Atlas da Saúde - A hipertensão continua a ser um dos principais factores de risco do AVC?
Prof. Mesquita Bastos - Sim, a hipertensão arterial é o factor de risco mais importante como causa de morte cardiovascular. Os doentes hipertensos têm uma maior probabilidade de vir a sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) ou um enfarte agudo do miocárdio (EAM) ao longo da vida.
Quais as principais causas da hipertensão?
As principais causas da hipertensão são o consumo de sal em excesso, má alimentação, stress, obesidade, álcool, sedentarismo e hereditariedade.
Segundo os últimos dados qual a prevalência de hipertensão arterial entre os portugueses?
O estudo PHYSA [1] detectou que a doença atinge quase metade da população portuguesa (42%).
Na sua opinião, os portugueses continuam a não ter em atenção a quantidade de sal que consomem?
Sim, sem dúvida. A população portuguesa, apesar de consciente dos malefícios do consumo de sal em excesso, não está suficientemente motivada para alterar os seus hábitos de consumo. Segundo os resultados do estudo PHYSA [1], levado a cabo pela Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH) e representativo de Portugal Continental, pode-se inferir que 95,6% dos portugueses continua a ingerir sal acima do máximo recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), cuja recomendação é de apenas 5,5 gramas diários. Em Portugal consome-se em média 10,7 gramas de sal por dia. De acordo com os resultados da sondagem efectuada pela SPH, em Dezembro de 2014, apenas ¼ da população tem em conta a presença de sal nos produtos embalados, sendo os jovens aqueles que menos importância atribui a esta prática (82% não verifica o sal presente nos alimentos). Além disso, 3 em cada 4 portugueses não sabe identificar quais os alimentos que são fontes de sal.
Um estudo recente dizia que a hipertensão está mal controlada nos idosos. Isso deve-se essencialmente a que factores?
Deve-se ao facto de se tratar de uma doença silenciosa, indolor e que não apresenta sintomas alarmantes ou identificáveis. É uma doença perigosa porque os seus sintomas só são visíveis em estados mais avançados, ou seja, quando já há forte indício de AVC ou EAM. A hipertensão, quando é detectada numa simples consulta de rotina, pode já ter causado algum tipo de dano em órgãos como o coração. Por outro lado, com a idade há um envelhecimento natural, nomeadamente um enrijecimento dos vasos, bem como um aumento de co-morbilidades como a diabetes, a dislipidemia e a obesidade. Estudos científicos demonstram claramente que o controlo tensional é muito mais difícil quando essas co-morbilidades existem.
A não adesão à terapêutica tem algum peso no não controlo da doença?
Sim, porque na maioria dos casos, a hipertensão não apresenta sintomas, tornando o seu diagnóstico e tratamento mais difícil. Embora a hipertensão não apresente sintomas, quando não está controlada acarreta um risco elevado de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, aumentando assim a probabilidade de morte ou invalidez. Quando um doente hipertenso não está a ser medicado ou quando não está a receber o tratamento indicado, com o passar do tempo, os seus órgãos vão começar a ser afectados, podendo desenvolver doenças como insuficiência cardíaca. Por outro lado, por mais eficaz que seja um medicamento se ele não for tomado não faz qualquer efeito. O problema de adesão do doente à terapêutica é tão importante que um estudo efectuado nos USA demonstrou que, devido ao abandono da medicação, morrem 1.650.000 idosos por ano.
O mesmo estudo dizia ainda que cerca de metade dos doentes hipertensos sofrem igualmente de colesterol elevado…
O colesterol elevado e a hipertensão arterial são duas coisas diferentes, sendo que a presença dos dois não duplica o risco para o indivíduo mas sim multiplica-o. As doenças cardiovasculares, como o AVC e o EAM, são provocadas pelo desenvolvimento da doença aterosclerótica que acaba por levar à oclusão de um vaso ou no caso do AVC hemorrágico à ruptura de um vaso. Os maus hábitos de consumo alimentar e o sedentarismo podem facilmente levar a níveis elevados de colesterol, assim como da pressão arterial. Tanto para a pressão arterial elevada como para o colesterol elevado o tratamento consiste na adopção de um estilo de vida saudável que engloba uma reeducação alimentar e prática de exercício físico. Em determinados casos é necessário também recorrer à medicação. Em suma, o importante é tratar como um todo o risco cardiovascular que o indivíduo possa apresentar.
Na sua opinião como se pode "combater" este grave problema de saúde pública? Isto numa altura em que cada vez se sabe mais sobre a doença, os avanços terapêuticos também são muitos e os portugueses parecem cada vez mais sensibilizados para a prática do exercício físico.
A prática de exercício físico é importante de uma forma geral, contudo ela deve ser associada a uma alimentação saudável. Ela provoca a longo prazo uma descida da pressão arterial. No entanto, no caso do doente hipertenso ela só deve ser feita quando o doente tem a pressão arterial controlada, pois caso contrário pode ser nefasta.
Por isso, para combater a hipertensão é fundamental mudar os hábitos de consumo, tais como a redução do consumo de sal na alimentação e preferência por uma dieta rica em frutas, vegetais e com baixo teor de gorduras saturadas. O álcool deve ser consumido com muita moderação e o hábito de fumar deve ser completamente cessado. Outra forma de combater a hipertensão é a medição regular da tensão arterial e o cumprimento da medicação se for caso disso. Em Portugal 61% da população só mede a tensão quando vai ao médico e são os jovens aqueles que menos têm este hábito. Um dos objectivos da SPH é tornar a medição da pressão arterial numa prática comum e frequente entre os portugueses.
No passado dia 17 de Maio assinalou-se o Dia Mundial da Hipertensão. Qual o balanço que faz das actividades que a SPH desenvolveu para assinalar a efeméride?
O balanço foi muito positivo. Este ano, a capital da hipertensão foi a cidade de Oeiras e contámos com uma forte adesão da população que circulava nos arredores. Organizamos os habituais rastreios gratuitos à pressão arterial e outros factores de risco cardiovascular (como a diabetes e excesso de peso) sempre acompanhados por médicos e enfermeiros da SPH ou apoiantes da mesma. Tivemos ainda sessões informativas onde procuramos esclarecer todas as dúvidas e também aulas de ginástica e caminhadas para incentivar a prática do exercício físico. O ponto alto das comemorações foi a organização de um show cooking de refeitas saudáveis cujo intuito era ensinar a confeccionar receitas saborosas com recursos a ervas aromáticas como substitutos do sal.
Considera que a mensagem chegou ao público-alvo?
É esse o grande objectivo da SPH fazer chegar, ao maior número de pessoas possível, a importância da prevenção, detecção e tratamento da hipertensão. A SPH para além de ter a sua vertente científica, assume mesmo nos seus estatutos uma vertente de liga. Todos os esforços e acções que desenvolvemos têm sempre o objectivo principal de sensibilizar a população para a hipertensão arterial. Embora ainda exista um longo caminho a percorrer, acreditamos que a nossa actuação têm vindo a contribuir fortemente para a diminuição do número de hipertensos e mortes por doenças cardiovasculares. O objectivo da SPH é dar continuidade ao trabalho que tem vindo a ser desenvolvido. A SPH orgulha-se do facto do controlo tensional, entre 2003 e 2012, ter passado de 11% para 42,6% e de ter contribuído decisivamente para a redução do consumo excessivo de sal, vendo inclusivamente ser aprovada, em 2009, uma Lei que limita o teor de sal no pão, Lei n.º 75/2009 de 12 de Agosto. É de registar que, com esses dois factos, a SPH teve um papel muito importante na sociedade, tendo contribuído para a uma diminuição da mortalidade por AVC, segundo dados da Direcção-Geral da Saúde.
Por expressa opção do autor, o texto não respeita o Acordo Ortográfico
Ligações
[1] http://www.sphta.org.pt/pdf/PHYSA_study_Slides_SPH-v2.pdf
[2] https://www.atlasdasaude.pt/foto/shutterstock
[3] https://www.atlasdasaude.pt/taxo-categories/sistema-circulatorio
[4] https://www.atlasdasaude.pt/taxo-categories/sistema-cardiovascular
[5] https://www.atlasdasaude.pt/taxo-categories/artigos-complementares
[6] https://www.atlasdasaude.pt/taxo-categories/alimentacao-receitas-e-dietas
[7] https://www.atlasdasaude.pt/taxo-categories/exercicio-fisico
[8] https://www.atlasdasaude.pt/autores/celia-figueiredo