Psoríase

Doença de pele afeta 300 mil pessoas em Portugal

Atualizado: 
17/04/2020 - 10:24
Afetando entre 2 a 4 por cento da população mundial, a Psoríase é uma doença inflamatória complexa sem cura que afeta, sobretudo, a pele. Neste artigo, o dermatologista Pedro Ponte esclarece-nos sobre uma doença que atinge tanto crianças como adultos.

O que é a psoríase? 

A psoríase é uma doença inflamatória crónica complexa, eminentemente cutânea, caracterizada por áreas bem definidas de pele espessada, rosada ou avermelhada, habitualmente cobertas de escamas ou crostas prateadas. Pode ocorrer inflamação articular em cerca de um terço dos doentes.

Quem sofre de psoríase?                             

A psoríase afecta 2 a 4% da população mundial, estimando-se em 300 mil o número de doentes em Portugal. Homens e mulheres são igualmente afectados, ainda que possa haver diferenças entre grupos raciais. Pode iniciar-se em qualquer idade – mesmo na infância – mas tem picos de aparecimento entre os 15-25 anos e os 50-60 anos. Tende a persistir ao longo da vida, com períodos de agravamento e melhoria. É uma doença de base genética sendo possível identificar familiares afectados em cerca de um terço dos doentes.

O que causa a psoríase?

A psoríase é multifactorial, em que factores imunológicos, genéticos a ambientais contribuem para o seu aparecimento.

Sistema imune – A pele tem diferentes camadas. A mais superficial é a epiderme: é constituída por células que estão em constante divisão e que acabam por morrer, cobrindo a toda a superfície corporal com uma película de células mortas denominada estrato córneo. Todos os dias, à medida que as células da epiderme morrem e passam a fazer parte do estrato córneo, algumas células desse estrato são também libertadas, prevenindo que a camada córnea se torne muito espessa. A camada média da pele é a derme onde se localizam o colagénio e os vasos sanguíneos. A mais profunda é o tecido celular subcutâneo (hipoderme) que é basicamente uma camada de gordura.

Na pele afectada por psoríase, células imunitárias penetram na pele provenientes da circulação sanguínea, acelerando a divisão celular da epiderme e alterando o normal mecanismo de libertação das células mortas da camada córnea. Isto provoca espessamento da pele e o aparecimento das escamas e crostas características da doença. Ocorre igualmente dilatação e alongamento dos vasos sanguíneos da derme que suportam o crescimento rápido da epiderme e que conferem o aspecto eritematoso da pele.

Genética – Os factores genéticos são muito importantes no desenvolvimento da psoríase: o perfil genético do indivíduo influencia o tipo de psoríase e a resposta ao tratamento. Não há contudo nenhum teste genético que possa diagnosticar ou determinar se um indivíduo irá desenvolver a doença.

Factores ambientais – Alguns estímulos podem aumentar o risco de desenvolver ou agravar a psoríase como sejam o stress físico, o stress psicológico, infecções por bactérias ou vírus, medicamentos (anti-hipertensores, anti-inflamatórios, anti-maláricos, entre outros) e o tabagismo.

A psoríase não é contagiosa, pelo que não é uma doença que se possa “apanhar” de outras pessoas, nem “passar” para outras pessoas. As lesões de psoríase não são infecciosas.

Como se manifesta a psoríase?

A psoríase manifesta-se clinicamente como placas (pele espessada) de bordo bem definido, simétricas, eritematosas (rosadas ou avermelhadas) e descamativas. As escamas que se libertam são habitualmente prateadas, o que confere à pele lesada um brilho característico. Quando a descamação é muito intensa, podem formar-se crostas. Toda a superfície cutânea pode ser afectada mas é mais comum nos cotovelos, joelhos e couro cabeludo. Também as unhas poderão estar envolvidas, com descoloração, manchas esbranquiçadas ou avermelhadas, espessamento e deformação.

Muitas vezes as lesões são pruriginosas, podendo o prurido ser muito intenso nalguns doentes. Em zona de pele mais seca, podem surgir fissuras e gretas dolorosas.

As placas são muito persistentes sem tratamento. Quando resolvem, podem deixar manchas acastanhadas ou mesmo esbranquiçadas que podem durar meses até desaparecer.

Como se diagnostica a psoríase?

Não há nenhuma análise de sangue ou exame específico para diagnosticar a doença. O Dermatologista precisa normalmente apenas de observar a superfície cutânea para determinar se se trata de psoríase. Quando existem dúvidas, pode ser necessária retirar um pequeno pedaço de pele (biópsia cutânea) para ser observada ao microscópio. A história familiar pode contribuir para o diagnóstico.

Que tipo de psoríase é a minha?

Existem vários tipos de psoríase de acordo com a apresentação clínica. Contudo, os elementos e as localizações que se descrevem não são exclusivos do tipo indicado, podendo haver sobreposição de características.

Psoríase em placas (psoríase vulgar)

É a mais comum forma de psoríase. Tende a afectar adultos jovens e de meia-idade mas pode ocorrer em qualquer idade. As placas variam entre 1 a 10cm de diâmetro, podendo ter maiores dimensões. As localizações habituais são o couro cabeludo, cotovelos, joelhos e dorso. A gravidade e a extensão da doença é muito variável de pessoa para pessoa.

Psoríase gutata

Este tipo de psoríase está por vezes associado a uma infecção bacteriana estreptocócica recente (como uma faringite ou uma amigdalite). Afecta frequentemente crianças e jovens adultos sem antecedentes pessoais de psoríase e causa uma erupção súbita de múltiplas pequenas placas / pápulas na pele.

Psoríase inversa

Afecta áreas corporais menos visíveis, como as virilhas, axilas, nádegas, sulco internadegueiro e genitais. É muitas vezes confundida com uma infecção fúngica ou bacteriana.

Psoríase pustulosa

Pode ser uma forma de psoríase particularmente grave. Desenvolve-se rapidamente, com múltiplas pústulas disseminadas (“borbulhas de pús”) que podem coalescer em áreas maiores. Pode acompanhar-se de febre e de alterações de glóbulos brancos e cálcio no sangue. Pode surgir nas palmas e plantas, podendo dar origem a fissuras e gretas dolorosas e incapacitantes.

Psoríase eritrodérmica

É uma forma particularmente grave de psoríase que envolve a quase totalidade da pele. Pode causar prurido intenso ou dor, e a pele pode ser libertada em grande quantidade. É uma variante rara que pode surgir em 3% dos doentes, principalmente naqueles que têm uma psoríase em placas instável.

Psoríase ungueal 

Muitas pessoas com psoríase desenvolvem alterações ungueais. As manifestações mais frequentes são o “pitting” (um picotado na superfície do prato ungueal), as “manchas de óleo” (manchas que podem ser eritematosas ou acastanhadas), a onicólise (descolamento do prato ungueal do leito da unha), a hiperqueratose e a distrofia (espessamento e alterações da forma da unha). O envolvimento das unhas é um sinal de alerta para um possível comprometimento articular.

Artrite psoriática

 Até um terço dos doentes com psoríase tem também envolvimento articular. Nestas situações ocorre dor, edema e rigidez das articulações. As manifestações cutâneas ocorrem habitualmente antes das articulares, mas em cerca de 15% dos doentes as queixas articulares precedem as cutâneas. É muito comum a associação entre as alterações ungueais e a artrite psoriática. Nas formas mais ligeiras de artrite, é comum não ser diagnosticada; contudo, é muito importante detectar e tratar a artrite psoriática numa fase inicial para evitar destruição articular permanente. 

Doenças relacionadas com a psoríase

Os doentes com psoríase e com artrite psoriática têm maior risco de desenvolverem outras doenças crónicas e vários problemas de saúde, designados por comorbilidades.

Doença cardiovascular – Existem muitos estudos que demonstram a associação da psoríase e da artrite psoriática - principalmente nas formas graves - com a doença cardiovascular. Doentes com psoríases graves têm um risco 58% mais elevado de terem um evento cardíaco major e 43% de um acidente cardiovascular. O tratamento da doença pode reduzir esse risco.

Doença de Crohn – Os doentes com doença psoriática e com doença de Crohn partilham mutações genéticas semelhantes. Pessoas com psoríase e com artrite psoriática têm um maior risco de desenvolverem doença inflamatória intestinal, havendo um estudo que aponta para um aumento na ordem dos 10%.

Depressão – A psoríase pode condicionar um impacto psicossocial considerável, superior ao de outras doenças como a DPOC, a artrite, a doença neoplásica. Pode envolver todas as áreas da vida: autoimagem e autoestima, sexualidade, vida familiar, profissional, lazer.

Síndrome metabólico – Há uma associação muito significativa entre a doença psoriática e o síndrome metabólico - um agrupamento de condições (hipertensão arterial, hiperglicémia, excesso de gordura corporal na cintura, aumento dos níveis séricos de colesterol ou de triglicéridos) que aumentam o risco de doença cardíaca, acidentes vasculares cerebrais e diabetes.

Uveíte – É uma doença inflamatória do olho cujo risco aumenta na doença psoriática.

Doença hepática – Trabalhos recentes relacionam a doença psoriática com o aumento do risco de esteatose hepática não alcoólica.

A minha psoríase é grave?

A psoríase pode ser ligeira, moderada ou grave. As opções de tratamento dependem muito da gravidade da doença. A gravidade é baseada nas características das lesões e na extensão de pele envolvida. Todavia, o compromisso que a doença exerce sobre a qualidade de vida do doente é também decisivo na determinação da gravidade da psoríase: pode, por exemplo, causar um impacto sério na actividade diária de alguém que tenha lesões evidentes nas mãos ou na face.

Tratamento da psoríase

A psoríase não é curável mas existem muitos tratamentos disponíveis capazes de reduzir os sintomas e o aspecto das lesões. As modalidades terapêuticas dependem da gravidade da doença e no impacto na qualidade de vida, no custo e conveniência do tratamento, e na resposta individual ao mesmo. A combinação de terapêuticas está frequentemente indicada.

Terapêutica tópica

A psoríase ligeira é geralmente tratada com agentes tópicos apenas. É a primeira linha de defesa no tratamento da doença. Os tópicos reduzem a inflamação local, normalizando a proliferação celular. A escolha do tratamento pode depender do local a tratar, da extensão e da gravidade das lesões. Inclui emolientes, queratolíticos, corticosteróides tópicos, derivados da vitamina D e imunomoduladores.

Fototerapia

Nos meses de Verão, os doentes com psoríase assistem normalmente a uma melhoria da sua doença. A exposição à radiação ultravioleta em cabines apropriadas sob controlo do Dermatologista pode ser recomendada. Ainda que possa ser muito eficaz, é importante discutir os riscos e os benefícios desta opção terapêutica que implica uma deslocação à instituição de saúde 2 a 3 vezes por semana.

Terapêutica sistémica

Na psoríase moderada a grave preconiza-se o tratamento com agentes sistémicos e/ou fototerapia. São medicamentos que se tomam por via oral ou injectável e actuam em todo o organismo. Os agentes mais comummente utilizados são o metotrexato, a cliclosporina e a acitretina com perfis de eficácia e segurança distintos.

Biológicos

Os agentes biológicos ou biotecnológicos estão reservados, de uma forma geral, para psoríases resistentes ou com contraindicações às modalidades terapêuticas anteriormente descritas. Os medicamentos biológicos são proteínas provenientes de células vivas cultivadas em laboratório. Em termos de mecanismo de acção, bloqueiam etapas muito específicas do sistema imune. São administrados por injecção subcutânea ou infusão intravenosa.

Autor: 
Pedro Ponte - Dermatologista Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
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