Primeira causa de morte

“Os portugueses ainda não despertaram para o grande problema que é o AVC”

Atualizado: 
31/01/2017 - 15:32
Considerado como a principal causa de morte e de incapacidade permanente, o Acidente Vascular Cerebral atinge, por hora, três portugueses. A hipertensão arterial é um dos principais fatores de risco e também um dos mais menosprezados. Formar e educar a população no sentido de adotar um estilo de vida saudável, tão cedo quanto possível, é uma das principais premissas da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral que, entre 2 e 4 de Fevereiro, realizará o 11º Congresso Português do AVC.

Estima-se que, todos os anos, ocorram cerca de 6,5 milhões de mortes por Acidente Vascular Cerebral, em todo o mundo. Em Portugal, por hora,  três portugueses sofrem um AVC, um dos quais resulta em morte. Metade fica com sequelas incapacitantes para o resto da vida.

Dados alarmantes que fazem desta doença a principal causa de morte e incapacidade no país.

“O AVC é uma doença súbita que afeta uma zona limitada do cérebro, causada pelo bloqueio ou rompimento de uma artéria cerebral, interrompendo o fornecimento de sangue ao cérebro”, começa por explicar o Professor José Castro Lopes, presidente da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral.

“A irrigação sanguínea do cérebro pode ser interrompida devido a um fenómeno isquémico (obstrução de uma artéria) ou a um fenómeno hemorrágico (rompimento de uma artéria)”, acrescenta adiantando que o AVC isquémico implica sempre um “entupimento” de um vaso sanguíneo que condicionará a chegada do sangue às células cerebrais, seja ele provocado por um trombo ou por um embolo.

“Já o AVC hemorrágico é causado por uma hemorragia, ou seja, pelo “rompimento” de um vaso sanguíneo dentro do cerébro”, afirma o neurologista.

De acordo com este especialista, os AVC hemorrágicos são menos comuns que os isquémicos, ocorrendo apenas em 15% dos casos, no entanto, a gravidade dos mesmos depende de vários fatores. “A cada área do cérebro corresponde uma função diferente: a função motora, o equilíbrio, a linguagem, a memória, a coordenação, a sensibilidade, entre outras. Neste contexto, as manifestações de um AVC e subsequentes sequelas vão depender da zona lesada e da extensão dos danos causados pela falta de irrigação”, justifica.

Deste modo, quanto menor for o período entre a ocorrência dos primeiros sinais de AVC e a chegada ao hospitral, maior será a probalibilidade de sobrevivência sem sequelas.

Afetanto, sobretudo, pessoas com mais de 65 anos, o Acidente Vascular Cerebral apresenta vários fatores de risco, sendo a hipertensão arterial um dos mais relevantes.

“Em Portugal, as elevadas taxas de AVC têm sido atribuídas a um fator de risco específico – a hipertensão arterial – que, por sua vez, tem como principal causa o consumo excessivo de sal”, refere o presidente da SPAVC.

No entanto, admite que não se devem menosprezar outros fatores que condicionam a doença. “No caso do AVC, existem fatores de risco modificáveis e não modificáveis. Fatores de risco não modificáveis são os que não são passíveis de qualquer tipo de intervenção”, explica. Fatores genéticos, hereditários ou individuais, idade, raça e sexo configuram nesta definição.

“Fatores de risco modificáveis são aqueles que, mediante controlo e tratamento adequados, podem ser minimizados e ter um impacto menos relevante no risco de AVC. É o caso, por exemplo, do sedentarismo, da obesidade, da hipertensão arterial, do tabagismo, da fibrilhação auricular, da diabetes mellitus, do consumo excessivo de bebidas alcoólicas”, descreve o especialista que defende a adoção de estilos de vida saudáveis como arma contra a doença.

A atividade física e uma dieta saudável são, deste modo, consideradas como importantes medidas de prevenção.

“Um estilo de vida inativo pode contribuir para a obesidade, fator de risco importante para o acidente vascular cerebral. A Sociedade Portuguesa do AVC aconselha a uma caminhada diária de pelo menos 30 minutos”, afirma advertindo, no entanto, que esta atividade deve ser adaptada às capacidades motoras e estilo de vida de cada um.

Por outro lado, “uma alimentação saudável contribui para a manutenção de um peso adequado e, consequentemente, para a prevenção de muitas das doenças crónicas não transmissíveis, entre as quais a obesidade, um já referido fator de risco para o AVC”.

“Uma dieta rica em gorduras faz com que o colesterol se acumule no sangue e estreite as artérias. Demasiado sal pode levar à pressão arterial elevada”, explica o Professor.  Deste modo, reforça a importância de adoptar um regime alimentar equilibrado, “rico em legumes frescos e frutas da época, pobre em gorduras, açúcares e sal, com consumo moderado de bebidas alcoólicas (no máximo de um copo standard de vinho por dia nas mulheres, e dois nos homens), sem esquecer a ingestão de água em quantidade suficiente (entre 8 a 10 copos por dia) para manter a hidratação”.

“Tempo é cérebro”

Os principais sinais de um Acidente Vascular Cerebral surgem de forma súbita e dependem do local e extensão do cérebro afetada. No entanto, eles podem ser lembrados como os “3F”: desvio da Face, dificuldade na Fala, falta de Força no braço.

De acordo com o presidente da Associação Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral basta um destes sinais aparecer para se suspeitar de um AVC, devendo ser accionado de imediato o serviço de emergência para que o doente receba o tratamento adequado, tão rápido quanto possível.

A verdade é que, quanto mais cedo o doente chegar ao hospital e quanto mais precoce for a administração da terapêutica de fase aguda, maiores são as hipóteses de sobrevivência e de minimização de sequelas.

“O tratamento só pode ser administrado nas primeiras horas após a instalação dos primeiros sintomas e é tanto mais eficaz e seguro quando mais cedo for iniciado. É caso para dizer que tempo é cérebro, pelo que o AVC tem que ser encarado como uma situação de emergência”, alerta o neurologista.

As sequelas da doença dependem de fatores, como a localização do AVC, a extensão das lesões e o período decorrente entre o aparecimento dos primeiros sintomas e a implementação da terapêutica em fase aguda. Elas podem ser reversíveis ou permanentes mas “sempre com impacto na qualidade de vida”.

“Afasia, disfagia, hemiparesia, ataxia, epilepsia, incontinência urinária e fecal ou alterações congnitivas (como a perda de memória e pensamento confuso) são algumas das complicações mais comuns.

Formar e informar a população

Apesar da gravidade da doença, na opinião de José Castro Lopes, os portugueses continuam a prestar pouca atenção ao sistema cerebrovascular, sendo por isso urgente, envidar esforços para sensibilizar a população para aquela que é a principal causa de morte e incapacidade.

“É necessário, e diria até mesmo urgente, um esforço conjunto, que envolva profissionais de saúde, população, comunicação social e decisores políticos, para reduzir o peso do AVC no nosso país”, refere o especialista.

“O problema reside em chegar à população em geral, apesar da múltiplas ações que vimos organizando, desde sessões abertas realizadas no âmbito do Congresso Português do AVC, a ações especialmente dirigias à comunidade geral, tais como rastreios e sessões de esclarecimento”, afiança acrescentado que se torna essencial formar e informar a população “no que respeita a uma doença que afeta três portugueses por hora. Mas, acima de tudo, é preciso educar as pessoas a adotar estilos de vida saudáveis desde muito cedo, praticando as medidas de prevenção durante toda a vida.

Para debater esta temática, decorre, entre 2 e 4 de Fevereiro, aquele que é considerado o grande fórum em Portugal da doença vascular cerebral.

O 11º Congresso Português do AVC levará a discussão temas como “Estilos de Vida na vanguarda do AVC”, “A importância do risco vascular na deterioração cognitiva” ou “Os aspetos do tratamento da fase aguda do AVC isquémico”, tendo como protagonistas vários especialistas nacionais e internacionais.

Para além das palestras, está prevista ainda uma Sessão de Informação à População que faz deste Congresso o único no mundo a promover um contato estreio com a população.

“Considerando a fraca participação na prevenção e no tratamento do AVC por parte da população geral, a SPAVC inclui sempre nas suas atividade científicas, finalizando-as, uma sessão com entrada livre destinada à população geral”, conclui José Castro Lopes.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
ShutterStock e SPAVC