possui um alfa de 0,94. Neste estudo, constatou-se um alfa geral de 0,85, indicando que a medida de satisfação global de fiabilidade é boa (Hil e Hill, 2005; Pestana e Gageiro, 2008)
O QSEnf-10, na língua Portuguesa, mostrou resultados satisfatórios quanto à clareza e apresentou confiabilidade e validade adequadas, evidenciadas pelos coeficientes e cargas fatoriais resultantes, quando comparados à validação do instrumento original. É importante ressalvar que houve alteração na estrutura original. O artigo original de Ottonello, Benevolo, Zsirai (2002) demonstra apenas um fator, contudo, através da revisão da literatura patenteia-se que os questionários aceites para este estudo, apresentam vários fatores (Franchignoni et al., 1997; Öberg, 2002; Wressle et al., 2006; Pasquina et al., 2008). Os dois fatores explicam neste estudo 52,74% da variância, das variáveis originais, resultado inferior ao encontrado, no estudo original de 74% da variância, da matriz global. É necessário destacar que mesmo sendo uma percentagem inferior à escala original, é um valor importante e adequado, em termos, de poder explicativo. Corrobora Hair (2006) quando a informação é menos precisa, não é raro considerar uma solução, que explique 60% da variância total e em muitos casos menor que esta percentagem, como satisfatória.
Em suma, se analisarmos os resultados apresentados, quer da análise fatorial exploratória, quer da consistência interna, à luz dos critérios de determinação dos fatores estabelecidos, podemos afirmar que a adaptação do questionário, ao contexto português, da enfermagem de reabilitação possui razoáveis qualidades psicométricas iniciais. E, assim sendo, a sua estrutura deve ser alterada.
Com base nos pressupostos referidos, o terceiro item sugere ambiguidade, isto é, a “Capacidade de reconforto” avalia o que deve estimar?
Dado os resultados encontrados com o item 3, nomeadamente: peso fatorial abaixo no fator “Ambiente Terapêutico” (0,440); existência de cross-loading com o fator “Qualidade no atendimento” com um peso fatorial de 0,344 (diferença inferior a 0,15); a consistência interna do fator “Ambiente terapêutico” reduz uma milésima se o item for eliminado (de 0,793 para 0,792); podemos analisar a hipótese de eliminação do item em questão, mas, na eliminação, a consistência interna no questionário para N=115 é 0,84 ao invés é 0,85, logo, considerada boa (Pestana e Gageiro, 2008; Filho e Júnior, 2010).
Mediante o exposto, a solução de eliminação do terceiro item só deve ser colocado depois de uma análise fatorial confirmatória, com o intuito de verificar a existência dos mesmos problemas. Assim, nesta fase preliminar, propomos a revisão do valor semântico-lexical dos itens em causa.
Conclusão
Este estudo demonstrou que o Questionário de Satisfação com os Cuidados de Enfermagem-10, aplicado ao contexto da reabilitação (QSEnf-10), é uma medida com índices fatoriais aceitáveis de validade e fiabilidade. Como tal, parece-nos razoável afirmar que o QSEnf–10 poderá ser utilizado, com relativa confiança, na avaliação das necessidades dos clientes, no contexto da Enfermagem de Reabilitação. A consistência interna do questionário 0,85 indicou uma boa correlação e homogeneidade entre todos os itens. No entanto, os resultados da análise dos componentes principais mostraram não existir sobreposição aos obtidos no artigo original.
O Enfermeiro Especialista em Reabilitação deve conhecer a satisfação do cliente, bem como, os fatores que a influenciam, para obter do cliente uma avaliação positiva do cuidado que promove.
A investigação, em enfermagem de reabilitação, contribui grandemente para pensar a ação na perspetiva de cuidar, permite igualmente que o investigador seja capaz de obter maior compreensão, para avaliar as situações humanas, na sua singularidade e complexidade. Portanto, a divulgação deste estudo torna-se relevante, fomentando o interesse por questões aliciantes, para continuidade em futuras investigações, nomeadamente: realizar estudos da satisfação dos clientes com os cuidados de enfermagem de reabilitação, em cada serviço, anualmente, verificando o impacto das mudanças propostas; aplicar o questionário no início da prática clínica e no final, explanando as expectativas dos clientes e melhorar a qualidade dos serviços.
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Joana Lopes, Enfermeira
Nota: Este texto foi escrito pela autora ao abrigo do novo acordo ortográfico.