Entrevista

Cancro de Cabeça e Pescoço: é importante conhecer para saber prevenir

Atualizado: 
20/08/2018 - 11:18
Em Portugal, todos os anos são diagnosticados cerca de 3 mil novos casos de cancro nas vias aerodigestivas. Por ser pouco conhecido, o cancro de cabeça e pescoço é frequentemente diagnosticado numa fase tardia, o que dificulta o seu tratamento. Para percebermos em que consiste e quais os cuidados a ter, o Atlas da Saúde esteve à conversa com Ana Castro, presidente do Grupo de Estudos de Cancro da Cabeça e Pescoço (GECCP). O consumo excessivo de tabaco e bebidas alcoólicas, a par com a má higiene oral, estão entre os principais fatores de risco.

O que é o Cancro de Cabeça e Pescoço? Que tumores fazem parte desta terminologia?

O Cancro de Cabeça e de Pescoço agrupa todos os cancros das vias aerodigestivas superiores, ex: cancro da laringe, o cancro da cavidade oral, cancro da língua, cancro da orofaringe, cancro das glândulas salivares, cancro da hipofaringe e das fossas nasais. 

Quais os tumores mais frequentes e seus sintomas?

Os tumores mais frequentes são os da laringe, da cavidade oral, da língua, da orofaringe e das glândulas salivares. Os sintomas mais comuns são um inchaço ou uma ferida na cavidade oral, dificuldade em engolir, dores de ouvidos, rouquidão ou dores de garganta que não resolvem e persistem por mais de 3 semanas.

Contudo, podemos falar ainda de outros sinais de alerta como o aparecimento de manchas brancas ou vermelhas nas gengivas, palato, língua ou parede interna da cavidade oral, obstrução nasal permanente, dores de cabeça persistentes e um aumento de volume de glândulas salivares.

Qual a sua incidência e quais os grupos mais atingidos? Que causas lhe estão associadas?

O Cancro de Cabeça e de Pescoço é a quarta patologia com maior incidência em Portugal e estima-se que afete cerca de 3 000 indivíduos por ano. O cancro de cabeça e pescoço sempre foi associado ao consumo excessivo de álcool e tabaco, por isso, era mais prevalente em homens, a partir dos 50 anos de idade.

Hoje em dia, assistimos a casos de pessoas cada vez mais jovens, que não fumam nem bebem bebidas alcoólicas e cujo aparecimento está relacionado com o Vírus do Papiloma Humano (HPV).

Outros comportamentos como o excesso de exposição aos raios solares, exposição a produtos industriais como madeiras, níquel e outros metais pesados, asbesto (amianto) ou radioterapia e uma dieta pobre em vegetais e frutas, podem levar ao Cancro de Cabeça e de Pescoço.

Uma vez que este tipo de cancro é, habitualmente, diagnosticado numa fase tardia, quais os principais sinais de alerta?

Todos os sinais são sinais de alerta, desta forma, se os sintomas mais frequentes como um inchaço ou uma ferida na cavidade oral, dificuldade em engolir, dores de ouvidos, rouquidão ou dores de garganta incessantes persistem ao longo de três semanas deve consultar um especialista.

Quais os grandes riscos deste tipo de cancro?

O Cancro de Cabeça e de Pescoço implica alterações que condicionam o estilo de vida do doente, na medida em que podem existir mudanças na imagem corporal, como, após a remoção do tumor, a perda de tecidos, de dentes ou de maxilar. Esta degradação ou ausência de tecidos é um entrave ao suporte de próteses.

Mas acarreta ainda riscos a nível psicológico do próprio doente, é necessário fazer um acompanhamento mais aceso que vai desde um médico dentista, a um psicólogo e fisioterapeuta.

É possível estabelecer uma relação entre o aumento da incidência do HPV e o cancro da cabeça e pescoço? O que representa esta ligação?

O HPV é muito comum e acredita-se que vai afetar a maioria das pessoas em algum momento das suas vidas, sendo considerada a doença sexualmente transmissível (DST) mais frequente. Alguns tipos de HPV, conhecidos como HPVs de alto risco, são conhecidos por aumentarem o risco de desenvolvimento de alguns cancros como cancro do ânus, cancro do colo do útero, cancro do pénis, cancro da vulva, cancro da vagina e cancro de cabeça e pescoço.

Na maioria dos casos, esta infeção não apresenta sintomas e é eliminada pelo organismo naturalmente. Contudo, o vírus pode permanecer latente no organismo e em alguns indivíduos originar o desenvolvimento de alterações celulares, que evoluem para doenças. Esta relação é justificada pelo comportamento sexual de risco, como a não utilização de proteção, e número de parceiros sexuais.

Quanto ao tratamento, quais as opções terapêuticas atualmente disponíveis para tratar o cancro de cabeça e pescoço?

A terapêutica do Cancro de Cabeça e de Pescoço pode ser feita a dois níveis, mediante o estadio da doença. Se nos depararmos com um estadio precoce, quando os tumores ainda são pequenos, sem invasão de estruturas adjacentes, o tratamento unimodal, seja cirúrgico ou de radioterapia, permite elevadas taxas de cura.

Contudo, numa fase já avançada, é necessário adotar uma terapêutica multimodal, ou seja, contamos com uma equipa multidisciplinar que vai desde radioterapia, cirurgia, quimioterapia, agentes biológicos e imunoterapia.

Qual a sua taxa de cura / sobrevivência?

A taxa de cura/ sobrevivência varia mediante a fase em que é diagnosticada a doença. Numa fase já avançada, 60% dos doentes contam com uma esperança média de vida de cinco anos. Contudo, quando diagnosticado numa fase inicial, o tratamento deste tipo de cancro tem uma taxa de sucesso entre os 80 e 90%.  

Em matéria de prevenção, quais os principais cuidados a ter?

A prevenção deste tipo de cancro passa por ter em consideração os comportamentos de risco, como garantir uma boa higiene oral com um acompanhamento regular de um dentista, não fumar, evitar o consumo de bebidas alcoólicas, garantir uma dieta em frutas e legumes, apresentar cuidados na exposição solar e na prática sexual utilizar proteção.

Na sua opinião, a população está devidamente sensibilizada para este tipo de cancro? Que mensagem gostaria de deixar?

É muito importante estarmos atentos aos sinais, muitas vezes os sintomas são confundidos com outras condições benignas e caímos no erro de não apostar na nossa saúde. Esta deve ser uma das nossas maiores preocupações. Contudo, deveria ainda de existir um maior fluxo de comunicação sobre este tipo de cancro. A população poderia estar mais sensibilizada, assim como deveria ser premente a insistência da cessação de hábitos nocivos e passar a implementar programas de diagnóstico precoce.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Grupo de Estudos de Cancro da Cabeça e Pescoço (GECCP)