Opinião

Dor articular no Inverno: mito ou realidade?

Atualizado: 
27/11/2025 - 09:50
Durante décadas, a associação entre frio e dor articular foi vista como crença popular. No entanto, a evidência clínica confirma: as baixas temperaturas e a humidade aumentam a rigidez, reduzem a mobilidade e agravam sintomas articulares preexistentes. Estas alterações não são psicológicas — têm uma base fisiológica mensurável. A vasoconstrição induzida pelo frio diminui o fluxo sanguíneo para músculos e articulações, atrasando o aquecimento dos tecidos e aumentando a viscosidade do líquido sinovial — responsável pela lubrificação articular. O resultado é uma sensação de rigidez e desconforto que se intensifica em pessoas com artrose ou lesões antigas.

PORQUE AS ARTICULAÇÕES “RECLAMAM” MAIS NO FRIO

A resposta do corpo às baixas temperaturas combina vários mecanismos clínicos:

  • Menor irrigação muscular e articular → mais rigidez, menos flexibilidade.
  • Alteração da viscosidade sinovial → movimentos menos fluidos e maior atrito.
  • Contração muscular involuntária → mecanismo de defesa térmica que aumenta a tensão e a dor.
  • Maior sensibilidade dos recetores da dor, sobretudo em zonas já inflamadas.

Em conjunto, estes fatores tornam o inverno um período crítico para quem tem histórico de dor lombar, tendinites, artrose ou instabilidade articular.

 

QUEM ESTÁ MAIS VULNERÁVEL

  • Pessoas com artroses: o desgaste da cartilagem torna as articulações mais sensíveis às oscilações térmicas.
  • Atletas e praticantes ocasionais: treinar sem aquecimento adequado potencia ruturas e entorses.
  • Idosos e sedentários: menor massa muscular e termorregulação deficiente agravam a rigidez.
  • Doentes com lesões antigas: áreas cicatrizadas reagem mais intensamente ao frio e à humidade.

 

O MOVIMENTO COMO TERAPIA

O erro mais comum nesta estação é reduzir a atividade física.
A imobilidade agrava a rigidez, compromete a circulação e acelera o desgaste articular.
Pelo contrário, o exercício regular, adaptado à temperatura, mantém a lubrificação articular, estimula a circulação e reforça a musculatura de suporte.

Para treinar com segurança no inverno:

  • Realize aquecimento prolongado (10–15 minutos), com exercícios dinâmicos de mobilidade.
  • Utilize roupa técnica em camadas, que retenha calor e evite transpiração excessiva.
  • Evite pisos gelados ou com fraca tração e use calçado adequado.
  • Hidrate-se regularmente, mesmo sem sede — a desidratação aumenta o risco de lesão.
  • Termine com alongamentos suaves, prevenindo contraturas e rigidez pós-esforço.

 

CONSULTA MÉDICA: UM INVESTIMENTO PREVENTIVO

Durante o inverno, é frequente o agravamento de dores articulares crónicas e o aumento de lesões por sobrecarga.
Uma avaliação médica diferenciada permite detetar desequilíbrios musculares, encurtamentos e falhas de proprioceção antes que evoluam para lesões agudas.

Atualmente, a medicina desportiva dispõe de ferramentas precisas — ecografia musculoesquelética, ressonância magnética e plataformas de análise biomecânica — que permitem diagnosticar alterações precoces e orientar planos de treino personalizados.

 

CONCLUSÃO: O MITO TEM FUNDAMENTO

A dor articular no inverno não é um mito — é uma resposta biológica previsível e clinicamente comprovada.
O frio e a humidade alteram a fisiologia muscular e articular, mas não têm de significar dor nem paragem.
Com prevenção, aquecimento adequado e acompanhamento médico, é possível manter mobilidade, conforto e qualidade de vida ao longo de toda a estação.

 

O frio aperta, mas o corpo adapta-se — desde que o mantenhamos em movimento.

 

Autor: 
Por Prof. Doutor António Nogueira de Sousa - Especialista em Ortopedia e Traumatologia e Coordenador do Centro de Medicina e Traumatologia Desportiva HCUF Porto e Coordenador do Departamento de Saúde do FC Porto
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.