Entrevista

A obesidade infantil é um dos principais problemas de saúde das crianças e dos adolescentes em Portugal

Atualizado: 
03/03/2022 - 14:42
"A obesidade é um problema de saúde pública e as evidências científicas mostram que as consequências da obesidade na infância, como a hipertensão ou a diabetes, acabam por acompanhar a criança ao longo de toda a vida. Os dados mostram que a incidência de diabetes tipo 1 entre a população pediátrica está a aumentar e a doença renal diabética continua a ser a principal causa de insuficiência renal a nível mundial”, explica, em entrevista, o Professor Alberto Caldas Afonso, Professor Catedrático de Pediatria, Diretor do Mestrado Integrado em Medicina do ICBAS da Universidade do Porto e Diretor do Centro Materno-Infantil do Norte do Centro Hospitalar Universitário do Porto (CMIN-CHUPorto), no âmbito da apresentação do livro “Cuida de Ti – Orientações para Uma Vida Saudável” que alerta para os perigos da obesidade e diabetes pediátricas.

Qual a evolução da incidência da obesidade e diabetes pediátrica em Portugal nos últimos anos e qual a perspetiva de evolução dos próximos?

A obesidade infantil e a diabetes, que está diretamente associada, é um dos principais problemas de saúde das crianças e dos adolescentes. É um problema que em Portugal tem uma dimensão muito preocupante, com taxas de excesso de peso e de obesidade muito próximas do 30%, o que coloca Portugal como um dos países com maior incidência desta doença, que afeta de forma transversal a toda a população infantil do nosso país. Se nada for feito, se mais medidas não forem implementadas, vai-se assistir a um aumento sustentado da incidência desta doença.

Quais os maiores desafios que as famílias dizem enfrentar na adoção de estilos de vida equilibrados?

Esta é uma área em que é difícil obter resultados. Estão por trás condições comportamentais muito enraizadas nas famílias e na comunidade, o que faz com que as mudanças de hábitos sejam difíceis de acontecer. O maior desafio para as famílias é perceber que o excesso de peso é um problema. Corrigir esta perceção não é fácil, uma vez que na infância não existe grande sintomatologia associada à obesidade. A informação deve ser bem enviada às comunidades (familiar e escolar), acompanhada de opções de alimentação saudável e exercício físico apelativas para cada faixa etária.

Há falta de literacia em saúde na população portuguesa?

Há muita falta de informação na família e na comunidade alargada. Este é um desafio multidisciplinar e temos que estar todos envolvidos no combate de este flagelo (excesso de peso e obesidade nas crianças) em termos de saúde pública.

Faz falta uma maior adaptação dos conteúdos e informação de saúde por parte das entidades promotoras ou é mais importante a promoção da literacia na população?

O primeiro enfoque tem que ser informar e sensibilizar as pessoas na importância de fazer face a este sério problema. A partir daí, devem ser criadas, junto dos principais intervenientes, condições e estratégias para promover a saúde. Tudo passa pela perceção do jovem e da família (no caso das crianças) de que o excesso de peso é um problema, e de estarem determinados em encontrar as melhores soluções e estratégias para o resolver. É importante que as pessoas saibam que é possível comer saudável e agradável. Depois, a comunidade no conjunto (escolas, autarquias, associações desportivas) deve encontrar maneiras de ajudar a controlar este problema. As crianças passam grande parte do seu dia nas escolas, muitas vezes tem uma parte das suas refeições neste ambiente, pelo que a comunidade escolar, para além da formação, tem também a responsabilidade de oferecer alimentação saudável e de promover o exercício físico através de atividades adequadas. Por outro lado, as associações devem desenvolver e oferecer práticas de exercício físico que vão ao encontro dos gostos das crianças e dos jovens. Obviamente, também são muito importantes questões legislativas de acesso a alguns produtos.

Qual foi o maior desafio no desenvolvimento do livro? Quanto tempo durou o processo?

O desenvolvimento do livro não foi um grande problema, uma vez que o objetivo estava bem identificado e existia uma alta preocupação por parte dos participantes, pelo que o envolvimento das pessoas no processo foi fácil. Foi desenvolvida uma proposta de intervenção na comunidade, cujo processo demorou aproximadamente dois anos. O foco foram duas áreas: alimentação saudável e exercício físico. O mais difícil foi identificar quais as ferramentas de comunicação que deveriam ser usadas para fazer chegar a informação aos diferentes tipos de público (população infantil, pré-adolescentes e adolescentes). Assim, foi desenvolvido um livro com conteúdos facilmente compreensíveis, muito práticos e que vão permitir a sua utilização no dia a dia. Para os mais novos, foi também concebido um jogo interativo que os desafia nas respostas as questões veiculadas neste livro. Tendo em conta o impacto das redes sociais nos adolescentes, foram desenvolvidos vídeos com dois ‘influencers’, uma atriz de televisão e um jovem atleta de alta competição, que mostram como a alimentação e a prática de exercício físico lhes permitem manter uma ótima performance diária.

É uma obra escrita a pensar na família como um todo ou mais dedicada às crianças ou aos pais?

Aos dois, é indissociável, sem as duas partes envolvidas e determinadas não é possível atingir o objetivo. Esta é a grande dificuldade para ter sucesso no combate à obesidade, conseguir que todos os intervenientes estejam alinhados.

Como é que as famílias e crianças podem ter acesso ao livro?

O livro vai ser distribuído pelas escolas de todo o país através da Missão Continente. Esta parceria foi muito importante porque permitiu a distribuição em grande escala para chegar ao maior número de pessoas. Vai estar também disponível no site da Missão Continente e no site do ICBAS. Existirão também exemplares impressos que serão distribuídos gratuitamente pelas escolas e por outros locais ainda a definir.

Fonte: 
Centro Hospitalar Universitário do Porto
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Centro Materno-Infantil do Norte do Centro Hospitalar Universitário do Porto (CMIN-CHUPorto)