Causas, efeitos e formas de prevenção

Problemas de voz nos professores

Atualizado: 
02/10/2014 - 09:44
Apesar de se reconhecer universalmente que os professores apresentam um maior risco vocal do que outros profissionais, ainda não está claro, em Portugal, que tal facto possa ser aceite como doença profissional.
Voz professores

No presente artigo define-se uso profissional da voz, indica-se a incidência, os factores causais e os efeitos dos problemas de voz e ainda as formas de avaliação e estratégias de prevenção vocal para o professor.

Os professores são um grupo profissional mais vulnerável a problemas de voz do que a população em geral.

Apesar de identificarem os seus problemas de voz, muitos professores continuam a não procurar solução para os mesmos. Este facto, associado à percepção de uma melhoria da qualidade vocal nos períodos de férias, fá-los pensar na situação como um acontecimento ocasional e por isso não tomam muitas vezes as medidas apropriadas e adiam a resolução do problema.

Como se produz a voz?
Ao surgir a vontade de comunicar oralmente, o cérebro transmite impulsos nervosos aos músculos do sistema respiratório, à laringe e às estruturas do tracto vocal. Deste modo, a coluna de ar pulmonar é sonorizada na laringe (fonação) e modulada no tracto vocal (em sons da fala).

Em suma, a voz é um som (resultante de um conjunto de acontecimentos no aparelho fonador e ao longo do tracto vocal) com uma determinada força, sonoridade, duração, velocidade e ritmo regulado de forma subconsciente pela informação enviada ao cérebro via auditiva.

Voz habitual versus uso profissional da voz
Através da sua dimensão verbal (palavra articulada, fala) e não verbal (intensidade e sonoridade), a voz habitual produz-se sem que o emissor tenha qualquer preocupação voluntária com ela. É o resultado de uma aprendizagem inconsciente que envolve processos de produção, transmissão e percepção. Ela é aceite como “normal” se estiver adequada ao sexo, idade e contexto sócio-cultural do indivíduo e se o mesmo a aceitar como “normal”. Ao longo do dia, consoante as condições do indivíduo e o contexto de uso vocal, a qualidade vocal deve variar dentro de limites adequados do ponto de vista da intensidade, sonoridade, precisão articulatória e velocidade de fala.

Na actividade profissional do professor, a voz tem um papel importantíssimo, uma vez que pode facilitar ou prejudicar a inteligibilidade da mensagem, bem como ser uma fonte de indexação de informação estética, linguística e cultural, potencializando ou não a eficácia e a credibilidade da sua comunicação oral.

Muito embora a exigência da qualidade de precisão vocal do professor não seja crucial (quando comparada, por exemplo, às necessidades de um cantor lírico), deve, no entanto, possuir resistência elevada para fazer face a factores como a necessidade contínua de horas de comunicação vocal, às condições acústicas do local de trabalho, ao cansaço e ao stress emocional.

Incidência e prevalência dos problemas de voz
Apesar das limitações em termos de investigação nesta área (do ponto de vista do número e da diversidade de metodologias usadas), constata-se que os professores são, efectivamente, profissionais com maior risco vocal devido ao desgaste vocal resultante do desempenho profissional, associado na maioria da situações à falta de (in)formação em voz.

No contexto clínico, de entre os doentes que procuram resolução para os problemas de voz, os professores aparecem entre as dez profissões mais frequentes.

Sintomas vocais e físicos
De entre os sintomas vocais mais referidos pelos professores encontram-se a fadiga vocal (fonastenia), o atrito vocal, o hiperfuncionamento e rouquidão.

Os sintomas de desconforto físico referidos pelos professores são a sensação de cansaço, de esforço, de secura, de comichão, de queimadura, de dor e de desconforto.

Impacto na qualidade de vida
As hipóteses de perturbações vocais são inúmeras e as suas consequências em termos de saúde e de qualidade de vida dependem de cada indivíduo, da sua dinâmica pessoal e profissional.

Em termos de saúde, os problemas de voz podem existir na ausência de patologia laríngea, mas o contrário também é verdadeiro. Convém salientar que o perpetuar de comportamentos vocais de risco (como, por exemplo, uso vocal inadequado e continuado, perpetuar de cansaço vocal) associado a factores de desequilíbrio (como, por exemplo, hipersensibilidade nasal) e a más condições de vida (como, por exemplo, hábito tabágico) pode contribuir para o aparecimento de patologia laríngea (por exemplo, nódulos vocais).

Em termos de impacto na vida profissional (actual e futura), os efeitos mais adversos dos problemas de voz identificados pelos professores estão relacionados com o terem de faltar, com as limitações nas decisões profissionais e a incapacidade para modificarem a sua carreira, bem como as opções para o futuro em termos de carreira.

Alguns conselhos de saúde vocal
Parece então fundamental que qualquer profissional da voz (neste caso o professor) tenha conhecimento de alguns princípios fundamentais da preservação da sua qualidade vocal.

Vejamos alguns exemplos:

  • O grau de impacto do consumo de medicamentos e de drogas na qualidade vocal depende da resposta biológica individual (por exemplo, idade, biotipo e stress), da relação dose-efeito, dosagem tomada e duração do uso do(s) medicamento(s).
  • O café, o chá preto, a Coca-cola, os anti-histamínicos e os corticoesteróides, são diuréticos que provocam a desidratação das mucosas, causando a sensação de secura e consequente vontade de «pigarrear» ou tossir. A cafeína é também um estimulante do sistema nervoso central que provoca alteração da coordenação e sensibilidade proprioceptiva, podendo ter como efeito o «tremor da voz».
  • A nicotina provoca tosse crónica, aumento da produção de secreções e agravamento do tom de voz (envelhecimento precoce das estruturas laríngeas) e contribui para o aparecimento de sinais de abuso vocal, como tosse e «pigarreio» persistentes.
  • Os barbitúricos, os tranquilizantes e o álcool actuam como depressores do sistema nervoso central, provocando alteração da coordenação e sensibilidade proprioceptiva.
  • Os broncodilatadores e os broncoconstritores (para o tratamento da asma e bronquite crónica) produzem efeito ao nível do fluxo de ar, podendo haver ruído respiratório, tosse e falta de ar (dispneia).
  • A permanência em locais de ambiente poluído pode criar fragilidade da mucosa nasal e nasosinusal (através da sua desidratação e vasodilatação) e oral (através da sua desidratação) e contribuir para o aparecimento de irritações generalizadas das mucosas e afectar a produção de muco, tornando-o mais viscoso.

Aconselha-se que:

  • Se fala com uma voz de intensidade muito forte para fazer face ao ruído de fundo, pense tornar-se adepto de uma campanha “antifalar-sobrepondo o ruído”. As campanhas antitabágicas e anti-ruído permitem a melhoria da qualidade dos espaços públicos, estabelecendo limites de segurança para todos. Será importante demonstrar a todos que a campanha “antifalar-sobrepondo o ruído” tem o duplo benefício de melhorar a qualidade dos ouvidos e das laringes;
  • Faça descanso vocal apropriado após o uso prolongado de voz ou uso vocal de intensidade forte. Sempre que se pára de falar, consegue-se um período curto de recuperação que beneficia os músculos. No entanto, sempre que se traumatiza a mucosa que recobre as pregas vocais, esta não é rapidamente recuperada. Este processo pode durar desde algumas horas a 72 horas;
  • Use uma precisão articulatória adequada, velocidade de discurso moderada com variações da entoação, em vez de aumentar a intensidade da voz para chamar a atenção dos alunos;
  • Fale na posição de pé, porque facilita a respiração natural, mas, por outro lado, lembre-se de que manter a mesma postura por um longo período de tempo pode ser extremamente cansativo.

Sugere-se que evite:

  • Fazer monólogos, onde, contrariamente às situações de diálogo, não existem praticamente momentos de paragem que permitem um tempo, ainda que mínimo, de recuperação vocal;
  • Usar a voz (em duração e intensidade) sempre que esteja “constipado” ou em período agudo de alteração das vias aéreas superiores (por exemplo, rinite, sinusite).
Fonte: 
ENSP
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico e/ou Farmacêutico.
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