Associação de Bioética defende

Extensão do direito a testamento vital a maiores de 16

O presidente da Associação Portuguesa de Bioética, Rui Nunes, defendeu a extensão do direito de elaborar um testamento vital a maiores de 16 anos, mesmo que para isso seja necessário o consentimento parental.

“Não vejo razão nenhuma para que maiores de 16 de idade, eventualmente com o consentimento parental, para termos a certeza de que há capacidade de decisão, não possam, se for esse o caso, elaborar um testamento vital”, afirmou Rui Nunes.

O presidente da Associação Portuguesa de Bioética falava a propósito do primeiro ano de funcionamento do Registo Nacional do Testamento Vital (Rentev), que se assinala no início de julho, que recebeu até quinta-feira 1.454 testamentos vitais, segundo dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde.

“Não se trata, porém, do número total de testamentos vitais dado que aqueles que foram apenas efetuados nos notários não estão aqui contabilizados”, sublinhou o especialista.

Três anos depois de aprovada a legislação e um ano de funcionamento do Rentev, disponível no Portal do Utente do Ministério da Saúde, o presidente da Associação Portuguesa de Bioética congratula-se com o facto de os profissionais de saúde estarem “em ampla sintonia, para não dizer em total sintonia” com este projeto.

Contudo, considera que “há aspetos que têm de melhorar”, nomeadamente em relação à divulgação.

“Não basta tratar-se de um direito das pessoas, as pessoas têm de saber desse direito e têm de saber exercê-lo. Daí as propostas de alteração da lei. Não estou a apontar o dedo a ninguém, há aqui uma responsabilidade coletiva de falar deste temas. Não basta dizer, em abstrato, que há um direito e depois as pessoas não saberem como o podem exercer”, sustentou.

Um testamento vital, também designado como diretiva antecipada de vontade, tem como objetivo deixar expressa a vontade em relação aos cuidados de saúde que se quer, ou não, receber em fim de vida, caso se esteja impossibilitado de o expressar de forma autónoma.

Na prática, a hipótese de fazer um testamento vital já existia desde 2012, mas cada pessoa tinha que redigir o seu documento e ir a um notário para o documento ser juridicamente válido. Desde o início de julho de 2014, que esse procedimento pode ser feito no Rentev.

Rui Nunes defende que a lei deveria indicar “o aconselhamento profissional, nomeadamente médico, não de uma maneira obrigatória ou compulsiva, mas como uma forte sugestão”.

Em termos de funcionamento do Rentev, “propomos algumas alterações, entre as quais introduzir uma cláusula relativa à sedação paliativa terminal. Ou seja, alguns países, como a frança e outros, legalizaram a sedação paliativa terminal, que não é uma forma de eutanásia, convém esclarecer, mas que se calhar devia merecer uma atenção especial na diretiva antecipada de vontade. O documento disponibilizado pelo Ministério da Saúde devia contemplar esta hipótese”, disse.

Rui Nunes sugere também que as instituições hospitalares informem todos os doentes sobre a possibilidade de efetuar um testamento vital.

“Isto é o que se passa nos países anglo-saxónicos e é por isso que eles têm taxas de adesão de 80 e 90% em determinados estratos populacionais”, sublinhou.

Para o diretor da Associação Portuguesa de Bioética e do Departamento de Ciências Sociais e Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, o ideal seria que quando um doente dá entrada numa instituição hospitalar lhe dissessem que tem o direito de fazer um testamento vital.

“Uma coisa tão simples quanto esta, que, por si só, não vai compelir ninguém, nem vai manipular ninguém. Trata-se simplesmente de dizer às pessoas que têm essa oportunidade. Esta é uma alteração que fazia sentido, mas num enquadramento altamente positivo”, frisou.

Um outro dado que, no entender do principal impulsionador do testamento vital em Portugal, merece reflexão é “perceber porque é que há muito mais mulheres a fazerem testamentos vitais”.

Segundo Rui Nunes, este facto pode traduzir “um fenómeno social e sociológico complexo”.

“É estatisticamente muito significativo e isso indicia que, se for por maior pro-atividade das mulheres, excelente, mas se for uma atitude defensiva ela tem que ser estudada, trabalhada e corrigida. Porque uma pessoa não pode fazer o testamento vital porque tem medo de ficar sozinha, mas por uma questão de convicção”, frisou o especialista.

A Associação Portuguesa de Bioética organiza na próxima quarta-feira, no Porto, com o apoio da Ordem dos Médicos, um seminário de balanço sobre o primeiro ano do Rentev.

Fonte: 
LUSA
Nota: 
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