“Doutor, de repente, senti uma dor no peito, uma dor aguda, persistente… Durou muito tempo, um bom período da noite. A certa altura a pressão no peito era tão grande que julguei que ia morrer. Tentei não dar importância, até porque já tinha, de vez em quando, um ardor no peito, um formigueiro. Tentei andar, mas faltava-me força nas pernas, tive vontade de vomitar e deu-me uns suores muito frios e comecei a suar. Não é que eu seja medroso, mas fiquei muito preocupado. O coração mete-nos sempre medo. A minha mulher chamou logo o 112. Foi um enfarte do miocárdio. Agora o que mais me preocupa é que volte a acontecer, que torne a dar-me qualquer coisa.”
As declarações anteriores representam a normal abordagem que um doente tem após sofrer um enfarte agudo do miocárdio. Infelizmente, este não é um caso único. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico sublinha que as doenças cardiovasculares (DCV) são a principal causa de morte nos estados membros da União Europeia, com cerca de 36 por cento das mortes em 2010. Apesar de, em 2016, ter havido um decréscimo de 8,1 por cento nos internamentos por doenças do aparelho circulatório, com relevo especial para a diminuição das hospitalizações por enfarte agudo do miocárdio, as DCV foram nesse mesmo ano responsáveis por 29,6 por cento dos óbitos (7.368 mortes), sem haver qualquer alteração no número de mortes por Doença Isquémica Cardíaca, e com um agravar, merecedor de reflexão, da mortalidade prematura abaixo dos 70 anos.
Não surpreende que o nosso doente se sinta assustado e confuso após o enfarte do miocárdio. Mas agora vai querer continuar a viver com esperança e alegria. Vai, naturalmente, receber muitas informações e instruções do seu médico. Vai começar a tomar novos medicamentos que pretendem protegê-lo a ele e ao seu coração. Nasce um “novo” tempo de reflexão, de ponderação, em que se tenta entender tudo o que aconteceu e em que se começa a compreender que também tem uma responsabilidade partilhada, talvez a maior, com o seu médico, com a sua equipa de saúde, na sua recuperação, na diminuição do risco de novos problemas e no prolongar da sua esperança e qualidade de vida.
Depois de um primeiro evento cardíaco, felizmente, a maioria das pessoas podem esperar uma vida longa e produtiva. Mas cerca de 20 por cento dos doentes, depois dos 45 anos, pode ter um outro episódio cardíaco, especialmente nos primeiros cinco anos após o evento inicial. Por isso, é importante ressalvar algumas recomendações para evitar um novo enfarte, assim como é fundamental apreender que se tem de fazer da prevenção (cardiovascular) uma prioridade:
E não se esqueça de saber quais são os fatores de risco que favoreceram o desenvolvimento e a ocorrência do seu enfarte. Não se esqueça que 55 por cento dos portugueses entre os 18 e os 79 anos tem dois ou mais fatores de risco. Não queira pertencer ao grupo. É preciso reconhecer, tratar e controlar os fatores de risco (a pressão arterial elevada, o colesterol aumentado, a presença da diabetes). Pare de fumar, escolha uma alimentação equilibrada e saudável, mantenha uma vida ativa e, se for caso disso, controle e mantenha o seu peso. Fale com a equipa de saúde sobre os seus fatores de risco e aprenda o que deve fazer para os tratar e controlar. São anos que ganha de vida feliz e saudável, pois você merece.
Dr. Pedro Marques da Silva
Internista e Coordenador do NEPRV (Núcleo de Estudos de Prevenção e Risco Vascular) da Sociedade Portuguesa da Medicina Interna
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[1] https://www.atlasdasaude.pt/fonte/miligrama
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