50% dos sobreviventes de AVC sofre de Afasia

Formação profissional é essencial para melhorar qualidade dos serviços

Atualizado: 
13/01/2017 - 10:28
Apesar de não existirem dados sobre a sua incidência, em Portugal, estima-se que a Afasia atinja cerca de 50 por cento dos sobreviventes de um Acidente Vascular Cerebral, estando esta condição associada a uma alta taxa de morbidade a curto e a longo prazo. A pensar na promoção do bem-estar destes doentes, o Instituto Português da Afasia reforça a necessidade de formar profissionais nesta área, levando a cabo um programa de formação único em Portugal.

Descrita como uma perturbação da linguagem que resulta de uma lesão cerebral “localizada nas estruturas que se supõe estarem envolvidas no processo de linguagem”, a afasia impede a pessoa de comunicar da mesma forma que fazia antes. Esta pertubação pode afetar a capacidade de se expressar ideias ou pensamentos, a capacidade de compreender o que os outros dizem e ainda a capacidade de ler e escrever.

“A inteligência não fica afetada e a pessoa continua a ser a mesma, com as mesmas opiniões, sentimentos, conhecimentos e memórias, no entanto, a perturbação da linguagem constitui um muro que limita a expressão das mesmas como antes, acabando por isolar a pessoa com afasia do mundo e dos outros”, começa por explicar Paula Valente, diretora do Instituto Português da Afasia.  

Dependendo da localização e extensão da lesão, os doentes apresentam diferentes quadros de afasia “com base nos sintomas de perturbação da linguagem apresentados”.

Sendo mais frequente nas pessoas idosas, poderá surgir, no entanto, em pessoas mais jovens e crianças, uma vez que pode ter inúmeras causas.

A causa mais comum desta pertubação é o Acidente Vascular Cerebral. “A instalação da afasia após um AVC é caracterizada pela perda repentina da fala e das capacidades linguísticas”, revela a especialista em terapia da fala.

Os traumatismos crânio-encefálicos, os tumores intracranianos, bem como a infeção cerebral, a epilepsia ou outras doenças neurológicas progressivas associadas ao envelhecimento são outras das causas da afasia.

“Por hora, três portugueses sofrem um AVC, dos quais sobrevivem dois terços. Metade dos sobreviventes poderão ficar com afasia para toda a vida”, refere a terapeuta estimando que surjam, todos os anos, cerca de oito mil novos casos desta perturbação.

Embora não existam dados estatísticos oficiais, “calcula-se que a prevalência de pessoas com afasia em Portugal ronde os 40 mil”.

“O principal tratatamento da afasia é a terapia da fala que, embora eficaz em muitos casos, não consegue, frequentemente, evitar as sequelas psicológicas e sociais associadas à afasia”, explica Paula Valente.

De acordo com esta especialista,  “na terapia da fala tradicional o terapeuta avalia os défices linguísticos ou de fala, utilizando métodos e técnicas para cada caso ou patologia. Este tipo de intervenção é individualizado e centrado nos défices, sem considerar o papel da família, do contexto social e sem considerar os aspetos relacionados com a eficácia comunicativa funcional ou expectativas do utente”.

Paula Valente reforça, deste modo, a necessidade existir uma abordagem mais ampla que permita uma maior integração social. “A abordagem social assume-se como uma forma de complementar a intervenção tradicional”, afirma explicando que esta “visa a habilitação do indivíduo para que este possa voltar a participar nas atividades e contextos significativos para ele, ensinando-lhe, bem como aos seus parceiros comunicativos, estratégias comunicativas que lhes permitam uma comunicação eficaz e satisfatória no dia-a-dia”.

Para a diretora do IPA, os tratamentos disponíveis em Portugal, focados na intervenção tradicional, e acessíveis em contextos clínicos clínicos e hospitalares, têm-se mostrado insuficientes para minimizar as consequências da afasia.

“Infelizmente, numa grande maioria dos casos, os defeitos linguísticos não são totalmente reversíveis e, por este mesmo motivo, é fundamental que sejam disponibilizadas terapias focadas no bem-estar da pessoa com afasia e seus familiares, na retoma da uma vida satisfatória, participada e ativa apesar da presença da afasia”, explica.

“A missão é devolver a qualidade de vida” aos doentes

Criado em 2015, o Instituto Português da Afasia (IPA), constituído como uma  Associação sem fins lucrativos, tem como missão “devolver a esperança e a qualidade de vida às pessoas com afasia e seus familiares”, com a implementação de abordagens terapêuticas comprovadas cientificamente e que se centram nos objetivos pessoais de participação social e nas atividades que são significativas para a pessoa com afasia.

“Mediante as suas necessidade e objetivos de vida, prestamos apoio, quer individual ou em grupo, às pessoas com afasia e seus familiares no sentido de promover uma maior compreensão da afasia propriamente dita, e suas consequências biopsicossociais, através da aprendizagem de estratégias para melhorar a comunicação, interação e confiança entre a díade (pessoa com afasia – familiar/cuidador)” explica Paula Valente.

Nos chamados grupos de intervenção são trabalhadas questões como a identidade positiva, reconhecimento e treino de competências, aumento de confiança, gestão de stress ou apoio emocional. “Por fim, mas não menos importante, a criação de uma rede de interajuda entre todos os participantes”, acrescenta.

Formação profissonal

Para além dos programas destinados aos doentes e seus familiares – o programa Introdutório e o Programa Revelo-me -, o Instituto Português de Afasia dispõe de um programa de formação único em Portugal “que permite aos profissionais adquirirem conhecimentos, ferramentas e estratégias para melhor compreender, diagnosticar, informar, comunicar e intervir com pessoas com afasia e seus familiares” com o objetivo de melhorar a qualidade dos serviços que prestados a esta população.

“As formações por módulos, de curta duração, à semana, têm apenas uma hora e meia de duração e pretendem  facilitar a participação dos profissionais que possuem, muitas vezes, um horário de trabalho que lhe impossibilita a realização de formação contínua”, começa por dizer a diretora.

Estas formações destinam-se a todos os profissionias que contatem com pessoas com afasia, como é o caso dos terapeutas, médicos, psicólogos, enfermeiros ou assistentes sociais, excepto os módulos que são exclusivos para terapeutas da fala.

Para consultar a programação destes cursos basta aceder à página do Instituto Português de Afasia e consultar as condições. “A inscrição poderá ser realizada através dos formulários disponíveis no site”, refere.

“Está já agendada para Mafra uma formação para terapeutas da fala e alunos do último ano do curso de terapia  da fala”, para os próximos dias 4 de Fevereiro e 1 de Abril entre as 10 e as 18h00.

“De facto, observa-se uma procura casa vez maior, por parte dos terapeutas da fala em aprofundar os conhecimentos em áreas de intervenção específicas de forma a proporcinarem um atendimento com maior qualidade junto dos seus pacientes”, justifica Paula Valente para concluir.

 

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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