Principais distúrbios do sono

Do que falamos quando falamos em doenças do sono?

Atualizado: 
19/03/2021 - 10:41
O sono é um estado de repouso fundamental para o ser humano que tem impacto na saúde, bem-estar, equilíbrio emocional e qualidade de vida. O que aparenta ser um período de total quiescência, é na verdade um estado de intensa atividade cerebral, indispensável para o desenvolvimento do cérebro, da memória e de outras funções do organismo - capacidade de aprender, memorizar, criar, tomar decisões e fazer escolhas lógicas.

A privação de sono pode ter um impacto negativo em todos os sistemas do nosso corpo. Dificulta a manutenção da vigília, da atenção e da concentração, aumenta o tempo de reação e o risco de acidentes e provoca alterações de humor, instabilidade emocional e irritabilidade. Estudos científicos evidenciaram ainda uma relação significativa entre a falta de sono e múltiplas condições clínicas, como a obesidade, a diabetes mellitus tipo 2, a hipertensão, o enfarte agudo do miocárdio, a demência de Alzheimer e a disfunção erétil. A privação de sono tem também um impacto negativo no nosso sistema imunitário. Por tudo isto devemos valorizar o nosso sono e criar condições para que este seja de qualidade e quantidade suficientes.

Existem dezenas de distúrbios do sono e o diagnóstico adequado é um passo fundamental para uma abordagem bem-sucedida.

A insónia é o distúrbio do sono mais frequente no adulto, podendo apresentar-se na forma aguda (inferior a três meses) ou crónica (superior a três meses). Quem sofre de insónia pode apresentar dificuldade em iniciar o sono (insónia inicial) sendo esta a queixa mais frequente. No entanto existem outras formas de insónia, igualmente perturbadoras, como a dificuldade em manter o sono (insónia intermédia), a dificuldade em dormir até à hora pretendida (insónia terminal) ou, com menor frequência, uma sensação inespecífica de sono não reparador. Apesar de afetar até cerca de 50% da população, continua a ser pouco diagnosticada e pouco acompanhada por profissionais competentes.

A apneia do sono é outra perturbação do sono com elevada prevalência e que tem vindo a receber atenção crescente pela comunidade médica. Quem sofre de apneia do sono habitualmente ressona e apresenta paragens respiratórias durante o sono. Estes episódios são responsáveis por interrupções do sono, pela diminuição do sono profundo e por uma oxigenação deficiente durante a noite. A associação da apneia do sono a doenças como a hipertensão arterial, o acidente vascular cerebral (AVC) e o enfarte agudo do miocárdio tornam esta doença particularmente preocupante. Existe, também, uma forte associação entre a apneia do sono e a disfunção eréctil, razão pela qual alguns especialistas recomendam o rastreio de apneia de sono em doentes diagnosticados com esta patologia.

A síndrome das pernas inquietas é uma doença do movimento relacionada com o sono que se caracteriza por uma sensação de desconforto e desejo irresistível de mover as pernas e/ou os braços. Os sintomas ocorrem predominantemente em repouso e ao final do dia, dificultando o início e a manutenção do sono. É uma doença crónica com impacto negativo na qualidade de vida e que habitualmente agrava com o tempo. Felizmente a promoção de alterações de estilo de vida e comportamentos bem como intervenções farmacológicas permitem um controlo eficaz deste distúrbio.

A sonolência diurna excessiva (ou hipersónia) caracteriza-se pela incapacidade de a pessoa permanecer acordada ou alerta durante os principais períodos do dia, traduzindo-se em sonolência e períodos de adormecimento

incontroláveis e não intencionais. Esta pode ser resultado de outras patologias, como a apneia do sono, mas também do uso de medicamentos. Excluídas estas causas é necessário considerar a possibilidade de uma hipersónia primária, sendo o exemplo mais típico a narcolepsia.

Existem, ainda, outras perturbações do sono que importa diagnosticar e tratar, entre as quais se destacam as alterações do ciclo sono-vigília (como por exemplo o jetlag), e as parassónias, vulgarmente conhecidas como sonambulismo.

O diagnóstico e tratamento dos distúrbios do sono deverá, idealmente, passar por uma equipa multidisciplinar que inclua médicos especialistas em medicina do sono e de outras especialidades, pois só assim se constroem soluções adequadas a cada caso particular.

Deve pensar em procurar ajuda especializada quem apresentar cronicamente dificuldade em adormecer, acordar a meio da noite ou mais cedo do que o pretendido, apresentar paragens respiratórias ou engasgamentos durante a noite, sentir sonolência durante o dia, precisar de dormir progressivamente mais horas do que o habitual para ter energia, sentir dificuldade de concentração, desatenção ou irritabilidade. Apesar da existência de vários medicamentos usados em doentes com queixas relacionadas com o sono, não se deve nunca recorrer à automedicação, pois na maioria dos casos os resultados não são satisfatórios, podendo mesmo ocorrer efeitos adversos.

Alguns conselhos, práticos e simples, podem ajudar a promover uma boa noite de sono. Um dos mais importantes assenta na criação de rotinas, nomeadamente horários para acordar e para deitar. Procurar a exposição solar, no período da manhã, ajuda na regulação do nosso ritmo circadiano. Realizar atividade física regular, preferencialmente nas primeiras horas do dia, promove um sono de qualidade. É também importante reduzir o consumo de bebidas cafeinadas ou açucaradas, evitar refeições pesadas ao jantar e não fumar ou beber bebidas alcoólicas nas últimas 4 horas antes de ir para a cama. A exposição à luz dos écrans dos dispositivos eletrónicos deve ser evitada nas últimas horas antes de adormecer, pois pode inibir a secreção de melatonina, uma das hormonas responsáveis pela regulação do sono. Em alternativa, atividades que promovam o relaxamento, como um banho de água quente 1 a 2 horas antes de adormecer ou momentos de leitura podem ajudar a ter uma boa noite de sono. Criar um ambiente confortável para potenciar o sono é fundamental - para isso devemos dormir num espaço escuro, silencioso e com uma temperatura adequada (idealmente 16-20ºC).

Autor: 
Dr. Tiago Sá – Pneumologista especialista em medicina do sono; Diretor clínico da Sleeplab
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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