Testemunho de uma doente com Lúpus

Como a pandemia Covid-19 está a afetar a saúde do doente crónico

Atualizado: 
15/12/2020 - 18:20
O isolamento, o cancelamento de consultas e tratamentos, a par do medo de ser infetado com o novo coronavírus têm marcado a vida de muitos portugueses, entre eles os portadores de doença crónica. Isabel Marques fala-nos do desafio que é viver com Lúpus em plena pandemia.

A complexidade de um vírus ainda pouco conhecido, à escala mundial, assusta muita gente. Sobretudo a olhar para o número crescente de contágios e de óbitos que lhe estão associados. Não é dúvida para ninguém que, muitos são aqueles que, na incerteza do que nos espera no futuro, vivem com altos níveis de stress. É que entre os que correm maiores riscos, estão os que vivem com condições clínicas que deixam a sua saúde mais debilitada.

Isabel Marques, diagnosticada com Lúpus Eritematoso Sistémico há 16 anos, tem vivido os últimos meses com muita ansiedade. “Viver com o lúpus em plena pandemia tem sido de fato um desafio gigante”, começa por contar revelando que a sua situação clínica sofreu um agravamento durante o período pandémico. “O meu lúpus tem incidência no sistema nervoso central, (…) tenho muito mais dificuldade a nível motor articular pois a minha mobilidade neste momento é muito mais reduzida e a dor é uma constante na minha vida, pois esta cansa, desgasta, mastiga e dói, ou seja, é viver uma calamidade dentro de outra calamidade, o silêncio de uma dor que não se vê, potencializa e tem provocado um grande desgaste emocional porque o medo de apanhar o vírus é constante”, explica.

Como muitos portugueses, Isabel não teve tempo para pensar, apenas agir e refugiar-se em casa, quando foi instituído o período de confinamento. “O stress e o medo têm sido constantes nestes largos meses, pois eu, como muitos doentes como eu, vimos as nossas vidas ficarem suspensas… todo o meu estado emocional foi comprometido”, revela.

“Todas as minhas rotinas diárias foram comprometidas e o facto de ainda não sabermos quando poderemos ter as nossas vidas de volta, assusta!  Costumo dizer muitas vezes que éramos tão felizes sem sabermos…”, acrescenta admitindo que se sente desamparada e desanimada perante uma situação que não se sabe quando chega ao fim. “O impacto é muito grande a nível pessoal, laboral, social…”, lamenta.

Apesar de, na sua opinião, muita coisa estar a falhar, diz que, durante estes longos meses de pandemia, teve “a sorte de poder estar sempre acompanhada e seguida pela minha classe médica”. “Os meus médicos foram, de facto, além da minha família, um grande suporte de adaptação e informação na gestão desta pandemia permitindo assim dar continuidade ao meu processo de tratamento. É de salientar o esforço que é e exigido a todos os profissionais que estão na linha da frente que têm sido de facto uns heróis”, afirma não deixando de sublinhar, porém, que este processo não tem sido de todo fácil. “Neste processo todo de covid, vimos consultas desmarcadas sem se saber quando vai ser possível remarcar, exames médicos que até hoje não consigo marcar e são urgentes de fazer… isso tem sido um processo de grande ansiedade e de complexa gestão”, lamenta.

“Espero, a curto prazo, que possam, nos centros de saúde e hospitais, dar atenção aos doentes com patologias crónicas”, diz.  

Entre as principais preocupações, Isabel revela que, como ela, outros doentes lúpicos têm diariamente “pontas de iceberg para tratar”. “Precisamos de cuidados médicos permanentes e quanto mais tempo passa para prevenirmos e tratarmos, bem mais demorado será o processo de recuperação. Quando chegarmos às consultas, (todo o processo) vai ser mais complexo de se tratar”, lamenta.

“Esta pandemia trouxe muita solidão.  Nós estamos mais fragilizados. Falo por mim, a falta que faz o abraço do meu médico, que tantas vezes minimizou a minha dor num gesto tão simples”, admite acrescentando que é de extrema importância para o doente ter alguém que entenda o que sente e que o oiça. Por tudo isto, sente que a existência de grupos de apoio é muito importante na vida de um doente crónico. “Eu formei um grupo na rede do Facebook que se chama «Lúpus as guerreiras sem espadas» porque achei necessário apoiar, informar e partilhar vivências com pessoas que têm a mesma doença que eu”, explica acrescentando que, durante este período excecional de pandemia, tem sido um verdadeiro apoio para outros doentes, contado com a colaboração de médico ou psicólogos que, “de alguma forma, ajudam a minimizar a dor que possam estar a sentir”.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Isabel Marques