Entre a mania e a depressão

Doença bipolar

Atualizado: 
28/01/2014 - 14:43
Caracterizada por variações acentuadas do humor, com crises repetidas de depressão e ‘mania’, a doença bipolar afecta cerca de 1 a 4% da população portuguesa.

Anteriormente conhecida como doença maníaco-depressiva, a doença bipolar implica “episódios de humor onde os pensamentos, as emoções e o comportamento de uma pessoa se alteram bastante, de acordo com as suas oscilações de humor, que podem variar em termos de frequência, duração e intensidade, variando entre estados de depressão e de euforia”, explica Renata Frazão psicóloga clínica da Associação de Apoio aos Doentes Depressivos e Bipolares (ADEB). Ou seja, os doentes têm variações de humor que oscilam entre a depressão e a mania (euforia). Pode acontecer que o indivíduo apresente sintomas de crises mistas, altura em que existe presença de sintomas de ambas as anteriores fases. As crises, seja de depressão, euforia ou mistas, podem ser graves, moderadas ou leves, mas em qualquer das formas têm importante repercussão nas sensações, nas emoções, nas ideias e no comportamento da pessoa, com uma perda importante da saúde e da autonomia da personalidade.

Assim, conforme referiu Renata Frazão ao Atlas da Saúde, os principais sintomas da doença bipolar distinguem-se conforme a fase em que o doente se encontra. “Na fase maníaca existem sintomas como, sentimento de grande confiança ou importância; diminuição da necessidade de dormir; a pessoa fala mais que o habitual, distrai-se facilmente; desenvolve bastantes actividades, muitas vezes pela primeira vez, saindo das suas áreas habituais de funcionamento, com grande agitação e desassossego, mas com pouca capacidade de concretização; adopção de alguns comportamentos de risco devido às suas potenciais consequências - por exemplo, fazer compras excessivas, desinibição sexual - fuga de ideias”, diz, acrescentando que, “na depressão, a falta de energia ou cansaço; o funcionamento mais lento, ou com grande agitação ansiosa; as alterações de apetite e peso; a hipersónia ou insónia; os sentimentos de inutilidade ou excesso de culpa; as dificuldades de concentração, eventualmente pode surgir ideação suicida, com ou sem tentativa de suicídio são os sintomas mais frequentes”.

Contudo, a psicóloga clínica alerta que todos estes sintomas podem não ocorrer em todas as pessoas com doença bipolar, mas quando acontecem têm um forte impacto na sua relação com os outros, bem como ao nível social e profissional. Por vezes, comenta Renata Frazão, “podem ainda ocorrer episódios psicóticos, tais como alucinações, delírios ou pensamentos desorganizados”.

Um doente pode estar em cada uma das fases durante alguns dias, ou mesmo vários meses. O mesmo se aplica a estabilização da doença. Ou seja, uma pessoa com o tratamento adequado pode evitar o aparecimento das crises e estar em fase de estabilização durante meses ou até anos. Actualmente não existe cura para a doença bipolar, mas “é possível um nível de estabilização bastante regular, desde que a pessoa tenha uma boa adesão à terapêutica e ao tratamentos recomendados e uma atitude responsável face aos cuidados que a doença exige, tais como ter uma boa higiene de sono, não consumir drogas nem álcool, e ter um estilo de vida mais saudável”, recomenda a responsável.

Recomendações importantes para viver com uma doença cuja causa não é exactamente conhecida e pode surgir em qualquer idade. A especialista refere que “a doença bipolar está relacionada com a existência de uma vulnerabilidade biológica e genética em interacção com certos factores ambientais, sentidos como stressores e potencialmente desencandeadores do aparecimento da doença”. Logo, são vários os factores que podem originar o aparecimento de uma das fases da doença. A crise económico-financeira que atravessamos, por exemplo, pode na opinião de Renata Frazão “ajudar a desencadear sentimentos intensos de insegurança e instabilidade em todas as pessoas, e podem potenciar em indivíduos que já tenham predisposição para a doença bipolar, e apenas nestas, a manifestação de sintomas desta”. Isto é, remata a especialista, “a crise não provoca a doença bipolar, pode sim causar o aparecimento de sintomas desta doença, em pessoas com uma predisposição para tal”.

 

Diagnóstico e tratamento

O diagnóstico da doença bipolar é feito mediante uma avaliação clínica da sintomatologia e realizada pelo médico de família, psiquiatra ou psicólogo clínico. O especialista deve ter em conta “os sintomas actuais descritos pela pessoa e eventuais situações anteriores clinicamente relevantes para a construção do diagnóstico”.

A doença afecta de igual modo homens e mulheres, mais frequentemente surge no início da idade adulta, e tem uma prevalência de cerca de 1 a 4% da população, “apesar de alguns estudos indicarem uma prevalência superior”. No que respeita à incidência, Renata Frazão esclarece que “na ADEB tivemos em 2012 um número médio de 300 pessoas que nos procuraram pela primeira vez, com doença, sendo que destas, perto de 50% têm o diagnóstico da doença bipolar”.

No que toca ao tratamento, não existe um que cure a doença por completo. No entanto, é possível controlar a doença, através de medicamentos estabilizadores do humor, cuja acção terapêutica diminui muito a probabilidade de recaídas, tanto das crises de depressão como de mania. Assim, conforme explica a responsável, “o tratamento passa por uma terapêutica farmacológica, psicoeducação (aprender a viver com esta doença) e psicoterapia, para que a pessoa consiga fazer uma reflexão sobre o embate e percurso da doença na vida, e assim tentar controlar de forma mais eficaz os factores de risco na doença bipolar”.

É importante o apoio individual e familiar às pessoas com diagnóstica da doença. Isto porque a noção de doença mental ainda comporta um estigma social importante. Verifica-se uma tendência para considerar negativamente as pessoas que sofrem de doenças psiquiátricas. O conhecimento, mesmo que simplificado, das características da doença bipolar facilita a seu reconhecimento aos próprios (que a sofrem) e aos outros, possibilitando uma maior ajuda a muitas pessoas que carecem de um tratamento médico adequado e de uma solidária compreensão humana.

“Na ADEB, fazemos um apoio complementar e em articulação com psiquiatria, no sentido de promover a psicoeducação e apoio psicológico aos doentes e às suas famílias. Temos ainda grupos de auto ajuda e grupos psicoeducativos, que visam promover o combate ao estigma social, ao isolamento, e potenciar o contacto com outras pessoas com situações idênticas, o acesso a informação mais actualizada e adequada sobre a doença e a adopção de uma atitude mais positiva e responsável no manejo da mesma”, afirmou a especialista.

A ADEB tem a Sede Nacional em Lisboa e delegações regionais em Coimbra e Porto. No site www.adeb.pt pode encontrar mais informação acerca do trabalho desenvolvido.

Contactos da ADEB: Sede Nacional em Lisboa: 218540740; Delegação Regional do Norte (Porto): 226066414; Delegação Regional do Centro (Coimbra): 239812574.

Autor: 
Célia Figueiredo
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico e/ou Farmacêutico.
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