Saúde Mental

Saúde Mental das pessoas mais velhas

Atualizado: 
20/05/2019 - 11:31
O último estudo sobre Saúde Mental realizado em Portugal mostra que as doenças mentais apresentam as maiores taxas de incapacidade do país. A falta de conhecimento familiar, sintomatologia pouco clara e o medo de rejeição social são apresentados como os principais fatores que impedem o diagnóstico precoce. Na pessoa idosa a saúde mental apresenta características que a distingue das restantes faixas etárias e que são determinantes na identificação e prevenção da doença.

A Saúde Mental é uma parte indivisível da saúde geral e do bem-estar do indivíduo que pode ser perturbada tanto por fatores genéticos, quer por alguns fatores de risco modificáveis como a obesidade, hipertensão, depressão ou diabetes.

Sabe-se ainda que na terceira idade as demências são as doenças mentais que mais pessoas afetam, no entanto, os estado confusionais são os que mais estão ligados às taxas de mortalidade.

De acordo com o psiquiatra e coordenador da Unidade de Gerontopsiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Horácio Firmino, a chave para uma boa saúde mental é a prevenção.

“A tendência hoje, quando se fala em saúde mental, é nós estarmos a pensar na patologia que é diversificada. Mas aquilo que é importantte é desenvolvermos, desde criança, um bom capital mental”, começa por justificar o Professor.

“E o que é um bom capital mental? É nós, no fundo, desenvolvermos as nossas skills ou aptidões cognitivas, desenvolvendo uma boa reserva cognitiva e, ao mesmo tempo, desenvolvermos a capacidade de resiliência perante os fatores adversos da vida”, explica.

Para o especialista, estas são as duas componentes que determinam, em grande escala, o bom desenvolvimento da saúde mental.

“Na realidade, se nós desenvolvermos estas duas componentes estamos mais aptos, no fundo, a ter uma boa saúde mental”, afiança.

“Claro que se existir alguma perturbação no desenvolvimento que surge na sequência de experiências prévias, ou o aparecimento de quadros orgânicos, alguns erros comportamentais como seja o contato com a toxicodependência, as dificuldades em termos de educação ou abandono escolar, então aí começamos a ter algum fator de risco em termos da doença”, adianta acrescentando que também a genética é responsável por alguns dos quadros clínicos.

Deste modo, tal como refere o psiquiatra, cidadãos e organizações são elementos importantes no processo preventivo da doença mental.

“Tudo aquilo que nós fizermos em termos de educação, tudo aquilo que aprendemos em termos de relações e através da experiência, valorizando sobretudo os aspetos positivos” ajudar-nos-à, perante os designados “fenómenos de stress”, a diminuir a angústia, a frustração ou a tristeza, ou seja, “um conjunto de sintomatologia pré-desenvolvimento de um quadro clínico”.

“Se nós, pelo contrário, temos uma atitude crítica ou temos uma atitude substitutiva em termos dos comportamentos não vamos estar a ajudar a pessoa a desenvolver as suas próprias capacidades ou a lidar com os fenómenos de stress. Portanto é este papel que tem a ver com o próprio indíviduo e que tem a ver com meio que o envolve”, acrescenta.

Por outro lado, também as organizações assumem um papel relevante em matéria de prevenção. “A atitude que as chefias possam ter no estímulo, na modificação de comportamentos e, sobretudo, na concretização de estratégias positivas vai contribuir também para uma melhoria geral da saúde mental dos nossos concidadão”, refere.

Estigma e dificuldades de diagnóstico

Apesar de ainda se falar em estigmatização da doença mental, tem-se assistido, nos últimos anos, a uma maior aceitação da doença, embora muitos sejam ainda aqueles que desvalorizam os sintomas emocionais, por desconhecimento ou vergonha.

“Pouco a pouco a estigmatização da doença mental tem vindo a desaparecer, muito pela intervenção que os profissionais têm tido nesta matéria e a própria população já começa a procurar ajuda”, avança o especialista.

No entanto, as próprias características da doença na terceira idade são o que mais dificulta do diagnóstico. “A doença é diferente das populações mais jovens e há algumas crenças associadas à idade que leva a desvalorização dos sintomas. É comum pensar-se que tristeza e depressão toda a gente sente”, explica Horácio Firmino. “Embora a depressão não seja tão frequente como nos mais jovens, quando surgem quadros depressivos nas pessoas mais velhas eles são mais graves pelas suas características, apresentando maior risco de suicídio”, refere.

De acordo com os dados disponíveis, as taxas de tentativas de suicídio são mais altas entre os  adolescentes e jovens adultos, no entanto, a taxas de suicídio consumado são maiores nos mais velhos.  “Estas pessoas estão mais frágeis, sentem-se desamparadas, não apoiadas e portanto encontram na morte o regúgio ou a fuga destas vivências negativas”, explica acrescentando que o alcoolismo e a violência sobre os mais velhos têm um papel determinante nesta matéria.

“Por outro lado, também na medicina tem-se valorizado demasiado as queixas físicas e, muitas vezes, dá-se mais ênfase a isso e as pessoas continuam a ir ao médico queixar-se dos sintomas físicos que depois não encontram substrato anatómico ou fisiológico que os possam justificar”, acrescenta o psiquiatra.

“Em termos organizativos também é importante que se estabeleça uma ligação entre cuidados mais diferenciados de saúde mental, como é o caso da psiquiatria, e os cuidados gerais nas unidades de saúde locais ou que estão próximos da população”, esclarece reforçando a necessidade da existência de uma complementaridade terapêutica. “Temos de ter uma visão muito mais interventiva e de investir em alternativas terapêuticas”, afirma o especialista.

“Vou dar-lhe este exemplo: a atividade física e a atividade cognitiva são fatores de prevenção da doença mental nos grupos mais avançados da população. Portanto é preciso haver alguma intervenção não só médica mas também junto dos profissionais para manter as pessoas ativas”, diz explicando que estes fatores contribuem não só para diminuir os riscos de depressão, como para diminuir os números de internamentos e o consumo de medicamentos.

“Existem alguns estudos, neste aspeto particular, em que se verifica que as pessoas que têm maior mobilidade, que andam mais ou fazem jogging, ou que têm alguma atividade física têm um risco de quedas muito menor do que aqueles que estão parados”, justifica.

Não obstante, aponta o caminho para mais e melhor formação dos técnicos e também psiquiatras sobre os aspetos específicos da saúde mental das pessoas mais velhas.

Foi a pensar nesta lacuna que nasceu o livro “Saúde Mental das Pessoas Mais Velhas”, publicado pela editora Lidel e coordenado por este especialista.

“Não é por acaso que que nós avançamos com este livro que vai ajudar na formação dos técnicos que são os não psiquiatras, mas também psiquiatras, para perceber algumas especificidades da doença mental neste grupo em especial”, explica.

Tratando-se de um livro didático, ele cobre um conjunto de áreas importantes. “No fundo é uma éspecie de roteiro que abarca alguns problemas que afetam a terceira idade para que os técnicos, ou estudantes, possam vir aqui adquirir um conjunto básico de aptidões para depois aplicar na prática clínica, e na prática do dia-a-dia nas diferentes funções que possam estar a exercer”, refere o coordenador do manual.

“O livro tem a ver com um princípio de ação. É um desafio que nós fazemos aos vários técnicos para incrementar a saúde mental das pessoas mais velhas”, conclui.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Pixabay