5 vezes mais frequente no sexo masculino

Doença de LHON: perda de visão é irreversível e não escolhe idades

Atualizado: 
08/01/2019 - 11:57
Trata-se de uma doença genética rara, herdada por via materna, e que se caracteriza por uma diminuição severa da acuidade visual. Muitas vezes assintomática, a Neuropatia Hereditária de Leber ou Doença de LHON atinge pouco mais de uma centena de portugueses. Mais de metade dos doentes são homens. Para lhe darmos a conhecer a patologia, o Atlas da Saúde esteve à conversa com Dália Meira, Assistente Hospitalar Graduada do Serviço de Oftalmologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, que explica que, apesar de esta não ter cura, existe, desde meados de 2015 um fármaco para tratar os sintomas.

O que é a Neuropatia Hereditária de Leber e quantas pessoas sofrem da doença no nosso país?

A neuropatia óptica hereditária de Leber (Leber Hereditary Optic neuropathy, LHON) é uma doença mitocondrial, hereditária, altamente incapacitante uma vez que provoca, na maioria dos casos, uma perda permanente da visão, em indivíduos jovens adultos previamente saudáveis.

A LHON é a doença mitocondrial mais comum, cuja prevalência é cerca de 1.3 a 1.5 por 100 000 habitantes. Em Portugal, embora não existam estudos epidemiológicos, a estimativa de doentes afetados varia entre 130 e 150, com base nos estudos europeus.

Tratando-se de uma doença indolor e cujos sintomas podem surgir de forma abrupta, como podemos promover o seu diagnóstico precoce? A que sinais devemos estar atentos?

O diagnóstico de LHON não é fácil e requer um elevado nível de suspeição clínica, uma vez que se trata duma doença rara. A divulgação da doença, especificamente das suas manifestações clínicas, pode contribuir para o seu diagnóstico precoce. O quadro clínico típico de LHON caracteriza-se por uma discromatópsia (incapacidade para percepcionar as cores) associada a uma perda súbita, grave e indolor da visão num jovem-adulto (18-35 anos) do sexo masculino. Estas manifestações podem ocorrer simultaneamente nos dois olhos, ou sequencialmente (mais comum) – primeiro afeta um olho e 2-4 meses depois surge no segundo olho.

Quais os grupos de risco?

A doença é cerca de 5 vezes mais frequente no sexo masculino e a idade de aparecimento mais comum situa-se entre os 18 e os 35 anos. No entanto, a LHON pode afetar mulheres e surgir em qualquer faixa etária. A LHON é uma doença com hereditariedade materna, pelo que se existir história familiar de LHON, a probabilidade de se ter a doença é maior.

Apesar de ser uma doença hereditária, que outros fatores podem potenciar o seu desenvolvimento?

As características individuais da LHON são afetadas pela mutação genética específica, existindo mutações mais patogénicas do que outras, mas também por fatores anatómicos, ambientais e hormonais, bem como pelos hábitos tabágicos, alcoólicos e medicamentosos.

Como é feito o diagnóstico da Doença de LHON?

O diagnóstico de LHON é fundamentalmente clínico, podendo ser confirmado geneticamente. Existem três mutações primárias da doença e múltiplas mutações secundárias associadas à doença. Quando se faz um estudo genético mitocondrial pesquisando as três mutações principais e esse estudo é negativo tal não significa que não estejamos perante a doença, mas sim perante uma mutação secundária ou até uma nova mutação, pelo que é necessário fazer a sequenciação de todo o DNA mitocondrial e relacionar os achados com a clínica.

A partir de que idade se pode desenvolver a patologia e qual o seu prognóstico?

Como já foi referido, o início da doença é mais frequente entre os 18 e os 35 anos mas pode surgir em qualquer idade, estando descrita desde os 2 aos 87 anos. O prognóstico visual da LHON é reservado, sendo que apenas uma minoria dos doentes apresenta uma recuperação espontânea 6 a 12 meses após o início da doença. Na maioria dos casos (97%) a doença progride para uma perda acentuada e bilateral da visão central, estabilizando ao final de um ano numa acuidade visual geralmente inferior a 1/10. Ou seja, a maioria dos doentes fica legalmente cego, necessitando da ajuda de terceiros no seu dia-a-dia, com um impacto negativo enorme na sua qualidade de vida e da sua família.

Que outras patologias podem estar associadas a esta doença?

A LHON resulta de uma alteração do metabolismo mitocondrial e embora as mitocôndrias estejam presentes em todas as células do nosso organismo, a doença geralmente só apresenta manifestações oftalmológicas, pese embora alterações cardíacas e neurológicas possam também estar associadas à doença.

Não existindo cura para a doença de LHON, em que consiste o seu tratamento? Quais os tratamentos disponíveis?

A LHON não tem cura, mas existe, desde junho de 2015 um fármaco, a idebenona, aprovado pela Agência Europeia do Medicamento para o seu tratamento.

A idebenona é um análogo sintético da coenzima Q10 e as suas propriedades antioxidantes protegem as mitocôndrias. Os doentes com LHON têm indicação para iniciar o tratamento com idebenona em altas doses (900mg/dia) o mais precocemente possível para reduzir a perda visual ou até, eventualmente, recuperar alguma visão. Existem também múltiplos estudos de terapia genética a decorrer sobre esta matéria.

Em matéria de prevenção, que medidas podem ou devem ser tomadas?

Todos os doentes com LHON e portadores de mutações de LHON devem ser aconselhados a fazer evicção tabágica e alcoólica, bem como lhes deve ser cedida uma lista de fármacos potencialmente perigosos, que poderão despoletar o início da doença. Os portadores assintomáticos devem ser informados sobre as manifestações clínicas da doença, para procurarem ajuda precoce caso seja necessário.

A sociedade civil deve também estar informada sobre a doença e as suas repercussões funcionais, de forma a podermos garantir uma melhor integração social dos doentes e das suas famílias.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Pixabay