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Já ouviu falar de Testamento Vital?

Atualizado: 
17/09/2019 - 15:17
Se já ouviu falar de Testamento Vital, sabe que não estamos a falar de nenhum testamento. Os Testamentos servem para aplicar a vontade da pessoa depois de morta. E neste caso, do tal dito Testamento Vital, é enquanto ela está bem viva.
Homem a assinar documento

Aliás a Legislação aplicável[1] refere e muito bem, que se trata de Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV). E o que quer isto dizer? Quer dizer que um cidadão, qualquer cidadão, pode determinar os cuidados de saúde que pretende que sejam ou não sejam efetuados quando ele não puder expressar essa vontade. Em termos práticos um cidadão pode exprimir que se tiver um acidente não quer ser ligado à máquina (normalmente esta máquina é um ventilador artificial).

Mas, e esta DAV tem vários “mas”, não é assim tão linear. Quando se dá entrada num serviço de Urgência está previsto que não existe obrigatoriedade de consultar o RENTEV. E isto é perfeitamente natural, uma vez que a espera para a consulta referida pode interferir com a rapidez das intervenções necessárias.

Mas referimos um RENTEV, que é a sigla para Registo Nacional do Testamento Vital. E o que se regista no RENTEV são as DAV. Confuso? Claro que sim! E por isso tanto alarido à volta de uma Legislação muito bem-intencionada e que em termos práticos o que diz é que cada cidadão tem o poder de gerir o seu processo de saúde/doença até quando já não está em condições do que quer e não quer que lhe façam.

Por outro lado o cidadão interessado pode pesquisar informaticamente através de http://www.portaldasaude.pt/portal/conteudos/informacoes+uteis/testamento+vital/testamento+vital.htm ou de https://servicos.min-saude.pt/utente/portal/paginas/RENTEVDestaque.aspx e recolhe todas as informações necessárias.

Ou pode ainda recorrer ao seu Enfermeiro e pedir ajuda. Aliás é nos Centros de Saúde que funciona a recolha das DAV, que devem ser entregues em papel e assinadas presencialmente. Só não podem efetuar DAV menores e pessoas limitadas judicialmente por interdição ou por inabilitação.

Se o não fizer no Centro de Saúde, terá de enviar por carta registada e com assinatura reconhecida em Notário. Bem mais complicado, mas haverá situações em que possa ser útil.

O Cidadão tem ainda a possibilidade de nomear um Procurador de Cuidados de Saúde, que em caso de impossibilidade do próprio cidadão tem poderes representativos para decidir em vez dele.

Mais uma vez o Enfermeiro, na nossa opinião, poderá ser o Procurador de Cuidados por excelência, uma vez que nos seus processos de proximidade e acompanhamento dos indivíduos e famílias estará na posse de conhecimento no que concerne ao projeto concreto daquela pessoa, bem como dos seus desejos para o fim de vida.

Aliás esse papel até poderá sair reforçado pela previsão legislativa de que a consulta ao RENTEV é feita pelo médico. Assim, cabe ao Enfermeiro o dever de solicitar a informação a que tem direito, consignado na alínea f) do n.º 2 do Artigo 75º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros publicado no Decreto-Lei nº 104/98, de 21 de Abril, alterado e republicado em Anexo à Lei nº 111/2009 de 16 de Setembro, pelo que o enfermeiro deve ser informado da existência ou não de DAV. Quer isto dizer que não tendo a faculdade de aceder ao registo, tem direito a ser informado, devendo de seguida atuar, como habitualmente, em conformidade com os desejos formulados pelo cidadão, defendendo esse desejo perante intervenções eventualmente menos esclarecidas. Sendo a vontade do doente atual, competente e esclarecida, deverá ser respeitada, seja no sentido do consentimento ou do dissentimento do cuidado proposto.

E porque referimos atual? Porque em qualquer momento, o cidadão pode revogar a DAV anteriormente formulada. E por isso não terá nenhuma consequência. Necessita é de se observar se o cidadão está capaz de formular o seu consentimento livre e esclarecido.

Se ainda não tinha ouvido falar do Testamento Vital então não se fique por aqui e consulte a legislação indicada e pergunte ao Seu Enfermeiro. Ele ajuda-o, como sempre.




[1] Lei n.º 25/2012 de 16 de julho - Regula as Diretivas antecipadas de vontade; Portaria n.º 96/2014 de 5 de maio - Regulamenta a organização e funcionamento do Registo Nacional do Testamento Vital; Portaria n.º 104/2014 de 15 de maio – Aprova o modelo de diretiva antecipada de vontade

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Autor: 
Rogério Gonçalves - Enfermeiro e Presidente do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro e/ou Farmacêutico.
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