Qual a relação?

As emoções e o coração

Atualizado: 
14/01/2020 - 10:00
Sabia que a alegria e a tristeza, assim como a felicidade, ansiedade ou a depressão, podem provocar alterações no desempenho do coração? Neste artigo, o Professor Victor Gil, coordenador da Unidade Cardiovascular do Hospital Lusíadas Lisboa, explica como as emoções podem influenciar a saúde cardiovascular.

Palpita o coração quando nos apaixonamos, acelera se nos assustamos, aperta-se quando nos angustiamos e é portanto compreensível que tradicionalmente o coração seja entendido como a sede das emoções.  Tem sido assim na literatura e nas artes plásticas, é assim na iconografia que remonta à idade média em que a ideografia do coração  surge como a representação metafórica do amor.

A lenta evolução da nossa espécie preparou-nos para reagir a agressões agudas. A reação de alerta, mediada pela ativação do sistema nervoso autónomo simpático, induz aumento das pulsações (taquicardia) proporcionando melhor desempenho cardíaco.

É também conhecido o papel do stress como factor de risco cardiovascular. No estudo INTERHEART, que envolveu mais 15000 doentes sobreviventes de enfarte do miocárdio, o peso dos factores psicossociais aparece a par da hipertensão, da obesidade abdominal e da diabetes, logo após o tabaco e as alterações das gorduras do sangue.

A chamada miocardiopatia de Takotsubo ou miocardiopatia de stress é uma situação aguda ocorrendo geralmente após stress psíquico ou físico que imita o enfarte do miocárdio, com afectação da contractilidade cardíaca por vezes importante, mas que ao contrário do verdadeiro enfarte, não se deve a trombose das artérias coronárias e reverte espontaneamente.

Técnicas avançadas de imagem - tomografia positrónica - permitiram recentemente estabelecer de forma robusta a relação entre a atividade de uma estrutura cerebral que se sabe estar envolvida no stress - a amígdala - e a doença cardiovascular subsequente, sendo esta a primeira vez que se demonstrou de forma inequívoca a relação entre as funções cerebrais e os eventos cardiovasculares, bem como as vias envolvidas: ativação da inflamação arterial e aumento da atividade da medula óssea.

Também conhecida é a associação entre depressão e risco cardiovascular, sobretudo nas pessoas de mais baixos rendimentos, mas a situação inversa, ou seja a relação entre afectos positivos e saúde cardiovascular tem sido igualmente objecto de estudo. Essa relação positiva foi elucidada no estudo "Canadian Nova Scotia Health Survey" em que mais de 1700 adultos foram seguidos por um período de 10 anos.

Muito interessantes são os resultados da análise dos dados dos participantes no  estudo MESA, um estudo multicêntrico de grande dimensão efectuado em seis regiões distintas dos Estados Unidos  envolvendo 5134 adultos com idades entre 45 e 84 anos. Ficou demonstrado neste estudo que uma atitude optimista, avaliada pelo teste LOT-R (Life orientation test-revisited) se associava a um futuro cardiovascular melhor que o dos doentes pessimistas.

A moderna ciência vai clarificando os mecanismos e as razões pelas quais o coração reage às emoções.

Entretanto, o coração vai continuando a inspirar românticos, artistas, fanáticos e fonâmbulos, como sede de mistérios ainda por desvendar. 

Autor: 
Professor Doutor Victor Gil - Coordenador da Unidade Cardiovascular do Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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