Doença de Alzheimer

“A demência não é uma parte normal do envelhecimento”

Atualizado: 
15/09/2014 - 16:18
A Organização Mundial de Saúde reconhece as demências como uma prioridade de saúde pública. No entanto, segundo Tatiana Nunes da Alzheimer Portugal, “no nosso país ainda existe muito trabalho a fazer”.
Doença de Alzheimer

Em todo o mundo, cerca de 35,6 milhões de pessoas vivem com demência. Segundo Tatiana Nunes da Alzheimer Portugal, “este número deverá duplicar até 2030 (65,7 milhões) e mais que triplicar em 2050 (115,4 milhões)”. Ao contrário do que se possa pensar “a demência não é uma parte normal do envelhecimento” e, embora se saiba que o número de casos diagnosticados irá triplicar até 2050, a realidade continua a ser ignorada.

A demência afecta pessoas em todos os países, com mais de metade dos casos (58%) em países desenvolvidos. Prevê-se que em 2050, este número seja susceptível de aumentar para mais de 70%. Ou seja, 7,7 milhões de novos casos de demência são diagnosticados por ano, o que significa que um novo caso de demência é diagnosticado a cada quatro segundos. Em Portugal estima-se que existam mais de 160 mil pessoas com Demência, 90/100 mil das quais com doença de Alzheimer.

Apesar destes números assustadores, apenas oito países em todo o mundo têm um plano de actuação para as demências, mesmo sendo a Organização Mundial da Saúde a pedir aos governos de todo o mundo para desenvolverem um Plano Nacional para as Demências com soluções e abordagens que impulsionem o diagnóstico precoce, sensibilizem a opinião pública sobre a doença, reduzam o estigma e proporcionem um melhor atendimento e mais apoio aos cuidadores.

Actualmente, cuidar de pessoas com demência tem, conforme explica Tatiana Nunes, “um custo de mais de 604 mil milhões de dólares por ano, incluindo a prestação de cuidados de saúde e serviços sociais, assim como a redução ou perda de rendimentos das pessoas com demência e dos seus cuidadores”. É portanto “ urgente que os países incluam as demências nas suas agendas de saúde pública”.

É necessária uma acção sustentada e coordenação entre os vários níveis e com todas as partes interessadas - a nível internacional, nacional, regional e local. As pessoas com demência e os seus cuidadores são partes indispensáveis neste processo. Devem ser envolvidos na formulação das políticas, planos, leis e serviços que os afectam.

A responsável alerta ainda para a importância de: “promover uma sociedade ‘amiga da demência’ a nível mundial; tornar a demência uma prioridade de saúde pública nacional em todo o mundo; investir em sistemas sociais e de saúde para melhorar o atendimento e serviços para pessoas com demência e seus cuidadores; aumentar a prioridade dada à demência na agenda dos estudos na área da saúde e, por fim, que cada país desenvolva o seu próprio Plano Nacional para as Demências”.

Plano Nacional para as Demências

Uma das batalhas que a Alzheimer tem travado é a criação e implementação, em Portugal, de um Plano Nacional para as Demências. Na prática, criar uma rede de cuidados médicos e sociais e serviços especialmente concebidos para estas pessoas, para que a autonomia, dignidade e qualidade de vida destes doentes continuem a ser respeitados. Para Tatiana Nunes, isto consegue-se através de um Plano ou Estratégia Nacional que contemple três tópicos fundamentais:

1. Melhoria da qualidade de vida das pessoas com demência e dos seus cuidadores, abrangendo-se aqui as questões que se prendem com a intervenção farmacológica e não farmacológica, com os apoios sociais e com os equipamentos, através da criação e implementação de políticas de saúde e de enquadramento social específicas;

2. Investigação sobre as causas, prevenção e diagnóstico da doença de Alzheimer e recolha de dados epidemiológicos;

3. Criação de quadro jurídico definidor dos direitos das pessoas em situação de incapacidade, incluindo o enquadramento legal dos cuidados, da intervenção e da investigação.

Para além disso um plano nacional não poderá esquecer a importância:

  1. Do diagnóstico atempado;
  2. Da valorização do papel dos clínicos gerais na detecção dos primeiros sinais da demência e encaminhamento para consultas da especialidade;
  3. Da valorização do papel dos cuidadores e do reconhecimento das suas necessidades específicas;
  4. Da integração do estudo da demência como matéria obrigatória na formação médica;
  5. Do desenvolvimento de acções de formação para cuidadores profissionais e familiares;
  6. Da existência de serviços e equipamentos modelo, com vista à aprendizagem e partilha das melhores práticas.

Doença de Alzheimer

A doença de Alzheimer, assim como outros tipos de demência, sempre estiveram indevidamente associados ao estigma da idade e da falta de capacidade mental. Muitas vezes, diz Tatiana Nunes, “ouvem-se expressões como: ‘Não ligues que tem demência’, ‘É normal, é da idade, já é velhote’ ou ‘Está maluquinho’”.

Torna-se, por isso, importante combater esta crença e reconhecer que as pessoas com demência têm direito à sua dignidade e a estarem incluídas na sociedade com qualidade de vida. É certo que estes doentes têm necessidades específicas que carecem de intervenção especial e atempada que fará toda a diferença em termos da preservação das capacidades e do bem-estar do próprio e de quem cuida. Tem igualmente benefícios em termos de custos directos e indirectos associados à prestação de cuidados.

Sintomas e diagnóstico

Os sintomas de demência são frequentemente confundidos com sinais normais de envelhecimento. Embora o progresso científico e a crescente preocupação da classe médica tenham melhorado no que respeita à doença de Alzheimer, existe ainda um número significativo de pessoas cujo diagnóstico é feito numa fase moderada ou avançada da doença, ou que nunca chega a receber um diagnóstico.

A verdade é que não existe um único teste capaz de, por si só, diagnosticar definitivamente a Doença de Alzheimer. O diagnóstico deve ser realizado pelo médico especialista (Neurologista ou Psiquiatra) através de um processo de exclusão de outras causas que possam ser responsáveis pelos sinais e sintomas apresentados.

“O papel dos clínicos gerais é crucial na detecção dos primeiros sinais de demência e no encaminhamento imediato para consultas da especialidade, permitindo um diagnóstico precoce”, esclarece a responsável.

A realização de uma avaliação médica e psicológica completa pode permitir identificar uma situação tratável e assegurar o seu correcto tratamento ou confirmar a presença de demência. Por isso o diagnóstico pode incluir a realização de:

  • História clínica detalhada, fornecida, se possível, pela pessoa que apresenta a sintomatologia ou por um familiar ou amigo próximo. Esta história irá permitir estabelecer se os sintomas surgiram lenta ou subitamente e qual a sua progressão.
  • Um exame físico e neurológico aprofundado, incluindo testes aos sentidos e movimentos, de forma a excluir outras doenças e a identificar quaisquer outras situações que possam agravar a confusão associada à demência.
  • Exames laboratoriais, que incluem uma variedade de análises ao sangue e à urina, para despistarem qualquer doença responsável pelos sintomas.
  • Outros exames especializados, como por exemplo: Raio X, Electroencéfalograma (EEG), Tomografia Axial Computorizada (TAC), Análises do Líquido Raquidiano ou Ressonância Magnética.
  • Uma avaliação neuropsicológica para avaliar as funções intelectuais que podem ser afectadas pela Demência, como por exemplo: memória, capacidades de leitura, escrita e cálculo.
  • Uma avaliação psiquiátrica para identificar perturbações tratáveis que podem mimetizar a Demência - como por exemplo: depressão e monitorizar os sintomas psiquiátricos que podem ocorrer juntamente com a Demência – como por exemplo: ansiedade e delírios.

Os cuidadores

Cuidar de alguém com demência acarreta exigências físicas e emocionais elevadas. Não só a vida da pessoa diagnosticada com demência se altera, como também a dos seus familiares e cuidadores que, sobretudo com o progredir da doença, passam a ocupar maior parte do seu tempo com as tarefas de cuidar, chegando a uma fase em que a pessoa com demência necessita de acompanhamento 24 horas por dia.

“Ninguém está preparado para lidar com uma tal situação. Pode causar “stress”, angústia e fadiga mental, tanto para a pessoa que vai passar a ser o cuidador principal, como para os outros membros da família”, refere Tatiana Nunes e acrescenta: “a primeira necessidade, à luz deste diagnóstico brutal, é a de obter informação sobre o que é a doença de Alzheimer, e de como vai ser o futuro. A duração média da doença, desde o momento em que se recebe a informação até ao momento em que é feito o diagnóstico, é de 10 anos. Isto pode significar 10 ou mais anos de dificuldades, durante os quais se deve tentar proporcionar a essa pessoa mais felicidade e uma melhor qualidade de vida”.

É por tudo isto que o grande objectivo da Alzheimer Portugal é melhorar a qualidade de vida das pessoas com demência e dos seus cuidadores, no respeito absoluto pelos Direitos Fundamentais à Liberdade e à Autodeterminação, promovendo a sua autonomia e o seu envolvimento social. Lutamos por uma sociedade que integre as Pessoas com Demência e reconheça os seus Direitos.

Dia Mundial da Pessoa com Doença de Alzheimer

O Dia Mundial da Pessoa com Doença de Alzheimer assinala-se a 21 de Setembro e constitui, sem dúvida, um reconhecimento mundial da importância e impacto que esta doença tem na sociedade.

Para assinalar o dia a Alzheimer Portugal organiza todos os anos diferentes actividades, sempre com o objectivo de “informar e consciencializar para a importância de reduzir o risco de desenvolver demência, para os sinais de alerta da Doença de Alzheimer e, sobretudo, para a importância do diagnóstico atempado”, refere Tatiana Nunes.

Estas medidas/cuidados irão permitir a prescrição de medicação que alivia os sintomas e retarda a progressão da doença, irão possibilitar a intervenção não farmacológica, no sentido da promoção e manutenção das capacidades da pessoa com demência, através da ocupação e do envolvimento social e, deste modo, permitir o aumento do seu bem-estar e qualidade de vida, assim como a dos seus cuidadores.

Autor: 
Célia Figueiredo
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico e/ou Farmacêutico.
Foto: 
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