Regresso às aulas

Identificação de maus-tratos em crianças pelos professores

Atualizado: 
12/09/2022 - 14:45
As crianças passam uma grande parte do seu tempo na escola. O contexto escolar tem como objetivos promover o desenvolvimento pessoal e social da criança, possibilitar oportunidades de realização pessoal, estimular o desenvolvimento global de cada criança, respeitando as características individuais, incutindo comportamentos que favoreçam aprendizagens significativas e diversificadas.

As escolas, mais concretamente o pessoal docente e não docente, encontram-se numa posição ideal para perceber quando um aluno/a está a ter problemas. Os profissionais da escola, nomeadamente professores/as e assistentes operacionais, podem ser as pessoas que fazem a diferença na vida dos alunos e alunas que estão a viver situações problemáticas. As escolas podem constituir-se como locais de segurança e apoio para crianças e jovens mais vulneráveis. A identificação precoce das dificuldades pode levar a um apoio e a uma intervenção mais rápida e eficaz junto de crianças, jovens e suas famílias.

A prevalência de maus-tratos num contexto de vulnerabilidade, de baixo nível socioeconómico é elevada, as crianças que apresentam cuidados parentais menos adequados são aquelas que têm pior rendimento escolar. A negligência é o tipo de maus-tratos que mais afeta o aproveitamento escolar, o que parece associar-se a perturbações emocionais e comportamentais.

A desvantagem sociocultural não traduz apenas a escassez de recursos económicos, ela produz outro tipo de vulnerabilidades, tais como disfunções cognitivas, perturbações psicoafectivas, problemas ao nível psicomotor e psicolinguístico, os quais interferem com o processo de aprendizagem.

São os professores que mais tempo passam com as crianças para além da família, e têm, desejavelmente, uma comunicação positiva com elas, desempenhando um papel e uma posição de observadores privilegiados. Por estes motivos, os docentes do ensino básico reúnem as condições desejáveis para detetar situações de maus-tratos, sendo por vezes os únicos que podem dar o primeiro passo na sinalização desta problemática.

É a educação que mais sinaliza situações de risco para as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens. Os profissionais de educação têm uma posição privilegiada para o reconhecimento de casos suspeitos, identificando cerca de 35% das situações de maus-tratos ou casos suspeitos. Seria verdadeiramente importante apostar na formação dos professores sobre este tema e que na própria instituição fosse delineado um plano de sinalização e intervenção nos casos identificados como possíveis vítimas maus-tratos.

Por se tratar de um gravíssimo e complexo problema social torna-se necessário e indispensável conhecer os fatores que conduzem ao aparecimento dos maus-tratos infantis, os diferentes tipos, as principais manifestações, assim como as suas diferentes formas de apresentação e expressão. A conduta mais adequada e as medidas de prevenção, tornam-se tarefas prioritárias para compreender esta problemática e permitem planear e desenvolver estratégias de apoio e acompanhamento às crianças e respetivas famílias.

Por todas estas razões, torna-se indispensável o diagnóstico precoce dos maus-tratos e a sua adequada intervenção, para evitar uma multiplicidade de acontecimentos altamente prejudiciais no percurso de vida de uma criança maltratada.

Pais e professores, devem ensinar formas de autoproteção às crianças. Os estudos demonstraram que, quando são usadas aproximações comportamentais, tais como modelos, exposição e encorajamento social, as crianças de 0 a 6 anos podem aprender habilidades de defesa pessoal.

O abuso sexual pode ser prevenido se as crianças forem capazes de reconhecer o comportamento inapropriado do adulto, reagir rapidamente, deixar a situação e relatar a alguém o que ocorreu.

É importante ensinar o que é comportamento abusivo e como se proteger de aproximações abusivas por parte dos outros, incluindo pessoas conhecidas, e não apenas os estranhos. É fundamental, também, ensinar a criança a ser assertiva e a tomar decisões adequadas no contexto das relações sexuais e sociais, assim como seguir regras simples e concretas.

O envolvimento de educadores como agentes de prevenção é outro aspeto importante. Devido às dificuldades que uma criança apresenta para revelar aos membros da família a ocorrência de abuso sexual e, considerando-se que a maioria dos casos de abuso sexual infantil é intrafamiliar, muitas vítimas podem recorrer à ajuda ou suporte fora da família. Em virtude da acessibilidade dos professores às crianças, estes, podem ser competentes para a identificação de estratégias de intervenção com as crianças vítimas de abuso.

As crianças com menos de seis anos de idade, apresentam mais dificuldade em denunciar o abuso, porque não têm condições cognitivas e verbais necessárias para articular a violência e proporcionar memórias adequadas dos eventos. Desta forma, os professores com competência, poderiam identificar, mais precocemente, sintomas do abuso nesta faixa etária e promover uma intervenção precoce, com o intuito de evitar ou amenizar as consequências imediatas do abuso sexual.

Assim os professores devem estar atentos para alguns sinais e sintomas que podem estar associados a casos de violência contra crianças:

  • Mal-estar físico
  • Cansaço
  • Tristeza ou afastamento dos/as colegas e atividades
  • Apatia
  • Evitar o toque
  • Baixa autoestima e falta de confiança
  • Dificuldade em prestar atenção nas aulas, em concentrar-se nos trabalhos e em aprender novas matérias
  • Alterações no rendimento escolar
  • Pouca ou nenhuma participação na sala de aulas e/ou em atividades de grupo
  • Explosões de raiva dirigidas aos profissionais da escola, a colegas e/ou a si próprio/a e/ou à propriedade da escola e/ou colegas
  • Violência ou agressão para com colegas dentro e fora da sala de aula
  • Faltas às aulas
  • Alterações repentinas na marcha e/ou sentar e/ou nas idas ao WC
  • Medo em voltar para casa
  • Fugas da escola/casa
  • Feridas autoinfligidas ou mutilação
  • Pensamentos e ações suicidas
  • Consumo abusivo de álcool e drogas
  • Lesões físicas incompatíveis com a explicação/em locais pouco comuns.
  • Marcas evidentes de maus-tratos.
  • Versões sucessivas e inconsistentes do mesmo “acidente”
  • História de “acidentes” semelhantes.
  • Fraturas e/ou lesões em diferentes graus de cicatrização.

Autor: 
Professor Doutor Albino Gomes - Enfermeiro Forense
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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