Hepatite C

VHC, um vírus silencioso

Atualizado: 
08/02/2017 - 09:42
Dia 1 de Outubro assinala-se o Dia Internacional de Consciencialização para a Hepatite C. Inês Vaz Pinto, especialista em Medicina Interna e Coordenadora da Unidade Funcional VIH/Sida do Hospital de Cascais, descreve-nos esta infeção viral, muitas vezes assintomática.

Hepatite é um termo médico que designa inflamação do fígado. Pode ter inúmeras causas, como os vírus (por exemplo vírus da hepatite B e vírus da hepatite C), alcoolismo, toxicidade de alguns medicamentos ou outros tóxicos (por exemplo cogumelos «venenosos»).

A maioria das pessoas que estão infectadas com o vírus da hepatite C (VHC) tem nenhuns ou apenas ligeiros sintomas, o que faz com que muitas pessoas desconheçam que têm a doença. Com o passar do tempo, habitualmente anos, a infecção crónica por VHC pode levar a lesão grave do fígado, a que chamamos fibrose, que no seu estádio mais avançado é a cirrose hepática.

Muitas das pessoas com hepatite por VHC não sabem como foram infectadas. A principal via de contágio do VHC é através do sangue. Assim, a maioria das pessoas infectadas adquiriu o vírus através de:

- partilha de agulhas, seringas e outro material usado para consumo de drogas endovenosas;

- transfusões de sangue anteriores a 1990, quando o sangue ainda não era testado para este vírus;

- relações sexuais com uma pessoa infectada.

A transmissão do VHC de mãe para filho durante a gravidez é muito rara. A transmissão não se dá através de beijos e abraços, espirros ou tosse, partilha de copos, talheres e outros utensílios de uso comum.

Não existe qualquer vacina para a hepatite C.

Quando uma pessoa inicialmente se infecta com o VHC desenvolve o que se chama uma hepatite aguda que pode ou não dar sintomas. Algumas pessoas conseguem combater e resolver a infecção nesta fase e ficam curadas, mantendo presente no sangue o anticorpo para o VHC, que é como que uma “cicatriz” indicadora de que já estiveram em contacto com o vírus. Mas a grande maioria das pessoas, entre 60 a 80%, não tem essa capacidade, o que significa que o vírus fica ativo no organismo, embora silencioso,  e desenvolve-se uma hepatite crónica.

A hepatite crónica por VHC é relativamente comum, com uma prevalência que se estima em quase 3% da população mundial.

Sendo uma infecção crónica com poucos ou nenhuns sintomas (o mais frequente é o cansaço, muito inespecífico), o diagnóstico da hepatite por VHC é feito muitas vezes em análises de rotina, ou quando se detectam algumas alterações nas análises gerais relacionadas com o fígado.

Numa primeira fase faz-se a pesquisa no sangue do anticorpo contra o VHC; se este for positivo avança-se para uma análise mais elaborada em que se pesquisa a presença do próprio vírus (o RNA do vírus).

Esta segunda análise pode vir negativa – o que significa que a pessoa está entre a minoria que conseguiu curar sozinha a infecção; ou vem positiva, sendo mandatório referenciar o doente a uma Consulta de Hospitalar (Gastroenterologia, Hepatologia, Infecciologia) de forma a se pesquisar qual o tipo de vírus C em causa (existem vários chamados genótipos, sendo o 1, 3 e 4 os mais frequentes em Portugal), avaliar o grau de lesão do fígado que já existe e propor o doente para tratamento.

A avaliação do grau de lesão ou fibrose do fígado faz-se hoje em dia por rotina através de meios não invasivos (em casos muito raros pode ainda recorrer-se a uma biopsia hepática).

O tratamento da hepatite por VHC teve uma evolução extraordinária nos últimos anos, sendo considerado uma das grandes revoluções da Medicina moderna. Até há poucos anos os tratamentos disponíveis incluíam injeções que o doente auto-administrava, eram difíceis de tolerar, com efeitos secundários muito significativos que levavam muitas vezes o doente a interromper o tratamento. Além disso, as taxas de sucesso do tratamento eram consideravelmente baixas, raramente atingindo os 50% de cura. Ou seja, com um tratamento longo e difícil de tolerar, por cada dois doentes tratados apenas um ficava curado.

Mais recentemente foram desenvolvidos e rapidamente introduzidos no mercado os chamados agentes antivirais de acção direta (AAD), sob a forma de comprimidos, muito bem tolerados (raros ou nenhuns efeitos secundários), e com taxas de sucesso terapêutico que rondam os 95-100%, dependendo do tipo de vírus, do grau de fibrose existente, e do historial terapêutico do doente. Estes medicamentos são de fornecimento exclusivo hospitalar.

Assim, com os tratamentos atualmente disponíveis, é possível ambicionar curar 100% da população infectada, o que significa que a hepatite crónica por VHC é uma doença potencialmente erradicável.

Autor: 
Dr.ª Inês Vaz Pinto - Coordenadora da Unidade Funcional VIH/SIDA do Hospital de Cascais
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
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