Sintomas e tratamento

As hepatites não são todas iguais. Conheça os diferentes tipos.

Atualizado: 
27/08/2021 - 10:58
Embora sempre que se fala de Hepatite tenhamos a tendência para pensar nas hepatites víricas, existem, para além dos vírus, outras causas para a inflamação do fígado. Com a ajuda do especialista em Gastrenterologia, Rui Tato Marinho, hoje, damos-lhe a conhecer o essencial sobre este tema.

A hepatite corresponde a uma inflamação no fígado que, dependendo do agente que a provoca, se pode resolver apenas com repouso, requerer tratamentos prolongados, ou, em casos mais graves, só se resolver com um transplante de fígado.

De acordo com Rui Tato Marinho, a hepatite pode ser uma “hepatite alcoólica (excesso de consumo de álcool), hepatite medicamentosa, hepatite tóxica (poderemos pensar num produto tóxico, até pode ser um produto natural), hepatite isquémica (falta de sangue), esteatohepatite (excesso de gordura no fígado, fígado gordo), hepatite autoimune”.

Os diferentes tipos de Hepatite

Hepatite Medicamentosa

Segundo o especialista em gastrenterologia, “quase todos os medicamentos podem provocar lesão hepática”. No entanto, destaca o paracetamol, alguns antibióticos - entre eles a combinação de amoxicilina e ácido clavulânico - anti-inflamatórios e anti-depressivos como os “mais agressivos” para o fígado e que, mais frequentemente, causam a inflamação deste órgão. Rui Tato Marinho, chama a atenção ainda para “os ditos produtos naturais” que podem estar na origem da Hepatite Tóxica.

Quase sempre assintomática neste tipo de hepatite “apenas se regista alteração das análises do fígado (ALT, GGT)”. No entanto, acrescenta o especialista, “quando existem sintomas, nomeadamente icterícia, a situação pode complicar-se”. Por isso, tenha cuidado! Siga sempre as instruções do seu médico no que diz respeito à utilização de medicamentos.

Hepatite Autoimune

De acordo com o Presidente Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia, este tipo de hepatite ocorre “quando substâncias do próprio organismo auto lesionam o fígado. Podem ser graves, evoluir para cirrose, nalguns casos necessitar de transplante hepático”, explica acrescentando que são as mulheres as que correm maior risco de desenvolver algumas patologias autoimunes, como é o caso deste tipo de Hepatite.

O seu tratamento é feito com recurso a corticoides, “que podem ser associados a outros fármacos imunossupressores (…) que vão controlar as nossas defesas (para não provocarem lesões no fígado”. Segundo explica, apesar do medo generalizado da utilização deste tipo de fármacos, graças aos “potenciais efeitos secundários”, diz, “tem que se ter a noção de que salvam vidas”. E faz saber: “os casos que segui que necessitaram de recorrer a transplante eram pessoas que não cumpriram a medicação”.

Cansaço, olhos amarelos são alguns dos sintomas que podem lançar a suspeita deste diagnóstico, no entanto, Rui Tato Marinho, reforça “a necessidade de realizar análises ao fígado, incluindo neste caso os autoanticorpos, as tais substâncias que se viram contra o próprio organismo e destroem o fígado”.

Hepatite Alcoólica

A hepatite alcoólica é um tipo de hepatite causada pelo uso prolongado e excessivo de bebidas alcoólicas que, ao longo do tempo, provoca alterações no fígado e leva ao aparecimento de sintomas como fortes dores abdominais, náuseas, vómitos e perda de apetite, por exemplo. Quando não tratada, com abstinência alcoólica, pode evoluir para cirrose ou a insuficiência hepática. Os cuidados alimentares também são importantes para o seu tratamento.

Esteatohepatite

Vulgarmente conhecida por Fígado Gordo, a Esteatose Hepática é já considerada a doença do fígado mais frequente, embora pouco se oiça falar dela.  Atingindo mais de um milhão de portugueses, esta condição resulta da acumulação de triglicéridos e ácidos gordos livres nas células do fígado que, em casos mais graves e avançados, pode evoluir para cirrose.

As Hepatites Víricas

Provocadas por vírus, as mais frequentes são a hepatite A, B e C.

Hepatite A – provocada pelo vírus VHA, a sua transmissão “está associada a alguma quebra nas regras de higiene, mãos mal lavadas, alimentos contaminados, prática de sexo em grupo (homens com homens), viagens a continentes de risco como África e Ásia”.

Não existindo um tratamento específico, “apenas quando em casos raros as lesões do fígado são tão graves que implica um transplante hepático”, a melhor forma de prevenção é feita através da vacinação. “Eficaz em 95% dos casos”, explica Rui Tato Marinho, a vacina é “dada em duas doses, por via intramuscular”.

Hepatite B – é aquela que infeta mais pessoas no mundo - cerca de 250 milhões de pessoas. Segundo o especialista, “há países em que 10% da população é portadora crónica do vírus, sendo um reservatório ambulante e potencialmente infecioso e contagiante”.

Quanto à forma de transmissão, este vírus, também conhecido como por VHB, pode transmitir-se da mãe para o Filho se esta estiver infetada e o filho não for vacinado logo que nasce; por via sexual, por contacto com material injetável, ou perfurante contaminado por alguém que tenha o vírus ativo.

“Na grande maioria dos casos não existem sintomas, é assustadoramente uma hepatite silenciosa. Quando surgem sintomas é habitualmente na fase da cirrose avançada (icterícia, barriga de água, alterações mentais) ou do cancro do fígado”, explica o médico que recomenda a vacinação e a prática de relações sexuais protegidas como arma contra o vírus.

Hepatite C – provocada pelo vírus VHC, estima-se que, em todo o mundo existam 71 milhões de pessoas infetada. Em Portugal, contabilizam-se cerca de 40.000 com a doença.

Sendo muito silenciosa, cursando praticamente sem sintomas durante anos, quando surgem as primeiras manifestações, é quase sempre tarde demais. “Em cerca de 25% dos casos pode evoluir para cirrose, que é um estado de destruição do fígado em que as suas células morrem, formam-se cicatrizes e a sua estrutura fica muito desorganizada. A cirrose tem um risco elevadíssimo de evolução para cancro do fígado, 10-40% ao fim de 10 anos. O cancro do fígado é daqueles com pior prognóstico”, esclarece Rui Tato Marinho adiantando que o principal desafio quanto a este tipo de hepatite é conseguir identificar quem está infetado pelo VHC. E, tendo em conta que o tratamento com os antivíricos durante 2 a 3 meses, apresentam uma eficácia de quase 100%, o que significa que esta é uma doença que tem cura e que facilmente poderia ser erradicada, o Presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia admite que só temos três hipóteses: “ou testamos aqueles que pensamos serem de elevado risco, ou testamos pelo menos uma vez na Vida, ou testamos todos os portugueses. O mais racional é associar as duas primeiras estratégias”.

As principais complicações associadas à Hepatite C são: cirrose, cancro do fígado e mesmo morte. Segundo o especialista, “a cirrose pode, ao fim de 20-30 anos descompensar. Nesta situação só um transplante, se for exequível, pode salvar a vida. Na fase de “descompensação” tem que se pensar em substituir o fígado com um transplante hepático, se se tiver até 65-70 anos e não existirem contraindicações”. Tato Marinho adianta ainda que “Portugal tem sido um dos países do Mundo com um dos melhores programas de transplantes hepáticos”, chegando a realizar-se cerca de 250 por ano.  

Hepatite D – “É a chamada Hepatite Delta”, começa por explica Rui Tato Marinho. Trata-se, como esclarece, de um vírus “defeituoso” que precisa do vírus da hepatite B para viver. “Pode aparecer ao mesmo tempo do que a hepatite B, a chamada coinfecção ou surgir em quem já tem hepatite B, apelidando-se assim de superinfeção”, afirma. Muito rara em Portugal, “foi relativamente frequente há cerca de 20-30 anos em jovens consumidores de drogas”.

Com uma evolução rápida para a cirrose, não há um tratamento eficaz para este tipo de hepatite, no entanto, “a vacina da hepatite B previne também a hepatite Delta”.

No mundo, prevalecem alguns casos no Brasil, na região da Amazónia, em algumas zonas da Venezuela, e em alguns países de Leste.

Hepatite E – “A hepatite E é também mais uma das cinco principais hepatites víricas. Nas formas de transmissão é um pouco semelhante à hepatite A, ditas de transmissão fecal-oral. Ou seja, associadas a má higiene, mãos sujas ou alimentos contaminados, mas lavados”, começa por explicar o especialista acrescentando que “uma das caraterísticas principais é ser uma zoonose, pois pensa-se que se transmita do porco, javali para o Ser Humano. Não é só o coronavírus. Há estudos que demonstraram que talvez 4% dos portugueses possam ter tido contacto com este vírus”.

Embora se pensasse que este vírus só existiria no continente asiático e em África, ou seja, zonas de menor desenvolvimento económico, a verdade é que há casos de Hepatite E no continente europeu, inclusivamente em Portugal.

“Em Portugal é uma das causas mais raras de hepatite aguda. Não obstante, devemos sempre pensar na hepatite E neste contexto”, chama a atenção o médico afirmando que o seu diagnóstico é fácil, uma vez que existem testes serológicos para o efeito, mas apenas se tivermos presente que este vírus existe.

“É muito grave nas grávidas onde chega a ter 25% de evolução fatal. Em doentes com as defesas em baixo (ditos imunossuprimidos, por exemplo transplantados) pode evoluir para cirrose. Existe vacina, mas não está comercializada na Europa. A Hepatite E tem sido responsável por grandes epidemias na China e restante continente asiático”, refere o Presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia.

Hepatite G – “Em tempos falou-se muito de um eventual novo vírus chamado de G, que poderia estar associado a uma hepatite G. O vírus foi isolado de um cirurgião cujas iniciais seriam GB. Pensa-se que a forma de transmissão seja semelhante à hepatite C e B (sangue e sexo)”, no entanto, afirma o especialista, não tem significado em termos epidemiológicos e clínicos.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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