Após as presidenciais

Eutanásia entra em força na agenda política

Há temas em que as opiniões não estão hermeticamente contidas pelos tanques da religião ou da orientação política. A eutanásia é um deles.

O movimento “Direito a morrer com dignidade” já escreveu um manifesto a favor da legalização da eutanásia - que pretende publicar na íntegra em pelo menos dois jornais de grande tiragem depois das presidenciais - e se encontra neste momento na fase de recolha de “assinaturas de notáveis da sociedade portuguesa”, escreve o jornal iOnline.

O manifesto prevê “tanto a eutanásia como o suicídio medicamente assistido para pessoas lúcidas”. Os proponentes do manifesto dizem que é “óbvio que haja um direito inviolável à vida, o que não quer dizer que haja um direito irrenunciável a viver. Ninguém pode obrigar ninguém a viver com sofrimento”, defendem.

O movimento “Direito a morrer com dignidade”, criado em novembro pela antiga professora Laura Ferreira dos Santos e pelo médico nefrologista João Ribeiro Santos, foi desde logo apoiado por nomes como o cientista e deputado Alexandre Quintanilha e o jornalista José Júdice.

 A lista de apoiantes aumentou e já aderiram o cineasta António-Pedro Vasconcelos, a pediatra Isabel Ruivo, a jornalista Lucília Galha e a investigadora Tatiana Marques, além dos dois fundadores do “Direito a morrer com dignidade”.

Nunca chegou à AR Em 2009, o então líder do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, defendeu publicamente num debate na Ordem dos Médicos, em Lisboa, a “legalização da morte assistida”, pedindo “acesso livre e informado” para os cidadãos. Embora tivesse afirmado que o seu partido iria apoiar esta posição, não houve iniciativa legislativa.

João Semedo, que ajudou a constituir o movimento “Direito a morrer com dignidade”, admitiu ao jornal iOnline que “o Bloco venha a apresentar a sua própria iniciativa”, provavelmente mais para a frente, “em virtude do calendário político dos próximos tempos”.

Tal como o aborto, é possível que um referendo à eutanásia venha a ser agendado, entregando a decisão aos portugueses. Em entrevista à Renascença, Assunção Cristas admitiu na quarta-feira esta possibilidade, para além de prometer que o CDS irá “tomar uma posição sobre a matéria nos próximos tempos”. Enquanto a posição do partido não chega, a antiga ministra deixou a sua visão pessoal: “Os cuidados paliativos são a resposta civilizada para o sofrimento em fim de vida.”

Liberdade de escolha Laura Ferreira dos Santos, 56 anos, é uma professora reformada da Universidade do Minho ao lado de João Ribeiro Santos, que lançou as primeiras sementes da iniciativa.

A aposentação antecipada deveu--se a problemas oncológicos, e foram dois cancros - o seu, na mama; e o da mãe, no pâncreas - que a fizeram estudar o tema desde 2001.

Estas situações levaram-na a contactar com realidades de sofrimento profundo e a refletir sobre os meandros do direito de pôr termo à vida. “A minha mãe morreu nove meses depois do diagnóstico, nos meus braços”, conta. “É que nem toda a gente tem a sorte de morrer como o Dr. Almeida Santos, ou como o meu irmão, que morreu repentinamente”, considera.

Já escreveu três livros sobre o tema: “Ajudas-me a Morrer?”, “Testamento Vital” e, mais recentemente, “A Morte Assistida e Outras Questões de Fim-de-Vida”.

É a favor da eutanásia e do suicídio assistido (realidade que desconhecia quando começou a pesquisar sobre o tema) e acredita que estas questões não se resolvem em referendo. “Os direitos fundamentais das pessoas não devem estar sujeitos a uma maioria. É uma questão íntima e uma decisão de cada pessoa.”

Assim, Laura acredita que este não só é um direito como “deve ser legislado pela Assembleia da República”. “As leis servem para que não haja abusos e a liberdade de consciência também é um direito constitucional”, lembra.

Por outro lado, para a antiga professora, “é um abuso da parte do Estado interferir nas convicções íntimas das pessoas. Só quem sabe o que sofre é o próprio”.

Uma questão transversal Para a antiga professora, a questão da eutanásia é transversal à sociedade. “Há pessoas de direita e de esquerda, religiosas ou não, que acreditam que as pessoas devem ter a liberdade de escolher morrer, desde que estejam lúcidas e não estejam deprimidas”, alerta.

Sobre a ideia de que uma rede de cuidados paliativos bem construída é uma alternativa ao problema, diz não estar contra o ramo da medicina, mas não o considera uma solução. “Nenhum defensor da morte assistida é contra os cuidados paliativos. O que dizemos apenas é que, se numa situação de fim de vida a pessoa não quiser viver mais, deve poder escolher não o fazer.”

Fonte: 
iOnline
Nota: 
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