Doença genética rara

Acondroplasia: a forma mais frequente de displasia óssea

Atualizado: 
01/02/2021 - 09:59
Trata-se da forma mais frequente de displasia óssea, no entanto, poucos são os que reconhecem a esta condição pelo nome. A Acondroplasia é uma condição genética rara relacionada com baixa estatura e alteração dos ossos.

De acordo com Inês Alves, presidente da ANDO Portugal – Associação Nacional de Displasias Ósseas, a Acondroplasia “tem origem numa mutação genética, que se transmite de pais para filhos de uma forma autossómica dominante” e que ocorre ao nível do Recetor do Fator de Crescimento Fibroblástico 3 (FGFR3). “Por existir uma expressão deste recetor ao nível dos condrócitos, células que existem nas placas de crescimento dos ossos longos, quando ocorre mutação deste recetor, o desenvolvimento e multiplicação natural dos condrócitos é muito afetado, provocando uma diminuição muito acentuada do crescimento dos ossos longos”, explica revelando que a característica física mais marcante desta displasia óssea “é a baixa estatura desproporcional, com encurtamento dos braços e pernas”.

Segundo Inês Alves, esta displasia óssea caracteriza-se ainda pela presença de “macrocefalia, ou cabeça grande, proeminência da parte frontal do crânio, depressão da ponte nasal, hipoplasia facial, lordose lombar e mãos em tridente”. “São ainda frequentes alterações internas como redução do diâmetro do orifício na base do crânio, o Foramen magnum, sendo que, em alguns casos, é necessária cirurgia de descompressão medular; pode surgir estenose espinhal ao nível da coluna lombar, também com necessidade de intervenção cirúrgica e joelho varo, ou genu varus. O tamanho do tronco é relativamente dentro do padrão, mas é frequentemente deformado por lordose lombar excessiva”, adianta.

O seu diagnóstico baseia-se na presença de características clínicas e radiológicas. De acordo com a presidente da ANDO – Portugal, “é possível haver suspeita de diagnóstico de acondroplasia em período pré-natal pela ecografia de rotina do 3º trimestre e pode ser confirmado por amniocentese, com pesquisa da mutação mais comum do FGFR3”. Por outro lado, pode ainda realizar-se diagnóstico genético de pré-implantação, “uma técnica amplamente acessível”.

Após a confirmação deste diagnóstico, o bebé deverá ser referenciado para seguimento por uma equipa multidisciplinar com experiência em displasias ósseas. “Consoante as necessidades de cada criança, e em distintas fases da vida, poderão ser envolvidos nesta equipa especialistas de genética, neurocirurgia, pneumologia, otorrinolaringologia, fisiatria, ortopedia, reumatologista e também técnicos de fisioterapia, terapia da fala e terapia ocupacional”, acrescenta Inês Alves, também ela mãe de uma criança com Acondroplasia.

Atualmente, só existe tratamento farmacológico para cinco displasias ósseas, ou seja, para 1% das displasias ósseas existentes. A acondroplasia é uma das condições para as quais não existe ainda terapêutica. “Estão atualmente em investigação pré-clínica, e em ensaio clínicos, tratamentos farmacológicos para outras sete displasias, incluindo a acondroplasia. E não sendo curativos, estes tratamentos em desenvolvimento para a acondroplasia poderão ter um impacto positivo na redução de patologias associadas e na melhoria da qualidade de vida da pessoa com acondroplasia”, explica a presidente da Associação Portuguesa de Displasias Ósseas.

Apesar de esta displasia não implicar o desenvolvimento de outras complicações – segundo Inês Alves, “ocorre uma redução apenas ligeira na esperança média de vida em comparação com a população geral, possivelmente devido a complicações cardiovasculares” -, viver ou conviver com a doença é um desafio.

“A baixa estatura tem um grande impacto na vida das pessoas com displasias, pois todas as questões relacionadas com a acessibilidade, de forma a assegurar independência, são muito relevantes. Existem vários desafios sociais face à diferença física, ser diferente pode ser muito impactante para as pessoas com displasia óssea e para as suas famílias”, revela adiantando que “a sensibilização para a existência e aceitação da diferença física, com plena inclusão das pessoas com displasia óssea na sociedade, é [por isso] um dos grandes focos de trabalho da ANDO”.

Por outro lado, no que diz respeito à referenciação dos portadores desta displasia, embora já muito tenha sido feito, falta o “reconhecimento formal” de um centro de referência para displasias ósseas que permita agilizar este processo. “Existe, desde 2015, a consulta multidisciplinar de displasias ósseas no Centro Hospital Universitário de Coimbra, que teve um início paralelo à criação da ANDO. O Dr. Sérgio Sousa, geneticista clínico, foi o grande impulsionador desta consulta e quem coordena todos os casos clínicos no hospital pediátrico, enquanto que o Dr. Armando Malcata, reumatologista, coordena a consulta de adultos. Esta consulta multidisciplinar tem contribuído enormemente para o acesso a cuidados diferenciados”, explica Inês Alves. No entanto, “embora o CHUC e mais recentemente o Hospital de Santa Maria façam parte da Rede Europeia de Referência para as Condições Ósseas Raras, ERN BOND, é necessário avançar este reconhecimento para agilizar a referenciação clínica”, reforça.

A presidente da ANDO Portugal revela ainda que “é necessário criar um registo nacional de doenças raras para identificação das necessidades das pessoas com displasia óssea; é necessário simplificar, desburocratizar e atualizar a realização de estudos e ensaios clínicos em Portugal, de forma a melhorar o acesso precoce a medicamentos inovadores; é necessário fomentar a investigação nos nossos centros de excelência para as displasias ósseas, uma área com imenso por conhecer e com enorme potencial de estudo”.

Fontes:

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Rousseau, F., et al., Mutations in the gene encoding fibroblast growth factor receptor-3 in achondroplasia. Nature, 1994. 371(6494): p. 252-4. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8078586.

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Legeai-Mallet, L., & Savarirayan, R. (2020). Novel therapeutic approaches for the treatment of achondroplasia. Bone, 141, 115579.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Foto cedida pela ANDO Portugal