Estudo publicado na revista Nature Neuroscience

Células "dançarinas" mostram como o cérebro desperta da anestesia, revela investigação

De acordo com um estudo da Mayo Clinic publicado na revista Nature Neuroscience, as células que atuam na primeira linha de defesa do sistema nervoso central contra lesões também desempenham auxiliam o cérebro a acordar da anestesia. Esta descoberta pode vir a ajudar a abrir caminho a métodos inovadores para tratar as complicações pós-anestésicas.

Ao sair da anestesia, mais de um terço dos pacientes pode sentir sonolência extrema ou hiperatividade, um efeito secundário chamado delírio. Investigadores da Mayo Clinic descobriram que células imunitárias especiais no cérebro, chamadas microglias, podem proteger os neurónios dos efeitos secundários da anestesia para despertar o cérebro.

"Esta é a primeira vez que vemos a microglia melhorar e aumentar a atividade neuronal ao rodear fisicamente os circuitos cerebrais", diz o neurocientista da Mayo Clinic Long-Jun Wu, autor sénior do estudo.

Os investigadores observaram a presença de microglias entre os neurónios e as sinapses inibitórias, suprimindo a atividade neural sob anestesia. Como descrevem, as micróglias parecem tentar proteger os neurónios para neutralizar a sedação.

O cérebro é constituído por uma rede de neurónios que desencadeiam e estimulam a atividade em todo o corpo. Os neurónios estão ligados por sinapses que recebem e transmitem sinais que nos permitem mover, pensar, sentir e comunicar. Neste ambiente, as microglias ajudam a manter o cérebro saudável, estável e funcional. Embora as micróglias tenham sido descobertas há mais de 100 anos, só nos últimos 20 anos é que se tornaram um importante foco de investigação.

No início, os cientistas apenas dispunham de lâminas fixas de micróglias para examinar, o que lhes dava apenas imagens instantâneas destas células. Inicialmente, pensava-se que quando os neurónios não estavam ativos e o cérebro estava calmo, as microglias estavam menos ativas. Depois, a tecnologia tornou possível observar e estudar as micróglias em pormenor, incluindo a forma como se movem.

"As micróglias são células cerebrais únicas porque têm processos muito dinâmicos. Movem-se e dançam à medida que percorrem o cérebro. Agora dispomos de imagens poderosas que mostram as suas atividades e movimentos", afirma Wu.

Há já alguns anos que Wu e a sua equipa têm vindo a desenvolver investigação sobre a forma como as microglias e os neurónios comunicam em cérebros saudáveis e não saudáveis. Por exemplo, demonstraram que as microglias podem atenuar a hiperatividade neuronal durante as crises epilépticas. Os investigadores podem observar estas células no cérebro em tempo real e registar os seus movimentos em modelos de ratos acordados utilizando tecnologia de imagem avançada, incluindo um microscópio eletrónico de varrimento.

Em 2019, os investigadores descobriram que as microglias podem sentir quando o cérebro e as suas atividades são restringidas, por exemplo, pela anestesia. Descobriram que as microglias se tornam mais ativas e vigilantes quando isso acontece.

"Podemos agora ver as microglias aumentarem a sua vigilância e patrulharem a atividade neural do cérebro como um polícia à noite, respondendo a atividades suspeitas quando tudo está calmo", explica Wu.

Os doentes com delírio ou agitação, quando saem da anestesia, podem também sentir-se hiperativos ou extremamente lentos. Os investigadores acreditam que a hiperatividade pode ser o resultado de uma intervenção excessiva das microglias entre os neurónios e as sinapses inibitórias.

"Se conseguirmos explorar o papel das microglias em vários estados fisiológicos, como o sono, poderemos aplicar este conhecimento para melhorar os cuidados prestados aos doentes em contextos clínicos", explica o doutorando Koichiro Haruwaka, principal autor do estudo e investigador sénior da Mayo Clinic.

 
Fonte: 
Mayo Clinic
Nota: 
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