Mesmo a trabalhar

No Hospital também há Natal…

Atualizado: 
24/12/2014 - 12:18
Vários Natais já passaram e alguns deles foram a trabalhar no hospital, com ausência dos meus entes queridos, mas com a missão de tornar aquele dia num dia especial para os doentes internados, que também estavam longe dos seus familiares e do seu lar.

Após alguns anos de trabalho, posso dizer que foram várias as emoções e as vivências partilhadas nesses dias. Viver estas datas especiais dentro de um hospital leva-nos a refletir sobre muita coisa, como profissionais e como pessoa que somos. Leva-nos a ver este dia tão especial por outro prisma.

Ainda tenho bem presente a “vestimenta” a rigor e o gorro de Pai Natal que não podiam faltar neste dia tão especial, tal como a decoração do serviço, precisamente para lembrar a época natalícia. Pois, dentro do Hospital os doentes perdem a noção do tempo e das movimentações próprias de cada época festiva, nomeadamente a do Natal.

Era comum nesta época do ano alguns idosos serem literalmente abandonados, quer na urgência, como no serviço de Medicina. Dói quando vemos situações destas e pensamos: um dia será que nos vão fazer o mesmo? Contudo, também nos deparavamos com situações em que os doentes achavam que estavam cheios de sorte por estarem internados no Hospital nesse dia, pois habitualmente passavam estas datas sozinhos, pelo facto de já não terem família ou por viverem longe desta e não quererem sair de suas casas. Outros, partilhavam que o seu desejo era estar com a família, apesar de que nestes dias eram permitidas visitas mais alargadas.

 

Cão de visita ao dono internado no dia de Natal

Existe um episódio que marcou um dos Natais e que jamais esquecerei. Havia um senhor com alguma idade que deu entrada no serviço com vários problemas e bastante debilitado. A dada altura percebemos que existia um pequeno cão que não saia da porta do Hospital e que despertou a curiosidade de todos. Como o Hospital era pequeno e todos se conheciam esse facto também foi comentado no nosso serviço, até que uma das visitas do tal senhor de idade comentou: “Esse cão é deste senhor que está aqui internado, ele tem este cão há muitos anos e ele é a sua única companhia, pois este senhor já não tem esposa e vive sozinho”, ficamos todos emocionados por percebermos o quanto este cão se dedicava ao dono e da forte relação entre eles. E comentamos entre nós, este sim é um verdadeiro exemplo de amor! Nesse Natal o cão permaneceu à porta do Hospital até o seu dono ter alta e regressar a casa, mas durante esse período e apesar de não ser permitida a entrada de cães no Hospital todos nós fomos alimentando o animal e levávamos o dono até à janela para ambos se verem e ouvirem, pois quando isto acontecia era uma festa e todos estávamos solidários com esta situação. Felizmente tudo acabou bem!

Neste dia festivo a cozinheira de serviço, fazia sempre um mimo de Natal para os doentes comerem e alguns familiares deixavam lembranças ou doces que partilhávamos entre todos. 

Os elementos da Liga dos Amigos do Hospital também alegravam este dia, passando por todos os serviços desejando boas festas aos doentes, familiares e profissionais e realizando uma breve comemoração alusiva ao Natal com canções ou leitura de poemas. Também ofereciam sempre uma lembrança simbólica a todos os doentes internados no serviço. Sem dúvida que neste dia o serviço tornava-se mais movimentado e era uma azáfama para realizarmos todas as rotinas em tempo útil, com o intuito de tentarmos estar com todos doentes de forma mais festiva e especial. A missão de não deixar passar este dia despercebido era uma tarefa por vezes difícil, exigindo um esforço extra principalmente quando o serviço estava lotado de doentes e com tantos cuidados para prestar. Tentávamos efetivamente que este dia não fosse igual aos outros, pois Natal significa amor e partilha. Assim, poderíamos dizer: que afinal no Hospital, também há Natal!

 

 

 

 

Andreia Eunice Pinto Magina, Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiátrica. Licenciada em Ciências da Educação

Autor: 
Andreia Eunice Pinto Magina - Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiátrica na Unidade de Cuidados na Comunidade de Oliveira de Azeméis ACES EDV II
Nota: 
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