Despesa com recursos humanos na saúde em Portugal abaixo dos países desenvolvidos

“Não se gasta muito com recursos humanos na Saúde em Portugal, estamos abaixo de outros países desenvolvidos. Estamos na ordem dos 32%-34% enquanto os outros países estão na ordem dos 38%”, disse à agência Lusa o coordenador do capítulo “Recursos Humanos na Saúde” do Relatório de Primavera 2018, Tiago Correia, preparado pelo Observatório Português dos Sistemas de Saúde e que é hoje apresentado.
No período mais intenso da crise, entre 2010 e 2015, houve “uma quebra significativa” da despesa com recursos humanos em saúde na ordem dos 9%.
Desde essa altura, tem havido uma recuperação do número de efetivos e da despesa com estes profissionais, mas “os anos da crise foram anos bastante complicados para este processo de crescimento e de recuperação sobretudo do SNS”, adiantou o investigador do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.
Contudo, o crescimento do número de profissionais no SNS foi assimétrico: médicos (internos e especialistas), enfermeiros e técnicos superiores de saúde cresceram a um nível superior à média do crescimento do conjunto dos profissionais (respetivamente 7,1%, 7,2% e 6,9%)”, afirma o relatório do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS), constituído por uma rede de investigadores e instituições académicas dedicadas ao estudo dos sistemas de saúde.
Já o número de técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica (3,2%) e assistentes operacionais (0,7%) cresceu abaixo da média e o dos assistentes técnicos diminuiu (-0,5%), adianta o relatório com o título “Meio caminho andado”, que analisou o período 2015-2017.
O crescimento das horas contratualizadas no SNS também apresenta assimetrias. O trabalho médico “aumentou significativamente (15,5%)”, enquanto o trabalho de enfermagem (0,1%) e dos técnicos superiores de saúde (0,8%) “praticamente estagnou”.
“Isto significa que o aumento nominal de enfermeiros (cerca de 3.000) e de técnicos superiores não teve reflexo no aumento real do trabalho”, afirma o relatório, que aponta como razão “mais plausível” para esta situação a redução de 40 horas para 35 horas semanais na Função Pública.
Nos casos dos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, dos assistentes operacionais e dos assistentes técnicos houve mesmo uma redução das horas trabalhadas de 4%, 4,8% e 8,5%, respetivamente.
Para Tiago Correia, a “leitura integrada entre o número de profissionais e horas de trabalho é fundamental para perceber o que é que o Governo tem feito ao nível do esforço da contratação, mas também aquilo que precisa de fazer para conseguir equilibrar todo o ajustamento que foi acordado da passagem das 40 para as 35 horas semanais”.
Os números também revelam iniquidades na rede pública e ao longo do território nacional. Os autores concluem que, para responder às necessidades de saúde da população de forma efetiva e eficiente, é fundamental planear a força de trabalho necessária em Portugal para daqui a 5, 10 ou 15 anos.
Para este “planeamento racional” é importante saber que “sistema de saúde se pretende em Portugal”, que “valências de cuidados se deseja que sejam asseguradas no SNS e como os serviços serão organizados”, bem como estimar quantos profissionais serão necessários e com que competências.
“Essa informação deve permitir estimar a diferença entre a força de trabalho hoje em dia disponível e a desejada no futuro”, afirma o documento, acrescentando que cabe aos decisores políticos escolher as medidas e estratégias para corrigir essa diferença.