Diagnóstico e tratamento

Linfoma: o tumor do sistema linfático que atinge 2 mil portugueses por ano

Atualizado: 
24/05/2019 - 10:03
Estima-se que, em Portugal, sejam diagnosticados cerca de 2 mil casos de linfoma por ano. Apesar de se tratar de uma patologia complexa, uma vez que existem muitos tipos diferentes de linfoma, esta é uma patologia altamente curável. Cansaço, falta de apetite ou perda de peso são os sintomas mais frequentes. "Dependendo da localização, os doentes podem notar o aparecimento de gânglios aumentados ou podem vir a desenvolver anemia", explica Daniela Alves, especialista em Hematologia Clínica.

O linfoma é uma doença maligna que afeta os linfócitos, que são um subtipo de glóbulos brancos.

Os linfócitos têm como função a montagem e regulação da resposta imunitária contra microrganismos tais como vírus, estando ainda implicados na produção de anticorpos que nos protegem das infeções. Outras funções destas células do sistema imunitário incluem a vigilância contra os diversos tipos de cancro, sendo esse o motivo que explica o aumento das taxas de cancro dos diversos subtipos nos doentes com imunodepressão grave, como infeção HIV não controlada ou submetidos a transplante. A desregulação destas células é ainda responsável por fenómenos de autoimunidade/ doenças autoimunes.

Os linfócitos são glóbulos brancos muito versáteis que adquirem um grande leque de funções, dependendo da sua localização e da forma como se desenvolveram, ou seja, a “formação” que obtiveram durante o seu desenvolvimento. Uns são essenciais para a produção de anticorpos (linfocitos B), enquanto que outros destroem as células que são infetadas por vírus, por exemplo (linfócitos T). Assim, podemos começar por diferenciar os subtipos de linfoma tendo em consideração se a célula de origem é o linfócito T ou B. De uma forma geral, os linfomas B respondem melhor aos tratamentos que os linfomas T.

Os linfócitos habitualmente encontram-se nos gânglios linfáticos, no sangue e no baço. Podem ainda ser encontrados em menor número noutros órgãos, tais como o estômago, intestino, amígdalas, entre outros. Assim os linfomas habitualmente afetam os compartimentos onde habitualmente se encontram os linfócitos. Sendo este um “tumor líquido”, este tipo de doença pode-se encontrar em vários sítios ao mesmo tempo, sem que isso significa a presença de metástases. Dependendo do subtipo de linfócitos e da sua localização assim se classificam de forma diferencial os linfomas.

Os sintomas associados a esta patologia dependem do subtipo específico de linfoma e da sua localização, existem depois sintomas que podem surgir de forma transversal a todos os tipos de linfoma: o cansaço, a falta de apetite, a perda de peso, os suores nocturnos e a febre esporádica que, frequentemente, surge durante a tarde/noite, assim como a presença de sinais crónicos de desregulação da resposta imune, muito frequente nos linfomas ditos “crónicos”, com infeções recorrentes, como a pneumonia. Dependendo da localização, os doentes podem notar o aparecimento de gânglios aumentados ou podem vir a desenvolver anemia.

Como anteriormente referido, existe uma associação entre o aparecimento de linfoma e situações clínicas que cursam com imunossupressão. Assim os indivíduos que por qualquer motivo estejam sob medicação que suprima o sistema imunitário estão sob maior risco de desenvolver este tipo de patologia oncológica (doentes transplantados, doentes com patologia auto-imune). Da mesma forma algumas doenças congénitas/hereditárias que se definem por alguma deficiência imunitária têm um risco acrescido de desenvolver linfoma.

Classicamente os linfomas são inicialmente divididos em Linfomas de Hodgkin e Linfomas Não Hodgkin.

O linfoma de Hodgkin é caracterizado pela presença de linfócitos malignos (chamados de células de Reed-Sternberg), que provocam uma reação inflamatória desmesurada em seu redor ao desregular a resposta imunitária das células normais. Assim, o tratamento do Linfoma de Hodgkin é muito específico e diferente dos outros tipos de linfoma. Salvo algumas excepções, o linfoma de Hodgkin tem melhor prognóstico, sendo muito sensível à quimioterapia e à radioterapia. Este tipo de linfoma é mais comum no adulto jovem, tendo posteriormente outro pico de incidência no idoso, sendo que nesta faixa etária é mais difícil de obter remissão.

O Linfoma Não Hodgkin (LNH) é constituído por um grupo muito grande e heterogéneo de doenças. A classificação dos LNH tem vindo a ser otimizada ao longo dos anos, baseando-se em descobertas do ponto de vista molecular, que diferenciam os linfomas não só do ponto de vista da morfologia das células, mas também de prognóstico, levando a uma tentativa de realizar um tratamento diferencial.

Os vários subtipos de Linfoma Não Hodgkin estão relacionados com o tipo de linfócito envolvido. Existem dezenas de Linfomas Não Hodgkin diferentes mas, de uma forma mais generalista, podemos classificar os LNH em linfomas indolentes (considerados de evolução mais lenta e crónicos) e os linfomas agressivos (de evolução mais aguda, mas que são curáveis).

Os linfomas indolentes são doenças que se desenvolvem de forma mais lenta e cujas células são mais lentas a dividirem-se. Por esse motivo, quando tratados com esquemas de quimioterapia, embora se consiga atingir boas respostas com desaparecimento dos gânglios aumentados ou outras massas, não se consegue erradicar a doença na totalidade, que eventualmente, ao longo do tempo (meses a anos depois) se volta a manifestar.

Assim, o objetivo do tratamento deste tipo de linfomas passa por só tratar quando a doença preenche critérios para tal, ou seja,  quando esta começa a provocar sintomas (gânglios muito aumentados, anemia, suores, febre, infeções de repetição). Assim, tenta-se só tratar quando realmente necessário, de forma a evitar efeitos adversos e toxicidade desnecessária.

Durante a vida do doente, tenta-se sempre fazer a melhor gestão do linfoma, de forma a tratar o mais eficazmente quando necessário, tentando que a resposta seja suficientemente eficaz para permitir um longo período sem ser necessário «re-tratar». Quando a doença voltar a necessitar, é novamente tratada.

Este tipo de linfomas tem então uma evolução por paroxismos, alternando entre períodos em que são sintomáticos e que têm que ser tratados e períodos em que estão senescentes (adormecidos). Durante os períodos em que não necessitam de tratamento, os doentes mantêm vigilância regular, sendo importante evitar possíveis complicações atribuíveis à cronicidade do linfoma, como as infeções graves, motivo pelo qual recomendamos a vacinação para a gripe e para pneumonia.

Os linfomas agressivos, sendo linfomas mais sensíveis à quimioterapia, surgem de uma forma mais explosiva, necessitando rapidamente de iniciar tratamento. A resposta ao tratamento é mais rápida, sendo o objetivo deste a erradicação total da doença e consequente cura.

Assim sendo, a recaída de um linfoma agressivo tem um significado prognóstico muito mais desfavorável que a recaída de um linfoma indolente (que é expectável). Se um linfoma agressivo recidiva, significa que não foi atingida a cura e os tratamentos subsequentes têm que incluir tratamentos de quimioterapia de alta dose e eventual transplante (nos doentes jovens).

Os tratamentos de quimioterapia, com associação ou não de radioterapia, são frequentemente semelhantes e transversais entre linfomas agressivos e indolentes, tirando algumas exceções. De referir que, frequentemente, se usam esquemas de quimioterapia combinados com imunoterapia (medicamentos que são anticorpos que actuam especificamente contra moléculas presentes nas células de linfoma). A grande maioria das pessoas com linfoma conseguem manter-se sob tratamento em ambulatório e não necessitam de internamento.

Atualmente, havendo um maior conhecimento dos mecanismos de desenvolvimento dos linfomas a nível genético e molecular, vão também sendo desenvolvidos novos fármacos mais específicos, o que abre uma janela a tratamentos inovadores, e que trazem uma esperança aos doentes que tenham linfomas resistentes à quimioterapia.

Autor: 
Dra. Daniela Alves - Especialista em Hematologia Clínica Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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