Procriação medicamente assistida

Em nome dos pais, dos dadores e de uma gestação de substituição

A filha de Inês foi concebida com sémen de dador, os de Francisca cresceram numa “barriga de aluguer” e Maria doou recentemente os seus óvulos para ajudar uma família, “tenha ela o formato que tiver”.

Estas três mulheres nunca se conheceram e, apesar de terem idades próximas, abaixo dos 40 anos, tiveram motivos diferentes para recorrer à ciência na altura de serem mães, ou de ajudar alguém a sê-lo.

Quando Inês decidiu ser mãe a lei que permite o acesso às técnicas de procriação medicamente assistida a mulheres solteiras e sem problemas de infertilidade ainda não estava em vigor em Portugal, o que só aconteceu em junho de 2016.

A viver no estrangeiro por motivos profissionais, Inês sempre esperou que a maternidade, assim como o casamento, acontecesse naturalmente.

Para Inês, o desejo de um filho nasceu “de um dia para o outro” e várias relações amorosas falhadas contribuíram por optar por ser mãe sozinha.

Foi assim que partiu à procura de um filho através de inseminação com sémen de dador numa clínica de um país onde vive e que na altura já permitia a procriação medicamente assistida para mulheres solteiras.

Para Inês, “a escolha do dador é possivelmente o momento mais complicado de todo o processo para uma futura mãe”.

“É uma decisão extremamente pessoal e obriga-nos a pensar muito sobre todo o processo, sobre o que estamos a fazer e porquê. É intenso, emocionalmente”.

A inseminação artificial correu bem e a gravidez surgiu à primeira tentativa. “O momento mais forte e intenso para mim foi quando entrei na clínica para a inseminação. Depois do procedimento, a gravidez era uma possibilidade na minha cabeça”, contou.

A viver num país onde estes procedimentos são há muito banais, Inês sentiu sempre a compreensão dos amigos que acharam a sua decisão perfeitamente normal.

No entanto, reconhece que em Portugal, o seu país, “ainda há muita gente com dificuldade em conceber este conceito”.

A filha de Inês irá conhecer as suas origens. “Tem esse direito”, diz.

“Nos países onde a pma para mães solteiras é praticada há mais tempo, há comunidades e grupos de apoio onde se discutem as melhores formas de explicar às crianças. Vou procurar ajuda, preparar-me para as perguntas dela e seguir o instinto”.

A filha de Inês, tal como milhares de outras crianças, só nasceram graças a material genético de dador. Estas doações ainda são pouco frequentes em Portugal, razão porque o Ministério da Saúde lançou, em janeiro, uma campanha de promoção da dádiva de óculos e espermatozoides.

Para Maria, doar óvulos sempre foi uma ideia muito presente e com um objetivo muito definido: “Ajudar uma mulher a ter um filho, ajudar uma família que o quisesse muito a ser mais feliz e completa”.

Curiosa por natureza, foi-se informando dos procedimentos e só foi surpreendida com a parte física.

“Sabia que teria de fazer injeções com hormonas, mas os seus efeitos foi o que mais me surpreendeu: inchaço na barriga, algum desconforto na zona abdominal, algumas tonturas num ou dois dias”.

Até doar os seus óvulos, Maria foi submetida a um batalhão de exames físicos e psicológicos e várias consultas. O procedimento foi realizado numa clínica privada, pelo qual recebeu uma compensação de 630 euros.

No final do processo, ficou satisfeita por sentir que tinha contribuído para algo “muito importante”.

Por esta razão, não entende como os críticos falam de “caprichos” das recetoras.

“Não me parece haver grande lugar a caprichos quando uma mulher se submete a tratamentos, muitas vezes falhados, com toda a tristeza e ansiedade que isso acarreta”, disse.

Para Maria, “estas crianças são muito desejadas, o que é logo um bom princípio para serem bem cuidadas e felizes. Não deixam de ser crianças como as outras. Oxalá todas tivessem uma família que as desejou tanto e que se esforçou tanto para recebê-las”.

O desejo de ser mãe de Francisca levou-a mais longe, até à Ucrânia, onde recorreu a uma barriga de aluguer – prática legal nesse país e pela qual pagou 50 mil euros.

Esta foi a única forma que encontrou para poder ter filhos com o seu material biológico, bem como o do seu marido.

O processo médico (exames e estimulação ovárica) foi realizado em Portugal, tendo depois o casal viajado até à Ucrânia, onde foram recolhidos os seus gâmetas (óvulos e espermatozoides), dos quais resultaram os embriões implantados na gestante de substituição.

O casal foi vendo as ecografias das crianças (um par de gémeos) por e-mail e Francisca pode assistir ao nascimento dos filhos biológicos. Foi essa a altura em que viu pela última vez a gestante de substituição.

Francisca lamenta que tenha tido de viajar para tão longe e de gastar tanto dinheiro para ser mãe, o que se deveu a razões clínicas.

Atualmente, a gestação de substituição por razões de saúde é legal em Portugal, embora a sua aplicação ainda não seja possível, por se aguardar a publicação da regulamentação da legislação. Estes casos não poderão em caso algum ser passíveis de qualquer tipo de pagamento.

Fonte: 
LUSA
Nota: 
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