Opinião

A importância da Reabilitação Respiratória no doente respiratório crónico – ultrapassar barreiras

Atualizado: 
22/04/2022 - 11:15
Atualmente, e após a Era Covid-19, a sociedade encontra-se mais desperta para o impacto das doenças respiratórias, que apresentam uma elevada mortalidade e morbilidade em Portugal e no Mundo.

Segundo os últimos dados do Observatório Nacional para as doenças respiratórias, o tumor maligno da traqueia, brônquios ou pulmão e a DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica) são a 4ª e 5ª principal causa de morte na União Europeia; saliento ainda que correspondem à 6ª e 10ª posições se avaliarmos os anos de vida perdidos por incapacidade (DALYs). No European Lung White Book é referido uma perda de valor causada pelas doenças respiratórias superior a três mil milhões de euros no ano de 2019. É assim categórica a importância de todas as medidas possíveis para minimizar este impacto na comunidade.

Neste contexto destaca-se a reabilitação respiratória (RR) no tratamento do doente respiratório. Esta é definida pelas sociedades científicas (American Thoracic Society /European Respiratory Society) como uma intervenção não farmacológica compreendendo um programa de exercício físico e educacional baseado em evidência, dirigido aos doentes sintomáticos tendo como objetivos uma maior autonomia e qualidade de vida, independente da gravidade da doença. Deve ser adaptada, personalizada a cada doente e incentiva-se a envolvência dos cuidadores com disponibilidade para sessões de exercício duas a três vezes por semana, acompanhadas de sessões de educação e apoio psicossocial periódicas durante 8-12 semanas. A equipa multidisciplinar deve ser composta por diferentes especialidades como a Pneumologia, Fisioterapia/Fisiatria, Enfermagem, Nutrição, Terapia Ocupacional, Psicologia e Assistente social. Destaca-se a importância, para todos os fumadores, da referenciação para a Consulta de Cessação Tabágica.

A RR já demonstrou o seu benefício nos doentes respiratórios crónicos, nomeadamente com o diagnóstico de DPOC, Bronquiectasias, patologia do interstício e hipertensão pulmonar. Os estudos clínicos demostraram melhoria estatisticamente significativa na prova de marcha de seis minutos (PM6’), na força muscular nos membros superiores e inferiores, e nos dados de qualidade de vida (Health Related Quality of Life, St. George’s Respiratory Questionnaire, Short form 36 health survey). Documentada igualmente a diminuição de custos com a saúde com redução do número de dias de hospitalizações e das exacerbações respiratórias.

E qual o papel da RR no plano de tratamento dos doentes com cancro do pulmão? Para além de um adequado diagnóstico e estadiamento anatómico da doença oncológica é fundamental avaliar o performance status e estadiamento funcional, podendo este ser determinante na decisão terapêutica, inclusive determinar a opção cirúrgica. A importância da RR é transversal neste contexto.

Nos doentes que se submeteram a um programa de RR pré-cirúrgico (4-6 semanas) demonstrou-se a diminuição da morbilidade e do número de dias de internamento pós-operatório, com diminuição da incidência de infeções hospitalares bem como da incidência de atelectasia.

Após uma ressecção pulmonar testemunha-se um declínio da capacidade para o exercício, no entanto, nos doentes sujeitos a uma intervenção de RR precoce esta é minimizada, objetivando-se melhoria PM6’ e da força muscular; descrita igualmente a redução de sintomas respiratórios aplicando a escala de Borg. Menos consistentes são os resultados na função pulmonar (FEV1 - Forced Expiratory Volume in one second; FVC - Forced Vital Capacity) nos diferentes estudos clínicos, carecendo de mais dados neste grupo de doentes.

O cancro do pulmão apresenta-se, na maioria dos casos, como uma doença localmente avançada ou metastizada obrigando a terapêuticas sistémicas mais agressivas (i.e. quimioterapia e imunoterapia) em monoterapia ou em associação, podendo condicionar toxicidades várias em doentes já per si debilitados com intolerância ao exercício e queixas de fadiga, caquexia ou fraqueza muscular impactando a qualidade de vida e a adesão ao tratamento; a utilização da radioterapia pode contribuir para o eventual desenvolvimento de pneumonites em doentes com alterações estruturais pulmonares.

A RR neste setting está a desbravar o seu caminho estando já reportados benefícios comprovados na capacidade para o exercício, mensurável através dos resultados de PM6’. Destaco sobretudo o estudo de Edbrooke et al publicado em 2019 no Thorax que evidenciou impacto na sobrevida no grupo de doentes em programa de RR, embora não estatisticamente significativo.

Cada sessão confere uma oportunidade para detetar atempadamente problemas e toxicidades evitando degradação das queixas e inclusive evitando eventuais internamentos.

Dada a multidisciplinaridade do programa e sua adaptabilidade permite a educação do doente, e seus cuidadores, para melhor se ajustar às alterações inerentes à evolução da sua doença oncológica, em estreita comunicação com equipa de cuidados paliativos.

No dia 21 de abril a Sociedade Portuguesa de Pneumologia assinala o Dia Nacional da Reabilitação Respiratória. É uma chamada de atenção para a Sociedade em geral, bem como para a comunidade médica. Reforçar a RR como um pilar do tratamento do doente respiratório crónico inclusive com cancro do pulmão. É importante quebrar barreiras, os receios do exercício adaptado e seguro - contribuir para o objetivo principal de toda a intervenção cínica que é a qualidade de vida.

Autor: 
Dra. Patrícia Garrido - Assistente de Pneumologia Fundação Champalimaud
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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