UE atribui 6,5 milhões a consórcio que inclui a Fundação Champalimaud

Financiada Terapia Psicadélica aplicada a transtornos mentais resistentes ao tratamento nos Cuidados Paliativos

A União Europeia (UE) atribuiu mais de 6,5 milhões de euros a um consórcio com 19 parceiros, que inclui a Fundação Champalimaud (FC) em Portugal. Este financiamento irá apoiar a investigação sobre a utilização da psilocibina sintética, um composto encontrado em cogumelos “mágicos”, para aliviar o sofrimento psicológico em pessoas com doenças incuráveis que necessitam de cuidados paliativos. Trata-se da primeira vez que a UE financia um estudo clínico multicêntrico para um tratamento psicadélico.

A previsão é de que este estudo, denominado de PsyPal, comece a recrutar doentes em 2025, representando um passo significativo na exploração de tratamentos inovadores para o sofrimento psicológico e existencial profundo em pessoas com doenças avançadas. A FC, juntamente com três outros centros clínicos europeus, tratará mais de cem doentes, sendo que cada centro irá focar-se numa condição diferente. Enquanto que a FC dedicar-se-á a doentes com perturbações do movimento em fase avançada, incluindo síndromes parkinsonianos atípicos, outros centros nos Países Baixos, na República Checa e na Dinamarca abordarão a doença pulmonar obstrutiva crónica, a esclerose múltipla e a esclerose lateral amiotrófica, respetivamente.

Estas condições, todas incuráveis, têm um grande impacto na vida dos doentes, muitas vezes levando a um pesado sofrimento psicológico. Com a depressão e a ansiedade prevalecendo em 34% a 80% destes doentes, a necessidade de tratamentos inovadores é crítica. Albino OliveiraMaia, Diretor da Unidade de Neuropsiquiatria da FC, explica: “Inicialmente, os psicadélicos mostraram-se promissores no tratamento da depressão e da ansiedade em doentes com cancro terminal. No entanto, os resultados foram mais variáveis em doentes com transtornos psiquiátricos na ausência de um diagnóstico de risco de vida, o que nos levou a focar-nos novamente em condições incuráveis. Na FC, exploraremos a eficácia e segurança da psilocibina em pacientes com parkinsonismo em estado avançado”.

Carolina Seybert, psicóloga clínica e investigadora da FC, sublinha a urgência de encontrar alívio psicológico ou emocional imediato para doentes paliativos. “O nosso objetivo é oferecer alívio rápido e eficaz a estes doentes, para os quais as intervenções convencionais muitas vezes são insuficientes”. Seybert acrescenta: “Atualmente, na FC, ainda não estamos a administrar psilocibina para tratamentos de depressão e ansiedade. O próximo ensaio avaliará primeiro a sua segurança e eficácia em cuidados paliativos. Estamos especialmente interessados na eficácia do tratamento a longo prazo, um aspeto crucial que é frequentemente subvalorizado.

Ao estudo, concebido para durar três meses, seguir-se-á um acompanhamento abrangente de seis meses para avaliar resultados duradouros”. 

O estudo baseia-se num ensaio multicêntrico randomizado e controlado, permitindo aos investigadores recolher dados de uma gama diversificada de participantes em diferentes locais da Europa por forma a aumentar a validade e aplicabilidade das suas descobertas. Os doentes na FC serão submetidos a três sessões preparatórias, seguidas de duas sessões de tratamento recebendo psilocibina ou placebo.

Os participantes que receberem psilocibina começarão com uma dose mais baixa para avaliar a sua resposta, seguida de uma dose mais alta. Aqueles designados aleatoriamente para o grupo placebo também terão a oportunidade de realizar uma sessão de tratamento com psilocibina.

Seguir-se-ão três sessões adicionais de integração, onde será realizado apoio psicológico contínuo. Seybert observa: “Todos os terapeutas serão minuciosamente treinados e seguirão um manual padronizado, essencial para fornecer cuidados consistentes juntamente com a medicação”.

Marcelo Mendonça, neurologista que fará parte da equipa deste estudo, destaca: “Os cuidados paliativos são muitas vezes confundidos com cuidados de fim de vida, mas aqui estamos a considerar a gestão de sintomas complexos. Isto é particularmente importante para doentes parkinsonianos atípicos, que muitas vezes sofrem de elevadas taxas de depressão. Por razões que não são totalmente compreendidas, os tratamentos atuais não combatem eficazmente a depressão nestes doentes”.

Mendonça continua: “Uma vez que os sintomas depressivos são um indicador significativo de qualidade de vida, abordar a depressão é uma prioridade para nós. O nosso foco com este estudo é melhorar o bem-estar mental dos doentes, e não as suas funções motoras. No entanto, também é importante considerar que a depressão pode afetar a forma como os doentes percebem os seus sintomas físicos. Consequentemente, iremos monitorizar de perto não só os sintomas afetivos, mas também os sintomas cognitivos e motores para avaliar como evoluem durante o tratamento”.

Oliveira-Maia acrescenta: “Se este tratamento se revelar eficaz, no futuro teremos interesse em explorar as contribuições individuais do medicamento e do apoio psicológico na ajuda a doentes com depressão. Este conhecimento será crucial para uma alocação eficiente de recursos”.

 
Fonte: 
Fundação Champalimaud
Nota: 
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